Mylena Fiori
Repórter da Agência Brasil
São Paulo - O ex-presidente do Incra, Marcelo Resende, reivindica a suspensão imediata do programa de reforma agrária implementado no país nos anos 90 por orientação do Banco Mundial, até que se faça uma avaliação completa das conseqüências do programa para o país. "As denúncias que se somam hoje indicam que esse programa no Brasil é uma verdadeira tragédia. Acho que o Banco Mundial e o governo têm que responder a contento às críticas que vem sendo feitas", afirma Resende, que atualmente é integrante da Associação Brasileira de Reforma Agrária e da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos.
Segundo ele, os movimentos sociais esperavam uma auditoria do programa pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o que não ocorreu. "O que assistimos, ao contrário, foi à continuidade das políticas do Banco Mundial para o meio rural", avalia.
No recém lançado O Banco Mundial e a Terra - Ofensiva e Resistência na América Latina, África e Ásia, Marcelo Resende e a jornalista Maria Luísa Mendonça, da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, lembram que em novembro de 2003 o Ministério de Desenvolvimento Agrário anunciou o Plano Nacional de Reforma Agrária: Paz, Produção e Qualidade de Vida no Meio Rural.
"Uma das suas principais metas, com a previsão de atingir 130 mil famílias, é a continuidade do programa de Crédito Fundiário de Combate à Pobreza Rural, que segue a lógica do mercado de terras. Esse projeto enfraquece o Estado nas suas atribuições, concorre com os instrumentos e recursos públicos da reforma agrária baseada na função social da terra e legitima as oligarquias rurais", diz o texto de abertura da referida obra, que reúne pesquisas sobre os programas fundiários financiados pelo Banco Mundial no Brasil, na Colômbia, Guatemala, México, Zimbábue, África do Sul, Tailândia e Índia.
Resende e Maria Luisa denunciam, também, que outra medida adotada para facilitar a implementação do mercado de terras é o cadastramento e o georreferenciamento do território nacional, com a regularização de 2,2 milhões de imóveis rurais e a titulação de 500 mil posseiros. "Esse programa acaba com o conceito de terras públicas e comunitárias e pode contribuir para o aumento da concentração fundiária.O projeto permite ainda que o Banco Mundial tenha acesso a dados estratégicos sobre a malha fundiária brasileira", segue o texto.
Segundo Resende, cerca de 80% dos assentamentos do país - mais de 300 mil famílias – não têm estrada, não têm energia elétrica e não têm água, condições básicas para o desenvolvimento. "Na minha opinião, os recursos do Banco Mundial devem ser utilizados na recuperação dos assentamentos e no fortalecimento da reforma agrária institucional", afirma.
Marcelo Resende defende o rompimento com a lógica da reforma agrária de mercado. "Devemos centrar nossos esforços em uma política agrária que verdadeiramente cumpra a constituição federal, ou seja, a desapropriação do latifúndio improdutivo que não cumpre a função social e de áreas que não respeitam o meio ambiente, que têm narcotráfico e trabalho escravo", defende.