Paulo Machado
Ouvidor da Radiobrás
Brasília - A sociedadecontemporânea se tornacada diamais complexa.Essa complexidade se traduz em opções para o ser humano se alimentar,vestir, locomover, informar ou até mesmo se divertir. Para o cidadãofazer as escolhasnecessárias a cada momento,é preciso quetenha informação. As informaçõessão tãocomplexas quanto a realidadeque elasretratam. Ao jornalismo compete buscar no Estado, no governo e na sociedadeessas informações, organizá-las em forma de notícias e servi-las ao públicopara que tomedecisões. Foi issoque a Agência Brasil fez no casoda reportagem multimídia sobre o “Consumoconsciente” quepode ser acessada na seçãode Grandes Reportagens. No casodos organismos geneticamente modificados(OGMs), genericamente chamados de transgênicos,essa informação se tornavital, literalmentefalando, pois o queestá em jogoé o direito à vida,à segurança alimentar e aum meioambiente equilibrado. Há poucomais de 50 anoso brasileiro médiose alimentava de arroz, feijão, carnes,frutas e verduras,tudo innatura. Praticamente não existiam comidascongeladas ou industrializadas. E muito menos alimentos preparadoscom ingredientesgeneticamente modificados. A populaçãocontinua contando com o bom e velho jornalismo para se informar sobre oque faz bem ou faz mal à saúde ou ainda sobre o que se descobriu oufalta descobrira respeito de determinadoalimento, forma de preparo ou uso de ingredientesmodificados. Muitas dessas informaçõesdeveriam estar nosrótulos dos produtos,mas aindanão estão porrazões diversas, apesarde a Lei de Biossegurança* obrigar os fabricantesa fornecer essesdados. Mas será que o jornalismo sepreparou para acompanhar o ritmo das inovações e a complexidade da sociedade deconsumo pós-industrial?As expressõesutilizadas no título desta coluna e os respectivosconceitos queas envolvem foram cunhados nas últimas décadas – tambémnão existiam há 50 anosatrás. Seusignificado ligado à vida (bios, em grego),reflete a complexidade que ela atingiu na sociedade contemporânea desdeque o homemresolveu modificar as cadeiasgenéticas das espéciesoriginadas há milhões, bilhões de anospela naturezaem equilíbrio.Essas formas de vida,transformadas pela ação científica do homem, disputam espaço, tanto nasprateleiras do supermercado, quanto nas cadeias alimentares das diferentes espéciesque ainda sobrevivem. Ao Estadocompete regular e fiscalizaressas transformações genéticaspromovidas por empresasligadas ao fornecimentode insumos paraa agricultura e ao setorde alimentos. Ao jornalismocabe informar sobreas pesquisas, a regulação, afiscalização e as possíveis conseqüências para o homem e para meio ambiente,proporcionando ao cidadão condições de participardesse debate e tomar decisões.Para participar desse debate, o cidadão precisa se apropriar dessa linguagem biológica, entendero significado e os conceitose, principalmente, os interesses econômicose políticos queenvolvem a questão. Comexceção de algunspoucos gruposde ambientalistas, de cientistas e de gestores públicos,observa-se que a sociedadetem se mantido e vem sendo mantida apartada dessa discussão.Não cabe no espaço,nem nosobjetivos desta coluna,discutir os motivospor queas coisas estão acontecendo dessa maneira e nãode outra. A questãoaqui é comoo jornalismo da Agência Brasil vem cobrindo o assunto para possibilitara inclusão do temana agenda da cidadania. O Estadobrasileiro vem criando uma multiplicidade de leis e de órgãos,muitos deles disputando entre si competências e responsabilidadespara regular e fiscalizar o assunto.Esse foi o casoque envolveu a AgênciaNacional de VigilânciaSanitária (Anvisa) e a Comissão TécnicaNacional de Biossegurança (CTNBio) a respeito da consulta públicarealizada pela Anvisa paraestabelecer normase procedimentos de fiscalização do usode organismos geneticamente modificadose seus impactosna saúde humana.O fato foi retratado na matéria Regulamentoda Anvisa sobre transgênicos