Marco Antonio Soalheiro
Repórter da Agência Brasil
Brasília - O históricojulgamento que selou a manutenção da demarcaçãoem faixa contínua da Terra Indígena Raposa Serra doSol, área de 1,7 milhão de hectares em Roraima, foiapenas o primeiro sobre o reconhecimento de posses indígenas a ser decidido neste ano pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Aindaem 2009, deverão ser julgadas no plenário da Corteações sobre a legalidade de títulos depropriedade de imóveis rurais concedidos em área ocupada por índios Kaingang, no Rio Grande do Sul, e na reserva indígena Caramuru Catarina Paraguaçu, na Bahia.Em setembro do anopassado, o ministro Carlos Alberto Menezes Direito pediuvista do processo referente à Terra IndígenaCaramuru-Paraguaçu, no sul da Bahia, que tramita na Justiçahá 25 anos. Na área de 54 mil hectares, favorávelao cultivo de cacau, vivem aproximadamente 4,5 mil índiosPataxó Hã-Hã-Hãe e fazendeiros queobtiveram títulos de posse do governo do estado - apósjá ter sido feita a demarcação como terraindígena pela União, nos anos 30 do séculopassado.Antes da suspensão do julgamento pelo pedidode vista, o relator, ministro Eros Grau, votou pela declaraçãoda nulidade de todos os títulos de posse emitidos pelo governoda Bahia aos fazendeiros da área.Grau citou que taistítulos não teriam validade porque foram expedidosdepois da Constituição de 1967, que consagrou asterras ocupadas pelos índios como bens da União, comusufruto exclusivo deles. “A baixa demografia indígena emdeterminados períodos, na região, não impede oreconhecimento do caráter permanente da posse dos índios”,disse. O relator ainda acrescentou que, se em algum momento, os índiosnão estiveram na região foi pelo fato de terem sidoexpulsos por fazendeiros.Os Pataxóalegam que “parentes” foram vítimas de assassinatos,sequestros, invasões e ameaças desde que os fazendeirosobtiveram títulos de posse na área.O processo que trata dadisputa por terras entre fazendeiros e índios Kaingang no RioGrande do Sul voltará ao plenário com um voto-vista daministra Cármen Lúcia. A ação foiajuizada pela Fundação Nacional do Índio (Funai), que pede a declaração de nulidade dos títulosde propriedade de imóveis rurais concedidos pelo governogaúcho na região em que vivem os índios.O julgamento da causa começou em maio de 2002 e o relator, ministro Ilmar Galvão(hoje aposentado), votou pela nulidade dos títulos.O ministro do STFCarlos Ayres Britto que relatou o processo da Raposa Serra Sol crêque a decisão da Corte há um mês, noúltimo dia 19 de março, vai nortear futurospronunciamentos em causas semelhantes. “Ela [decisão demanter demarcação contínua da Raposa] vaibalizar não por mérito próprio, porque nãofoi inovação de conteúdo, mas uma reafirmaçãodo que já está na Constituição Federal”,afirmou Britto.Entre as 19condições definidas pelo STF no caso Raposa Serra do Sol, umadelas ressalta ser vedada a ampliação da terraindígena já demarcada. Apenas nesta questão, Ayres Britto foi voto vencido, mas ele nãodescarta que a Corte reveja futuramente este entendimento. Em algunsestados brasileiros, como Mato Grosso do Sul, estudos para novasdemarcações estão em curso para garantir aadequada sobrevivência da população indígena.Britto avalia que o STF consolidou uma posiçãoimportante para a reafirmação dos direitos dos povosindígenas no Brasil. “Foi o reconhecimento da dignidade dosíndios, de que não há cultura étnicasuperior ou inferior a outra. A aculturação temque ser um soma, algo que se ganha, e não algo que se perde. Isso coloca o Brasil na vanguarda mundial da questãoindígena.”A Agência Brasiltentou ouvir dirigentes da Funai sobre as pendências judiciaisem relação à demarcação de terrasindígenas, mas não conseguiu contactá-los. NoSTF, há cerca de 170 processos em tramitaçãoreferentes a variados assuntos indígenas.