José Carlos Mattedi
Repórter da Agência Brasil
Brasília - O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) completa hoje (18) dez anos de promulgação. Para o superintendente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), Marcos Pimentel Bicalho, apesar dos avanços para as vias e rodovias do país, como o maior controle de velocidade, a municipalização do trânsito e a queda no número de mortes em algumas capitais, há “ações diversas pelo país tentando mudar ou burlar o espírito do CTB”.
Hoje, em São Paulo, a ANTP lança o livro Trânsito no Brasil – Avanços e Desafios, que traz uma reflexão sobre a política nacional do setor. A publicação revela, por exemplo, que o número de mortes no trânsito em três grandes cidades brasileiras – São Paulo, Belo Horizonte e Porto Alegre – caiu a partir de 1995. Nas capitais paulista e mineira, a queda foi de 50%, enquanto em Porto Alegre a redução chegou a 20%. “A queda, em termos de índices, seria maior ainda caso se considerasse o aumento da frota de veículos e da população no período”, frisa o livro.
Na opinião de Bicalho, o balanço de uma década do CTB é “vitorioso”, mas ainda é cedo para que a sociedade brasileira ganhe consciência sobre a educação no trânsito. “Estamos falando em mudanças de comportamento, e dez anos é pouco tempo para atingirmos um bom patamar. As crianças já têm uma postura diferente. Elas cobram dos pais comportamentos do tipo: obedecer o sinal, o limite de velocidade, o uso do cinto de segurança etc. Essas mudanças já deram frutos e vão dar mais, a longo prazo”, destaca.
Segundo ele, entretanto, o CTB corre riscos. “A gente vê por aí pressões diversas para abrandar o valor das multas de trânsito, ou para se flexibilizar alguns artigos. O próprio governo, tempos atrás, reduziu o valor da multa por velocidade, que foi um erro. O desafio é manter os avanços do código, que apesar dos êxitos serem grandes, eles não estão ainda consolidados”.
Para Bicalho, há no Brasil dois inimigos da vida no trânsito: o excesso de velocidade e o álcool ingerido antes de se dirigir o veículo. “Ambos têm soluções que passam pela educação e pela punição, mas são fortemente combatidos por alguns segmentos. Essas pessoas não acham abusivo andar a 150 km/hora, mas sim ser multado”, observa.
“Muitos dizem que há uma indústria da multa. Há exageros por parte de algumas prefeituras, sim, mas está longe de ser uma regra. Na visão da ANTP, a penalização é parte integrante do processo educacional. Mas essa tal de 'indústria da multa' é um discurso que pega. É um discurso que tem ressonância na classe média e nos formadores de opinião, o que prejudica o CTB”.
De acordo com o superintendente da ANTP, mudanças precipitadas no CTB seriam “perigosas”, pois “se abre brecha para passar um boi e acaba passando uma boiada”. E enfatiza: “Mudanças tem que ser discutidas com cuidado para não termos derrotas. Não proponho mudanças, que precisam ser bem pensadas para impedir discursos falsos, demagógicos. O estado tem que dar garantia de vida ao cidadão”.
Por fim, Bicalho ressalta que acidentes de trânsito e impunidade ainda são uma realidade no país. “Tem uma brincadeira de mau gosto que diz que, se você quer matar alguém no Brasil, ao invés de dar um tiro, é melhor atropelar a pessoa. Isso porque se matar com uma arma, vai ser preso e responder a processo. Mas, se atropelar, vai pagar uma cesta básica e sair ileso. É uma brincadeira, sim, mas é a pura realidade. Para a Justiça, a pessoa embriagada que faz um atropelamento não está em plenas condições mentais. Então, dirigir bêbado ao invés de ser um agravante é um atenuante neste país. Tudo isso cria condições de impunidade, que é um grande problema”.