Renúncia de Fidel não deve representar mudança de regime em Cuba, diz professor

20/02/2008 - 9h14

Elaine Patricia Cruz
Repórter da Agência Brasil
São Paulo - Depois de quase 19 meses afastado da Presidênciade Cuba por problemas de saúde, Fidel Castro anunciou que nãovai mais reassumir o cargo. O anúncio, em carta assinada porFidel, foi publicado ontem (19) pelo jornal oficial do PartidoComunista – Granma.No período em que esteve afastado do cargopor causa de complicações intestinais, Fidel foisubstituído pelo irmão Raul Castro, que ocupa ocargo interinamente.Para o coordenador do Núcleo de EstudosCubanos (Nescuba) da Universidade de Brasília (UnB), HélioDoyle, a carta de Fidel Castro renunciando à Presidênciade Cuba não representou surpresa para o país nem deveráprovocar uma mudança de regime ou de sistema na ilha.“Vai haver algumas mudanças, talvez napolítica econômica ou na política, mas nada quesignifique uma queda do sistema socialista, do regime que hoje existelá”, disse Doyle hoje (19), em entrevista à AgênciaBrasil.Doyle aposta que haverá continuidade nasucessão, com o irmão mais novo de Fidel, RaulCastro, assumindo o posto de presidente do Conselho de Estado.Agência Brasil: O que representou acarta de renúncia de Fidel Castro?Hélio Doyle:Tecnicamente não foi uma renúncia. Tecnicamente eleanunciou que não é candidato à reeleição.Ele continua no cargo até domingo, quando se reúne aAssembléia Nacional. Ele ainda é o presidente doConselho do Estado. ABr: O que esse anúncio de FidelCastro representa para Cuba? O que deve mudar no país?Doyle:Já havia uma certa expectativa de que isso pudesse acontecer aqualquer momento, em função do estado de saúdedele. Ele está há muito tempo afastado do governo e nãotem aparecido em público. Todas as indicações,inclusive algumas que ele mesmo deu em alguns textos publicados nojornal e em alguns textos que ele mandou para uma emissora de televisãocubana, já prenunciavam que isso pudesse acontecer em funçãodo estado de saúde dele. Então não há umagrande surpresa. A expectativa de que pudesse acontecer énormal. Vejo agora um processo de sucessão em que a marca, emminha opinião, é a continuidade.ABr: Como vai funcionar esse processo desucessão em Cuba?Doyle: O processo lácontinua normal. Houve eleição para a AssembléiaNacional no mês passado e agora, no próximo domingo(24), ela se reúne - se não me engano são 610membros - para eleger o Conselho de Estado, que é o órgãomáximo e que elege o presidente do Conselho de Estado. AAssembléia vai eleger um nome indicado para ser o sucessor deFidel e que, quase certamente, será Castro [Raul].ABr: Raul Castro, então,seria o sucessor...Doyle: Sim. Ele já estava emexercício. Ele já é o primeiro vice-presidentedo Conselho de Estado. É ministro das Forças Armadas e,junto com Fidel, é um sobrevivente do processo revolucionário.Além de ser irmão mais novo de Fidel, eles estãojuntos desde o assalto ao quartel Moncada, que foi quatro ou cincoanos antes da Revolução. É uma sucessãonatural.ABr: Então não deve havergrandes mudanças?Doyle: Mudanças sempre há.Cuba é um país numa situação bastantepeculiar, com muitas dificuldades e, certamente, há umprocesso de mudanças e esse processo pode ser atéintensificado. O que é importante dizer é que essasmudanças não vão ter um sentido radical demudança do sistema. O sistema não vai mudar. O regimenão vai mudar. Vai haver algumas mudanças talvez napolítica econômica, ou na política, mas nada quesignifique uma queda do sistema socialista, do regime que hoje existelá.ABr: Como fica o cenáriointernacional? Pode influenciar as eleições americanas,por exemplo?Doyle: As eleições nos EstadosUnidos não indicam nenhuma mudança em substancial, depolítica americana, em relação a Cuba. Se bemque o candidato Barak Obama diz que vai dialogar com todos os que,hoje, são considerados inimigos pelos Estados Unidos. Mas nãose prevê nenhuma mudança em função atéda política interna americana. Você tem, por um lado, umgrupo muito grande de cubanos que se naturalizaram norte-americanos eque tem uma influência muito grande na política internados Estados Unidos, especialmente no estado da Flórida. Masnão apenas lá. Por outro lado, você temprodutores de alimentos, especialmente, e empresários, que seressentem do bloqueio porque não podem vender produtos paraCuba. Isso pode levar a um choque, dentro dos Estados Unidos, sobre ofim do bloqueio. Mas não acredito que haja mudançassubstanciais na política americana só em funçãode Fidel Castro ter sido sucedido por Raul Castro. ABr: Mas a pressão americana podeaumentar sobre Cuba?Doyle: Aumentar sempre pode, mas elajá é tão grande que é difícilcalcular um aumento se não fosse por uma intervençãoarmada e que, naturalmente, não está sendo considerada.A pressão já é bastante grande. Tem o bloqueioeconômico e pressões de todo tipo - diplomáticas,de transmissões radiofônicas etc. A pressão jáé bastante grande.