Ministério Público e movimentos sociais criticam licença para transposição do São Francisco

23/03/2007 - 21h55

Wellton Máximo
Repórter da Agência Brasil
Brasília - A autorização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para o início das obras de integração do Rio São Francisco às bacias da região Nordeste recebeu críticas do Ministério Público e de movimentos sociais. Os impactos ambientais e a possibilidade de prejuízo aos cofres públicos, em caso de paralisação das obras, são os principais pontos contestados. Coordenadora interestadual das Promotorias de Justiça do São Francisco, Luciana Khouri ressaltou que a transposição é alvo de 12 ações no Supremo Tribunal Federal (STF). Caso o governo comece logo as obras, ela disse acreditar que os trabalhos correm o risco de ser paralisados pelo Supremo – e isso, na avaliação dela, provocará prejuízos aos cofres públicos.A procuradora aconselhou o governo a esperar a posição do STF sobre o assunto antes de iniciar qualquer obra, mesmo com a licença de instalação concedida. “Como não existe decisão definitiva, a licença pode ser revogada a qualquer momento. E nesse caso os trabalhos não passariam de desperdício de recursos públicos”, advertiu.Como o caso tramita no Supremo, somente a Procuradoria-Geral da República (PGR) pode recorrer da licença do Ibama. Luciana, no entanto, informou que o Ministério Público da Bahia vai pedir à PGR que tente suspender a licença judicialmente. “Muito provavelmente, essa licença vai motivar a 13ª ação contra a transposição”, disse.A decisão do Ibama também desagradou aos movimentos sociais. Membro do Fórum de Defesa do Rio São Francisco, movimento que reúne 60 entidades da sociedade civil contrárias à transposição, Cícero Félix dos Santos disse temer que uma eventual paralisação das obras provoque prejuízos ao meio ambiente: “Se o governo começar a construir e tiver que parar tudo, as conseqüências para a região serão ainda piores do que se o canal estivesse pronto – imagine o esqueleto que ficará lá”.Para Cícero, que também é coordenador da Comissão Pastoral da Terra (CPT) em Juazeiro (BA), a decisão do Ibama foi precipitada. “Em primeiro lugar, o rio precisa passar por um trabalho de recuperação ambiental, com a vegetação das margens replantada, o tratamento do esgoto despejado no rio e a contenção das erosões”, alertou. Os possíveis impactos sociais e ambientais são os principais pontos questionados no STF. Uma das críticas diz respeito às consultas públicas sobre a transposição. “As audiências foram realizadas longe das comunidades atingidas pelo desvio do rio e convocadas com apenas dois dias de antecedência. A população do semi-árido não foi ouvida”, apontou a procuradora, para quem os estudos de impacto ambiental não esclareceram os danos que poderia causar o desvio de parte do São Francisco para abastecer outros estados. "Os estudos foram lacônicos e, ao contrário do que o Ibama alega, não se pode dizer que a obra é ambientalmente viável", disse. De autoria do Ministério Público da Bahia, em conjunto com o Comitê da Bacia do São Francisco e movimentos sociais, as ações apontam mais problemas legais em torno da transposição. Um dos processos trata da passagem do canal por comunidades indígenas e quilombos. A captação da água, em Cabrobó (PE), ocorrerá em terras dos índios Truká. Segundo Luciana, qualquer alteração no uso da água em áreas indígenas tem de ser autorizada pelo Congresso Nacional.A possibilidade de a água retirada do rio ser usada com fins econômicos também serve de motivo para que a transposição seja contestada na Justiça. “O Comitê de Bacia, que é formado pela sociedade, só autorizou a captação da água para o consumo humano e animal, não para o agronegócio e a indústria”, ressaltou Cícero Félix dos Santos.