Adriana Brendler
Repórter da Agência Brasil
Brasília - O governo federalreduziu o peso dos investimentos sociais em relação aseus gastos totais e aumentou a parcela de recursos destinados àárea financeira para pagamento da dívida pública.O deslocamento de prioridades foi sustentado pelo crescimento dacarga tributária, especialmente pela ampliaçãodas contribuições sociais, constitucionalmenteprevistas para financiar a seguridade social (Previdência,saúde e assistência social).As informaçõesconstam de um estudo divulgado neste começo de ano pelo Instituto dePesquisa Econômica Aplicada (Ipea), comparando a evoluçãodos gastos do governo federal na área social com a políticaeconômica adotada de 1995 a 2005. O período abrangeu asduas gestões de Fernando Henrique Cardoso e os três primeirosanos da gestão de Luiz Inácio Lula da Silva.De acordo com o levantamento, que apontou avulnerabilidade dos investimentos sociais a crises econômicas,os gastos do país com a dívida pública passaramdo equivalente a 3,7% do Produto Interno Bruto (PIB – o total dasriquezas produzidas no país), para 6,5% nos 11 anosavaliados. Em alguns pontos da série, como em 2003, chegaram aatingir 8,5%. Os gastos sociais federais aumentaram em proporçõesmenores, passando de 10,1% para 13,4% do PIB. O estudo mostra que em 1997, ano de inícioda crise na economia brasileira, os gastos com a área socialrepresentavam 60% da despesa total do governo e os recursoscanalizados para dívida somavam 20%. Ao longo dos cinco anosseguintes, os investimentos sociais caíram para 51% e oscustos financeiros avançaram para 34%.De 2003 para 2005, o movimento de inversãodiminuiu, mas ainda assim o percentual de gastos sociais (57%)manteve-se abaixo do registrado em 1995, enquanto a parcela destinadaà dívida avançou 7 pontos percentuais (27%) emrelação ao total das despesas do governo.Segundo o Ipea, o deslocamento da prioridade dogoverno para o pagamento de juros e encargos da dívida públicacomeçou na segunda gestão de FHC (1999 a 2002), mas apolítica de austeridade fiscal, com altas taxas de juros,aumento da carga tributária e contenção degastos para ampliar o superávit primário, foiintensificada no governo Lula.Para os pesquisadores do instituto a opçãopolítica econômica que levou “à imensatransferência de renda do lado real da economia para ofinanceiro” a partir da mudança na composiçãodo gasto público federal “reflete a primazia dos interessesde determinados setores político-econômicos, ligadosprincipalmente à área financeira”.De acordo com o estudo, o aumento do superávitprimário (a economia que o país faz para pagar os jurosde suas dívidas) foi obtido graças à elevaçãoda carga tributária, ampliada de 16,6% para 21,9% do PIB de1995 para 2005. Praticamente, toda a expansão foi gerada pelascontribuições sociais, já que no caso dosimpostos o aumento limitou-se a 0,54 ponto percentual no período.O deslocamento para a área financeira dosrecursos obtidos com o aumento da arrecadação foievidenciado porque o seu crescimento foi 63% maior que o registradono gasto social custeado por tributos no período (que saiu de10,1% para 13,4% do PIB ). Outras despesas não-financeiras dogoverno, como transporte, segurança e custeio dos PoderesLegislativo e Judiciário, que poderiam ter absorvido oexcedente de recursos, também não o fizeram, pois seusgastos ficaram praticamente estáveis.Segundo o documento do Ipea, “o mandamentoconstitucional foi invertido, pois atualmente uma parcelasignificativa de recursos arrecadados para o Orçamento daSeguridade Social, principalmente da arrecadação dascontribuições sociais, é transferida para oOrçamento Fiscal – e não o contrário, comoestava previsto pela Constituição Federal de 1988”.A Agência Brasil procurou os Ministérios da Educação e da Saúde para comentar os dados do estudo, mas foi informada de que eles não iriam se pronunciar sobre o assunto.