Falta de instrução piora situação de brasileiros na Bélgica, diz artista plástica

17/07/2008 - 13h55

Alana Gandra
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro - A artista plástica brasileira Inêz Oludé da Silva não estimula sonhos românticos  para os  compatriotas sobre a vida dos imigrantes brasileiros na Europa. Segundo ela, os problemas de idioma e de informação são alguns dos principaisdesafios,  para os brasileiros na Bélgica. Ela reside naquele país há 32 anos, depois de ter sido exilada noChile e presa na Argentina, no tempo da ditadura militar.

“Tem o problema da língua e do mercado de trabalho, que está fechado. Não tem trabalho nem para os belgas”, disse a pernambucana em entrevista à Agência Brasil, no Rio de Janeiro. Ele é professora de francês  no país onde acaba de pedir a nacionalidade. 

Além disso, grande parte dos brasileiros que viaja para tentar a sorte no exterior ou tem pouco estudo ou é analfabeta em seu próprio idioma, o português, e não consegue aprender o francês, destacou Oludé. Por isso, os imigrantes brasileiros passam dificuldades financeiras e até fome, além de acabar apresentando problemas psicológicos graves. “Eu fico com muita pena, porque eu fui do exílio e sei como é. Mas, eu tive um bom exílio, claro, porque tinha uma cultura e história diferentes. Mas eles chegam sem preparação e a gente fica muito triste”.

Segundo a artista plástica, as famílias dos brasileiros de pouca instrução que procuram a Bélgica para trabalhar acabam se desestruturando. Muitos vivem em porões, que Inêz Oludé comparou a “navios negreiros”. Sem querer criar polêmicas, conforme assegurou, ela indicou que os brasileiros são explorados também por seitas religiosas, às quais dão dinheiro em troca de falsas promessas de trabalho.

Os imigrantes brasileiros na Bélgica ocupam em sua grande maioria empregos subalternos na construção civil e como empregados domésticos. “E às vezes trabalham dois, três meses, e não são pagos”, acusou Oludé, que em diversas ocasiões tem atuado como defensora de compatriotas junto a empresas estrangeiras.

Ela informou que embora na Bélgica o atendimento à saúde na rede hospitalar seja garantido por lei a todos os cidadãos,  os brasileiros  que estão ilegais no país,  e que formam a  grande maioria, acabam acumulando dívidas. Oludé ressaltou que o governo da Bélgica está endurecendo a política de repatriação de imigrantes irregulares.  “Tem gente que vai  presa, algemada. E eles ficam se sentindo muito mal”.

A artista pernambucana não acalenta muita esperança de melhoria, diante da nova Lei de Imigração da União Européia. “Eu acho que vai fechar ainda mais. Vai ficar difícil. É uma armadilha porque, inclusive, quando o brasileiro chega lá, eles não dão mais carimbo no passaporte, que é para ele não poder provar que está no país há tempos”.

Inêz suspeita, inclusive, que existe tráfico de brasileiros, uma vez que a maioria deles sai das mesmas cidades  de Goiás e de Minas Gerais. A suspeita da artista decorre do fato de haver atualmente em Bruxelas cerca de três mil canteiros de obras com trabalhadores clandestinos. “Por isso é que a gente vê que existe um tráfico. Porque existe a necessidade de ter mão-de-obra barata, que não vai ter aposentadoria, nem os demais benefícios do mercado de trabalho”.

Paralelamente a sua atividade como professora, Inês desenvolve um trabalho de preservação da identidade e da cultura brasileiras na Bélgica. Em setembro do ano passado, ela realizou com apoio da Embaixada do Brasil naquele país a 1ª Bienal  de Artes Brasileiras em Bruxelas. Agora, ela se dedica  a organizar a segunda edição do evento, no próximo ano. Para ela, a cultura  significa "o visto de entrada" dos brasileiros em todo o mundo.

“O europeu vem para o Brasil atrás da nossa cultura. Ele quer a nossa  cultura, nossa música, nossa dança, nossa feijoada, nossas praias, nossa maneira de viver. Então, temos que preservar essa diversidade”. A Bienal de Artes Brasileiras de Bruxelas serve para mostrar que “nós somos exportadores de cultura. Não viemos lá pegar o trabalho deles, mas sim ajudar essa sociedade a crescer”.

Inêz Oludé reivindica apoio do governo brasileiro para a Bienal de Artes, porque os editais de cultura   disponibilizados no país se destinam a brasileiros residentes no Brasil e não no exterior. Ela destacou também a necessidade de que o governo   firme um  acordo bilateral com a Bélgica, na área da cultura, uma vez que aquele país é considerado a capital da Europa. A artista plástica participa da 1ª Conferência das Comunidades Brasileiras noExterior, aberta hoje (17) no Rio pelo Ministério das Relações Exteriores.