Linguista aponta falta de amadurecimento no texto do Volp

21/12/2012 - 14h19


Fernanda Cruz
Repórter da Agência Brasil

São Paulo – A quinta edição do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (Volp), lançado em 2009 pela Academia Brasileira de Letras (ABL) para atender ao Novo Acordo Ortográfico, não teve o amadurecimento necessário para ser publicado, na opinião da professora Maria Helena de Moura Neves, da Faculdade de Ciências e Letras da Universidade Estadual Paulista (Unesp).

A linguista explica que a lista elaborada pela ABL, que deveria conter as principais mudanças nas palavras da ortografia brasileira, não cumpre completamente o seu objetivo. De acordo com ela, palavras muito usadas e que geram incertezas sobre o emprego de hífen, como macrorregião, não estão presentes no Volp.

“Nós não estamos com 100% de suporte para resolver a ortografia de todas as palavras da língua portuguesa”, diz Maria Helena. Segundo ela, o que se tem feito para definir a forma como macrorregião, por exemplo, é escrita, é a analogia com outras palavras de formação similar, como mesorregião.

O gramático Evanildo Bechara, membro da ABL, explica que as palavras com a mesma estrutura morfofonética devem, de fato, ser usadas por analogia. Para o caso de macrorregião, explicou Bechara, serviriam macrorranfo, macrorranfoso, macrorrino e macrorrizo. "Nenhum dicionário de língua alguma contém todas as palavras existentes nesse idioma”, defendeu.

Bechara não concorda que falte amadurecimento ao texto do Volp. “O amadurecimento está mais do que comprovado pelas cinco edições anteriores do Volp, com início em 1982. Tendo em vista que são poucas as alterações gráficas trazidas pelo acordo de 1990, foi suficiente o prazo de 1990 a 2009”, disse.

Segundo Maria Helena, porém, existem outras dificuldades quanto ao uso de hífen. “O acordo diz que se a segunda palavra começar por h, vai haver o hífen. Mas o acordo diz em outro lugar que, às vezes, quando a segunda palavra começa com h, na hora de juntar com outra, ela o perde. Então, você fica em dúvida, perde o h ou não perde? Essas coisas precisavam se resolvidas por especialistas”, defendeu.

Para Maria Helena, as bases do acordo ortográfico, aprovadas em 1990, deveriam ter sido mais bem estudadas durante o tempo que levou para entrar em vigor. “Quando saiu, o texto não tinha passado pela reflexão, pelo exame, pelo cuidado que poderia ter sido dado a ele durante tanto tempo que ficou no limbo, parado”, disse. “Houve um defeito de condução política e governamental”, acrescentou.

Ela explica que a lista do vocabulário da nova ortografia, a princípio, seria feita por estudiosos do Brasil e de Portugal, ou seja, as duas academias se reuniriam e fariam esse vocabulário ortográfico. “Os estudiosos decidiriam sobre aqueles pontos em que o acordo não deixou as coisas muitos claras, por exemplo, na hora de pôr certos hifens, os dois lados resolveriam, palavra por palavra, como deveriam ser escrito. A partir do momento em que se soltasse a publicação [Volp], não ficaria mais dúvida nenhuma, porque todas as palavras da língua estariam registradas lá”, disse.

Para a professora, a ABL adiantou-se ao lançar o texto em 2009, sem a coautoria da Academia de Ciências de Lisboa, que representa Portugal, rompendo, de certa forma, o acordo entre as duas nações.

Bechara discorda das declarações da professora. “Nunca houve nenhum vocabulário ortográfico único entre as duas academias. Ambas sempre publicaram os seus vocabulários ortográficos separadamente, e é por isso que só agora a Academia das Ciências de Lisboa concluiu o seu texto, de acordo com as bases de 1990”, argumenta.

Segundo Maria Helena, em Portugal, muito se critica a Nova Ortografia porque os portugueses precisaram ceder mais, sobretudo no que diz respeito a palavras que contém letras mudas (que não se pronunciam), como é o caso do c em facto e acto. “A ortografia brasileira não tem isso desde 1943”, lembra a professora.

“Se um português fala fato e escreve facto, fica fácil para eles. Agora, se fosse o contrário, se nós tivéssemos que escrever como eles, como é que a gente ia adivinhar em que palavra ia ter de pôr aquela letra que não se pronuncia?”, questiona.

A “revolta de Portugal”, na opinião de Maria Helena, não está relacionada à dificuldade de adaptação às novas regras de ortografia, mas a uma questão cultural. “Eles acham que é uma violência à tradição deles”.

Edição: Tereza Barbosa