Fundações de apoio privatizam atividades universitárias, avalia dirigente do Andes

02/03/2008 - 11h41

Ana Luiza Zenker
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Cursos pagos sobre temas que deveriam ser tratadas em disciplinas oferecidas no currículo de graduação. Currículos alterados para adequar uma faculdade ou instituto a demandas de uma pesquisa encomendada por entidades privadas. Pesquisas realizadas dentro da universidade pública, mas cujo conhecimento produzido não pode ser divulgado, pois é segredo industrial.Esses são alguns dos fatos que, na opinião da professora e diretora regional do Sindicato Nacional dos Docentes de Instituições de Ensino Superior (Andes-SN), Solange Bretas, mostram de que forma a atuação das fundações de apoio privatiza as universidades públicas apoiadas.“Na medida em que o estudante tem que pagar taxas dentro da universidade para fazer um curso de especialização, de aperfeiçoamento, que muitas vezes são de assuntos que deveriam estar na grade curricular da graduação, na medida em que os professores que assumem esses cursos pagos, e recebem ali algum salário, alguma bolsa via iniciativa privada, ele transforma a universidade numa instituição em que os professores perdem a força para lutar pelos seus direitos e faz com que o governo introduza cada vez mais elementos da privatização”, afirmou Bretas, em entrevista à Agência Brasil.As pesquisas contratadas por empresas privadas atrapalham o funcionamento da universidade, na opinião da professora, porque os docentes poderiam realizar outras pesquisas de interesse público, em vez de utilizar a infra-estrutura e o prestígio da universidade para fins privados. “Os resultados da pesquisa passam a ser segredo industrial, os contratos assinados proíbem que qualquer um que trabalhou na pesquisa divulgue, use para qualquer outro tipo de coisa, mesmo na universidade”, afirmou.Além disso, Solange Bretas diz que, para cumprir com as encomendas feitas via fundação, muitas vezes as faculdades têm que modificar a sua grade curricular. Isso para se adaptar às necessidades de teoria da pesquisa. “Eles precisam da teoria, e aí a universidade não tem mais autonomia de desenvolver ou de aplicar o seu projeto pedagógico, porque tem que ter um projeto, um currículo voltado para aquele interesse”, diz.“Nós temos casos de denúncias que nos chegaram de professores de universidades, de alguns cursos de universidades que chegam a tirar da grade curricular uma determinada disciplina e oferecem essa disciplina como um curso à parte, de extensão, e cobram via fundação de apoio”, completa.Para Bretas, o que leva a essa forma de privatização da universidade pública é a falta de compromisso do Estado em financiar o ensino e a pesquisa. “O governo acaba deixando ali o professor, como ele não tem incentivo público para isso, acaba se vendendo para a iniciativa privada”, afirma a professora.“O professor usa a estrutura que tem na universidade para fazer pesquisa para iniciativa privada, agora, se ele tivesse recurso público para desenvolver a pesquisa dentro da universidade, certamente ele faria, mas ele não tem”, conclui.Atualmente, existem no Brasil 111 fundações de pesquisa credenciadas pelo Ministério da Educação (MEC). A Fundação deEmpreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec) ligada àUniversidade de Brasília (UnB) é alvo de denúncia do Ministério Públicodo Distrito Federal e Territórios pelo suposto uso indevido de recursosdestinados à pesquisa. A Finatec teria destinado R$ 470 mil à decoraçãodo apartamento funcional ocupado pelo reitor da UnB, Timothy Mulholland. Após a denúncia, o reitor desocupou o imóvel e cinco diretores da fundação foram afastados por determinação da Justiça.