Criação do assentamento onde vivem seguidores do Santo Daime foi pedida em 1983

05/11/2005 - 7h26

Thaís Brianezi
Repórter da Agência Brasil

Boca do Acre - O reconhecimento dos moradores do Mapiá, seguidores do Santo Daime, como assentados, foi solicitado ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) já em 1983, quando surgiu a comunidade. É o que mostra um documento arquivado na representação do Incra neste município do interior do Amazonas. Em 1989, a área onde a comunidade está localizada virou uma Floresta Nacional e só agora, a partir de um convênio entre o Incra e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), as 150 famílias que vivem na região estão sendo cadastradas no Sistema de Informações de Projetos de Reforma Agrária (Sipra). Em março do ano que vem, elas devem começar a receber o crédito apoio à instalação, no valor de R$ 7.400.

O documento "Anteprojeto de Assentamento do Igarapé do Mapiá – Gleba Puruini" relata o nascimento da doutrina do Santo Daime, na década de 30. De acordo com o texto, em 1912 o maranhense Irineu Serra mudou-se para o Acre para trabalhar como soldado da borracha. Na fronteira com o Peru e a Bolívia, ele conheceu o chá preparado com o arbusto chacrona (a "rainha") e o cipó jagube, uma bebida alucinógena consumida por descendentes do Império Inca. Da mistura desse ritual indígena com o cristianismo nasceu a doutrina do Santo Daime, que tem como valores a "harmonia, amor, verdade e justiça".

Em 1980, o padre Sebastião Mota Melo (o padrinho Sebastião), seguidor do mestre Irineu em Rio Branco, fundou em Boca do Acre, às margens do rio do Ouro, a Colônia dos Cinco. Três anos depois, por orientação do próprio Incra, já que a área ocupada era particular, o grupo de cerca de 300 pessoas se mudou para a região do igarapé do Mapiá, afluente do rio Purus.

Gildo dos Santos, um dos moradores da comunidade, conheceu o mestre Irineu e começou a frequentar o Santo Daime ainda em Rio Branco. Ele acompanhou o "padrinho Sebastião" até o rio do Ouro e, depois, ao Mapiá. "Eu sou amazonense, estou com 78 anos, vivo na floresta todo tempo. Então aqui eu me acho bem, melhor do que lá na cidade, porque tiro macaxeira, tiro o arroz, tiro o peixe das águas", contou Gildo.

Segundo relato dos habitantes da região, a economia do escambo (troca direta de mercadorias) e da subsistência predominou no Mapiá durante alguns anos. Mas hoje a comunidade já lida com dinheiro, vindo principalmente de turistas estrangeiros. A Associação Comunitária possui um hotel na sede de Boca do Acre, do qual é possível chegar até a Floresta Nacional pelo rio Purus e o igarapé do Mapiá. Na época da cheia, a viagem de voadeira (canoa motorizada) demora três horas.