Parto anônimo não é solução para abortos clandestinos, alerta especialista

26/02/2008 - 16h33

Paula Laboissière
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Em caso de gravidez indesejada, a gestante não terá que passar por qualquer tipo de processo abortivo – ilegal no Brasil – ou considerar a hipótese de abandono da criança. É o que propõe o projeto de lei que procura regulamentar o partoanônimo, de autoria do Instituto de Direito da Família(IBDFam).Elizabeth Saar, gerente de projetos da Subsecretaria de ArticulaçãoInstitucional, da Secretaria Especial dePolíticas para as Mulheres, lembrou que a possibilidade decolocar a criança para adoção logo após oparto já existe no Brasil e que a novidade estaria apenas noanonimato da mãe.“Oprojeto não tem ainda regulamentação eprecisa de vários passos. Se aprovado, precisa serregulamentado para dizer com que tempo, quais mulheres, quais lugarese como fica a questão do registro civil da criança,além das conseqüências desse anonimato”, disse.Em países como França, Itália e Bélgica, onde o parto anônimo já foi aprovado, lembrou, circulamquestionamentos acerca das conseqüências desse anonimato, já que a origem da criança nãopode ser localizada. “NaFrança, a identificação da mãe no registro é um X. A criançaperde o direito a saber quem são a mãe e o pai, e isso temconseqüências, por exemplo, para  a necessidade de doação de órgãos", alertou.

SegundoSaar, o Brasil não possui altos índices de abandono decrianças, mas os de prática de aborto clandestino chegam a cerca de um milhão por ano. "O parto anônimo não é solução para o problema e faz parte de uma estratégiade quem é contra o aborto. O quese fala muito é que esse projeto é uma reinstituiçãoda 'roda' em que se deixavam as crianças nas Santas Casas – tocava-se uma sineta, formava-se a roda e alguém, a mãe que desejava abrir mão do bebê, atendia".

Ela disse considerar que, no projeto, as mulheres aparecem de maneira implícitacomo “irresponsáveis”e como pessoas que não queremser vistas como mães. “Nãosei em quê o anonimato vai proteger essas mulheres, porque elas jápassaram pelo pré-natal, as barrigas cresceram e elas jáforam para o hospital. Eu acho um passo para trás porque ascrianças não vêm do nada. Acho inócua essaproposta porque esconde uma realidade", acrescentou.

O fato de mulheres serem levadas, constantemente, atomar esse tipo de decisão, segundo Saar, é sinal de “falha” nas políticaspúblicas. “Maisde 50% das gestações não são planejadas,o que não significa que são todas indesejadas. Acho queas políticas públicas têm que estar voltadas parao planejamento e oferecer um bom pré-natal, para que aquelacriança nasça saudável. E oferecer tambéma possibilidade de a mulher poder decidir”.