Para que serve uma ouvidoria?

23/03/2007 - 11h34

Paulo Machado
Ouvidor da Radiobrás
Brasília - Essa foi a perguntaque me fiz quando fui convidado pelo presidente da Radiobráspara assumir a função de ouvidor. Logo me ocorreu aimagem de um cara com uma orelha enorme que ouvia tudo que o públicotinha a dizer e repassava para aqueles(as) que fazem o jornalismo e anossa programação. Depois ouvia suas consideraçõese as retransmitia ao público. Essa figura caricata do ouvidorem meu pensamento foi evoluindo no decorrer dos últimos meses,tempo que tive para tomar pé da situação,entender as expectativas dos profissionais da empresa em relaçãoao trabalho da ouvidoria, ser apresentado a minha equipe e iniciar odiálogo com o(a) cidadão(ã).Entre telefonemas ee-mails foram mais de 200 nesse período, o suficientepara começar a conhecer nosso público, saber quais sãosuas preocupações, críticas e desejos em relaçãoa esta empresa pública de comunicação. Foi um tempo para oplanejamento de minha ação, também utilizadopara definir o formato desta coluna, e dos espaços Ouvidoriano Ar, que estamos inaugurando hojeno rádio e na TV. Foi um tempo para conhecer um pouco dahistória das ouvidorias no Brasil e no mundo, e me inteirar dotrabalho de minha antecessora, Emília Magalhães.Finalmente, essetempo, de pouco mais de dois meses, me permitiu saber exatamente oque é uma ouvidoria e para que ela serve, ou melhor, a quemela serve. Colocando-me naposição de leitor, percebi que às vezes lemosuma notícia que em vez de nos esclarecer sobre um determinadoassunto nos enche de dúvidas. As perguntas ficam entaladas emnossa garganta e não sabemos a quem recorrer para pedir asrespostas. Aí nos perguntamos se somos nós que nãoconseguimos entender ou se foram os jornalistas que nãosouberam explicar. Seja qual for o caso, a Ouvidoria deve ter aresposta. Ela é um canal de diálogo para receber asperguntas, críticas e sugestões.Além disso, elatem a função de, com base nas demandas do público,ajudar os jornalistas a pensar sobre o que fazem e como fazem. Quandoum(a) leitor(a) envia uma correspondência ou liga para aOuvidoria ele(a) recebe um número de protocolo com o qualele(a) poderá acompanhar o caminho percorrido por sua mensagemdentro das instâncias do jornalismo. Após uma análisepreliminar, feita pelos assessores da ouvidoria para saber se oassunto é de nossa competência, a voz do(a) leitor(a)começa a provocar uma série de reações naredação. Muitos dizem que o jornalista não gostade ser criticado e eu acrescentaria que nós todos, de modogeral, não gostamos de ser criticados. Mas justamente nojornalismo, a crítica é mais que fundamental. Osjornalistas, absorvidos em sua rotina diária, pressionadospela urgência do tempo para que a notícia nãoenvelheça em suas mãos,normalmente não têm muito tempo para refletir sobre seutrabalho. E aí entra a Ouvidoria para chamar a atençãodo(a) jornalista no sentido de lembrá-lo(a) que do outro ladoda página eletrônica há um leitor que pode nãoter entendido o que ele(a) quis dizer, ou que faltaram informaçõesimportantes ou ainda que ele(a) esqueceu de ouvir alguma parteenvolvida no assunto, ou até mesmo quea linguagem com que ele(a) se comunicou com o(a) leitor(a) nãopermite que sua mensagem seja bem compreendida. Portanto, cabe aOuvidoria não só ouvir o(a) leitor(a) como tambémfazer com que sua voz seja ouvida na redação.Em uma decisãoamparada por uma norma interna, qualquer setor da empresa tem umprazo de cinco dias úteis para responder ao leitor(a) sobresua demanda. A Ouvidoria analisa a resposta para ver se o pleitodo(a) leitor(a) foi satisfatoriamente atendido, caso contrário,é solicitado ao(a) autor(a) que a resposta seja refeita.Assim sendo, aOuvidoria tem por missão comparar o que foi feito com o quedeveria ou poderia ter sido feito. E nada melhor do que uma críticaconstrutiva para provocar mudanças no sentido de produzirnovos modos de pensar e de fazer o jornalismo. É a críticaque não visa destruir nem desmerecer um trabalho, e simproporcionar uma oportunidade para que esse trabalho sejapermanentemente repensado à luz da capacidade de compreensãodo leitor(a).Para sugerir aosjornalistas o que poderia ou deveria ser feito em vez do que foipublicado, a Ouvidoria conta com um referencial teórico quefunciona como um pacto entre a direção e os jornalistasda casa. Esse pacto está consolidado num conjunto de normas,regras e recomendações reunidas no Manual deJornalismo da Radiobrás –um trabalho árduo e coletivo que custou quatro anos dereflexão da equipe da empresa.Além de dar vozao(a) cidadão(ã) e de cuidar para que ela seja ouvidana redação da Agência Brasil, a Ouvidoriatambém tem a função de ajudar a formar e ainformar o(a) leitor(a) para que se estabeleça uma relaçãocrítica entre leitor(a) e notícia. Para isso, aOuvidoria tem em seus planos para 2007, a implantaçãode um programa de educação para a mídia atravésdo qual serão fornecidos a estudantes do ensino fundamental emédio instrumentos de análise de mídia eoportunidades de criticar e fazer mídia, usando a estrutura eos meios dos veículos da Radiobrás como laboratório.Paralelamente a isso, a Ouvidoria também estápreocupada em implementar um projeto de análise críticade mídia com estudantes de comunicação atravésde parcerias com escolas de nível superior, institutos depesquisa e organizações não governamentaisafeitos ao tema da comunicação.Como o(a) leitor(a)pode observar, tenho muito trabalho pela frente. O desafio écontribuir para mudar a qualidade da relação que o(a)leitor(a) tem com aquilo que lê, com a maneira como se informa,com a qualidade da informação. É sobre oatendimento a esse direito fundamental da pessoa humana, o direito àinformação, que me debruçarei durante todo esteano, ouvindo muito e falando só o essencial.Semanalmente estareiaqui com a Coluna do Ouvidor analisando as críticas esugestões que você enviar, com o objetivo de aprimorar ojornalismo com foco no cidadão produzido por esta empresapública de comunicação da qual você,cidadão(ã), é o(a) mais legítimo(a)proprietário(a).Agora já vejo oouvidor como uma pessoa normal. A figura caricata dos primeiros diasse desfez depois que o mistério do cargo foi se dissipandopelo conhecimento e pela informação. Só eles sãocapazes de desfazer os fantasmas que criamos.Até a próximasemana.