Luciana Lima
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Empresas brasileiras de tecnologia de informação e comunicação querem aproveitar o cenário de crise global para exportar mais. No entanto, elas esbarram na burocracia do Estado para regulamentação de leis de incentivos e na própria falta de musculatura do setor, pulverizado em micro e pequenas empresas. Estudo feito pela consultoria A.T. Kearney, a pedido da Associação Brasileira de Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom), mostrou que as exportações do setor passaram de US$ 800 milhões em 2007 para US$ 1,4 bilhão no ano passado. O levantamento demonstrou, ainda, que o Brasil ocupa a quinta posição mundial como destino para offshore outsourcing (modalidade de terceirização de serviços feita fora do país de origem). Essa colocação representa um aumento significativo em relação a 2005, quando o país ocupava o décimo lugar. Os empresários, no entanto, acreditam que o país tem condições de exportar mais. “O estudo está mostrando que estamos no caminho certo para nos inserirmos no mercado internacional. Por que não fazer? O que está faltando é cair a ficha. E não adianta cair a ficha só da Brasscom ou só de um setor do governo. Precisa ser uma coisa mais ampla para começar a acontecer", comentou Ricardo Saur, diretor da Brasscom. "Como é um mercado essencialmente de gente, 80 % do custo é gente, é um mercado que não polui, é verde. Que gera emprego, que gera divisas e não tem contra-indicação.”“Crise nunca é bom, mas o setor de TI [Tecnologia da Informação] tem muito mais uma oportunidade nessa crise do que retração. No caso de TI, ela abre certas perspectivas porque as empresas de outros setores têm que cuidar mais de seus processos produtivos para superar suas deficiências. Nada aumenta mais a eficiência em um mundo de competição globalizada do que estar sendo bem informada, em uma estrutura eficiente, toda ela baseada em TI . Nesse contexto, o setor de TI tem um papel a desempenhar para diminuir custos”, destacou Saur.A exportação não corresponde à maior parte da produção brasileira de tecnologia. Grande parcela do que é produzido se destina ao mercado interno, que é grande e crescente. Embora a Índia tenha conseguido destaque no cenário internacional no final da década de 1990, desde então, o Brasil conseguiu destaque na produção de softwares destinados ao setor financeiro. “Na medida em que houve necessidade de programas mais complexos, com a interação com a internet, o Brasil foi se diferenciando. O sistema financeiro brasileiro é o mais avançado no mundo em termos de TI. Ninguém tem um sistema de pagamento como nós temos aqui, que permite fazer uma TED [transferência eletrônica], por exemplo. Isso não veio de graça. Veio de investimentos de anos em formação de pessoas. Vimos que nós somos competitivos,sim”, analisa Saur. Os empresários concordam que para o Brasil fazer frente a países como a Índia - alçada ao mercado internacional de tecnologia em um contexto de crise, devido às ameaças do chamado bug do milênio (ameaça de pane nos bancos de dados devido à mudança na data na virada do milênio-, é necessária a regulamentação da lei que prevê incentivos fiscais de dois tipos.Um permite que as empresas descontem em dobro investimentos em treinamento de pessoal. Outro diminui o encargo trabalhista sobre a folha de pagamento. “Não se mexe nos salários dos trabalhadores, mas desonera a folha”, destacou Saur. O desejo dos empresários é de que ocorra para o setor de tecnologia a mesma desoneração concedida no passado ao setor de hardware. Eles querem convencer o governo de que a área se desenvolverá e o volume compensará a arrecadação. “O mercado cinzento de hardware sumiu. Hoje o governo arrecada mais, cobrando menos do que antes”, comentou Saur.A lei de incentivo foi aprovada no ano passado por ocasião do anúncio da política industrial, mas para entrar em vigor precisa ser regulamentada. O ministro da Ciência e Tecnologia, Sergio Resende, não especificou data para a regulamentação, mas reconheceu a necessidade de que a lei comece a vigorar. “A regulamentação da lei está demorando um pouco, mas está para ser feita brevemente”, disse.Resende destacou que o governo tem preocupação com o setor e que está tomando medidas para injetar recursos e, ainda, incentivar a fusão de empresas com o objetivo de torná-las mais fortes. “Já fizemos coisas importantes. Criamos a subvenção para estimular a exportação, incentivos fiscais para a exportação. Agora o BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social] tem feito um movimento importante para estimular a fusão de empresas. O objetivo é termos empresas maiores na área de tecnologia. Isso é muito importante para dar a elas maior competitividade no mercado global”, enfatizou o ministro. A ação do BNDES para o setor de tecnologia, de acordo com o ministro, deverá ser no sentido de dar um crédito privilegiado a empresas que se fundirem. Outra ação será de usar o BNDESPAR para se tornar sócio da nova empresa de um conglomerado. O BNDESPAR é o braço do BNDES que investe em diversas empresas brasileiras por meio da compra de ações.Sergio Rezende garantiu que os principais recursos para o desenvolvimento de tecnologia não foram contingenciados pelo governo. “São os recursos que formam a subvenção econômica das empresas. A Finep [Financiadora de Estudos e Projetos] está fechando agora mesmo um edital, no valor R$ 450 milhões, a título de subvenção econômica. Trata-se de recurso concedido que não é reembolsável. Não se trata de crédito. A área de software é contemplada”, disse.O descompasso do Brasil no mercado internacional, para o ministro, tem razões na falta de investimento dos governos anteriores em uma política industrial com desenvolvimento de tecnologia própria. “O Brasil começou a conceber uma política industrial no ano de 2003 e uma das áreas escolhidas foi a de software. Passamos algumas décadas sem uma política industrial. Além disso, quando o Brasil teve uma política industrial nas décadas de 1960 e 1970, principalmente, essas políticas não levavam muito em consideração o desenvolvimento da tecnologia nacional. Não é só fabricar aqui. É preciso fazer com conhecimento adquirido aqui, com a nossa inteligência", disse o ministro.