será documento consultivo, publicada em 10 de agosto. Mas, se a coberturatem obtido êxito emnoticiar os fatosdesse processo, a suacontextualização tem deixado a desejar no que tange mostrar as relações entreos diversos protagonistase os interesses queos motivam ou quedefendem.Reportar opiniões de um lado e de outro envolvidos na disputaé importante, masexplicar emque contextoessas opiniões se inserem é fundamental para que o cidadãoforme a própria opinião.A coberturada Agência Brasil sobretransgênicos tem refletido as controvérsias entreos grupos representantes das indústrias de insumosagrícolas, produtoras de sementes transgênicas e agrotóxicose os ambientalistas nas decisões tomadaspela CNTBio sobrea liberação de variedadesgeneticamente modificadas para consumohumano e animal.O episódio maisrecente retratado pelaAgênciaenvolveu a liberação comercial da primeiravariedade de milhotransgênico pelaCNTBio. As matériasnão contêm nenhuma referênciamais específicaàs pesquisas nas quaisa CTNBio baseou a avaliação da biossegurança do plantiodo milho transgênicoLiberty Link. A reportagem se limitoua colher as opiniõespessoais dos técnicose dos representantes das partesinteressadas como se houvesse apenas dois lados na questão. Foram publicadas 104 matérias desde julho de 2006 atéagora. Algumas das dificuldadesem tratardo tema puderam serverificadas no dia 8 de outubro, quandofoi publicada a seguinte errata: “As matérias ‘Comissão de biossegurança libera milhotransgênico’, ‘Aprovaçãode milho transgênicoainda precisada ratificação do ConselhoNacional de Biossegurança’, ‘CTNBioaprova nova liberaçãode milho transgênicopara venda nopaís’ e ‘Comissãode biossegurança libera terceiro tipo de milho transgênico’, publicadas respectivamenteem 16 de maio(as duas primeiras), 16 de agosto e 20de setembro, permaneceram com uma informaçãoerrada até as 20h44 de hoje (8). As matériasidentificavam equivocadamente o órgão pelo qual passam as decisões da ComissãoTécnica Nacionalde Biossegurança (CTNBio). Trata-se do ConselhoNacional de Biossegurança, e não do Comitê Nacional de Biotecnologia.A correção foi feitaa partir de contatode leitor coma Ouvidoria da Radiobrás.”A mensagem do leitor AndréSoares Oliveira, que deu origem à correção do erro, foi a seguinte: “Devoregistrar alguns erros nas notícias da AgênciaBrasil sobre os transgênicos. Uma vez aprovados pela Comissão TécnicaNacional de Biossegurança (CTNBio), eles seguem para ratificação pelo ConselhoNacional de Biossegurança (CNBS), que é o órgão formado pelos ministros epresidido pela Casa Civil. O Comitê Nacional de Biotecnologia não tem nada aver com esse processo. Gostaria que vocês corrigissem as notícias e tomassemconta desse detalhe importante.”Se atéos jornalistas têm dificuldadesem utilizar nomes, siglas econceitos, imaginem o cidadão. Todavia,a complexidade do tema não pode ser uma desculpa para que ele não seja devidamenteesclarecido. É necessárioum esforçomuito maiordo que o feitoaté agorapara conseguir aprofundar a apuração dos fatose dos interesses queestão por trásdeles, traduzir os conceitose incluir a populaçãonesse debate. Esseé o desafio quese coloca neste momento paraos profissionais da Agência Brasil. Talvez,para dar contado assunto coma atenção e a importânciaque elerequer, seja necessária, até mesmo, certa especialização dos profissionaise das estruturas de produçãodo jornalismo. Até a próxima semana. (*) A Lei da Biossegurança pode seracessada em: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/_Ato2004-2006/2005/Lei/L11105.htme o decreto que a regulamentou em: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/_Ato2004-2006/2005/Decreto/D5591.htmParticipe do 3º ENCONTRO REGIONAL DEOUVIDORIAS PÚBLICAS – REGIÃO SUL –"A Construção da OuvidoriaPública no Brasil", que se realizará nos dias 25 e 26 de outubro de 2007, em Porto Alegre.Mais informações: http://www.cgu.gov.br/Eventos/Ouvidoria_Sul/Index.asp