Sétimo filme do programa DOCTV desbrava memória do povo piauiense

29/04/2007 - 13h59

Janaina Rocha
Repórter da Agência Brasil
Brasília - O sétimo documentário da 3ª edição do programa DOCTV, Um corpo subterrâneo, assemelha-se a uma expedição. Mas não de caráter científico. O diretor Douglas Machado desbrava a memória "do povo piauiense", que,  surpreendentemente, envolve o telespectador numa íntima experiência de vida, morte e saudade. O vídeo será exibido esta noite, às 23 horas de Brasília, pela rede pública de TV."Não acredito no regionalismo no campo das artes", responde Machado sobre um aspecto central do filme. "No momento em que vou para uma região, seja no Piauí, meu lugar de nascimento, ou no Rio Grande do Sul, quando filmo a biografia do escritor Luiz Antonio de Assis Brasil, retrato as pessoas com suas questões que são sempre universais", afirma. Em seus documentários, Machado já explorou os mundos e as regiões dos escritores Marcos  Vinicios Vilaça, Ariano Suassuna e Hindemburgo Dobal, passando pelo Rio Grande do Sul, Pernambuco e Piauí.A relação com o estado natal marca não só os 52 minutos de Um corpo subterrâneo. A imagem do cemitério no município de Barra Grande, no litoral piauiense, é a primeira imagem deste DOCTV e a última do filme Cipriano, primeiro longa-metragem ficcional de Machado. "A única certeza do documentário era essa imagem", conta o diretor. "O filme não tinha direito à pré-entrevista ou ensaio. A premissa foi a de fazer tudo em primeira mão." Machado fez uma viagem do extremo norte ao extremo sul do Piauí. Perseguiu a memória nas cidades de Barra Grande, Gilbués, Piripiri, Teresina, Oeiras e São Raimundo Nonato. Em cada um dos municípios, ele documentou a história de morte mais recente. Assim, recapitulou o significado e as lembranças dessa vida para a família.No limiar da morbidez, Machado flagra dramas como o de uma família que viveu o suicídio. O diretor sempre parte do cemitério da cidade para escolher o personagem que vai retratar. Mesmo assim, Um corpo subterrâneo surpreende mais quando aponta para histórias de pessoas que, mesmo mortas, ainda estão presentes. Ou seja, quando as recordações são felizes e recorrentes. E os depoimentos trazem detalhes prosaicos de uma vida bem vivida. A naturalidade do depoimento tem a ver com a câmara, que ficou presa ao peito de Machado. A distância entre ele e a família é da "intimidade", como descreve. Em algumas histórias, a família toma a câmera e faz seu instante de memória virar imagem. Além das memórias, Um corpo subterrâneo tem "paisagens sonoras". Como um filme feito na estrada, no estilo road-movie, o documentário mostra a aridez do interior nordestino de outra forma. Não estereotipa a imagem. "Não tenho a nostalgia do verde. Acho a imagem amarela do sertão linda e acho que temos de co-habitar com a seca", comenta Machado. A cada mudança de cidade, Machado insere uma imagem contínua do trajeto na estrada, rápida, em movimento. E essa paisagem ganha o som da rabeca, que toca La Follia, de Vivaldi. Quase um estranho momento de pausa. Uma pequena preparação para uma história.