Especial 3 – Vicentinho: "Queremos é fazer com que o dirigente sindical seja obrigado a trabalhar"

12/05/2005 - 9h52

Gabriela Guerreiro e Iolando Lourenço
Repórteres da Agência Brasil

Brasília - Com mais de 25 anos de experiência no meio sindical, o deputado Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho (PT-SP), deve ser o relator da proposta de emenda constitucional (PEC) da reforma sindical na Comissão Especial da Câmara que vai analisar o mérito do texto. Mesmo antes de a matéria chegar à Comissão, Vicentinho se antecipou às discussões formais que serão realizadas na Câmara e vem mantendo uma série de conversas com organizações e entidades contrárias e favoráveis à reforma.

Em entrevista à Agência Brasil, o deputado reconhece que vai ter muito trabalho para aprovar uma reforma que seja fruto do consenso entre os parlamentares. "Nós partimos do pressuposto que a estrutura sindical é conservadora, corporativista, e que tem facilitado muito mais o nascimento de sindicalistas ditos espertos ". Leia a seguir os principais trechos da entrevista.

Agência Brasil - Por que fazer a reforma sindical no Brasil neste momento?

Vicentinho - Com o novo governo, nós estamos em um período de reformas. Tivemos a tributária, a previdenciária, e estão previstas as reformas política, da educação, da Justiça. E a reforma do trabalho é também uma necessidade. Desde que foi criada essa estrutura sindical vigente até hoje, existem apelos e solicitações de modificações.

Nós partimos do pressuposto de que a estrutura sindical é conservadora, corporativista, e que tem facilitado muito mais o nascimento de sindicalistas ditos espertos, que se aproveitam da estrutura sindical para benefícios pessoais, do que o surgimento de uma verdadeira organização e luta dos trabalhadores, por vários aspectos. É uma estrutura antidemocrática.

Até hoje, a lei não prevê a união dos trabalhadores, por isso não reconhece as centrais sindicais. As centrais foram criadas quebrando esse preceito da corporação. Eu fui dirigente sindical por 25 anos e vi o desvio do papel do sindicalista. Alguns se transformam em pessoas que enriqueceram, vemos brigas fratricidas – às vezes até com assassinatos – desvio de dinheiro, falta democracia na organização interna, participação dos trabalhadores, entre outras mazelas. A conseqüência disso é o afastamento dos trabalhadores do sindicato.

ABr - O número de sindicatos tem diminuído?

Vicentinho - Até 1988, existiam 4,5 mil sindicatos. O índice de sindicalizados naquele período era de 20%. Hoje, são 18 mil sindicatos, e o índice continua de 20%. Portanto, não aumentou a classe trabalhadora, em quantidade. Houve uma divisão.

Eu fui funcionário de uma empresa por 25 anos, que é a Mercedes-Benz, na época que éramos metalúrgicos do ABC, e lá era apenas o Sindicato dos Metalúrgicos. De 88 para cá, começaram a criar sindicatos da secretária, do técnico industrial, do bombeiro, do motorista da fábrica, de ferramenteiros. Essa divisão não aumenta a força do trabalhador. Ela é uma divisão que enfraquece.

Eu me lembro que, quando eu fui eleito presidente do Sindicato dos Metalúrgicos, em 1987, nós começamos a devolver o imposto sindical já no ano em que eu entrei. De lá para cá, nem se desconta mais. O principal de tudo isso era o atrelamento da estrutura sindical ao Estado brasileiro. Pela concepção da estrutura sindical brasileira, o tutor do movimento sindical é o ministro do Trabalho, em vez de ser uma organização autônoma, livre.

Nós queremos caminhar para essa autonomia. É preciso assegurar o direito do exercício sindical, direito de manifestação, de greve, e a não perseguição em função disso, a proteção a quem luta – isso está nas Constituições do mundo inteiro. Tudo isso está na proposta.

ABr - Algumas críticas à reforma sindical são justamente de que ela não prevê o desatrelamento total em relação ao Estado.

Vicentinho - Essa parte que alguns criticam, que não existe desatrelamento total, é verdade. Nós precisamos na Câmara apresentar emendas que gerem um desatrelamento. O Estado não pode intervir na organização sindical, não pode dar palpite, não pode mais cassar como cassou no passado. Eu fui cassado pelo Estado. Não pode mais acontecer isso. E isso está assegurado na proposta.

Os trabalhadores não podem ter na sua organização a desconfiança. Eles não podem ficar sem ter o poder de participar, de decidir. Se você tem um sindicato em que o índice de sindicalizados é de 20%, significa que 80% estão fora do sindicato. E há casos de sindicatos com 100 mil trabalhadores, e 2% de associados.

O que nós queremos é fazer com que o dirigente sindical seja obrigado a trabalhar, a conquistar a confiança dos trabalhadores, novos associados, porque, na hora que tiver um tamanho, é aquele tamanho real. E, na hora que for para a rua, vai de acordo com aquela força. Eu costumo falar do movimento sindical como musculatura. Se nós temos 18 mil sindicatos, tem sindicato que tem 1% (de associados), ou nem associado tem. Fez uma assembléia falsa, mandou para o ministério, o ministério não tem condições de fiscalizar, criou o sindicato. E, na hora que vem o desconto do imposto, é dividido, vai para aquela entidade.