Projeto de lei prevê identificação obrigatória de usuário de internet

14/11/2006 - 21h54

Mylena Fiori
Repórter da Agência Brasil
Brasília - O Projeto de Lei que normatiza o uso da Internet no Brasil (PL 84/99) voltou a ser debatido hoje (14) em seminário promovido pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara. O texto, que foi aprovado pela Câmara dos Deputados, mas barrado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, propõe, entre outras medidas, o cadastramento do usuário no provedor de acesso e torna obrigatória a identificação, o fornecimento de senha ou similar, nome completo, data de nascimento, um número de documento hábil e legal de identidade e endereço completo.De acordo com o projeto, caberá ao provedor garantir a autenticidade dos dados. E também fornecer, quando solicitado pela autoridade competente, no curso de investigação, os dados e informações de conexões realizadas e os dados e informações de identificação do usuário.No seminário Liberdade de Acesso à Internet e Combate ao Crime Cibernético, promovido pela Comissão, Marcelo Bechara, especialista em inclusão digital do Ministério das Comunicações, disse acreditar que o substitutivo aprovado pela Comissão de Educação do Senado, “de uma forma geral”, é bom. “Traz algumas inovações importantes”, avaliou. Mas condenou com veemência a identificação dos usuários.“Esse instrumento de comunicação foi constituído com bases sólidas de liberdade. Qualquer forma de restrição ou limitação ao acesso prejudica o próprio desenvolvimento e vai na contramão da Internet”, afirmou. Bechara destacou ainda que a população não teria condições de arcar com o custo da certificação digital: “Qualquer burocracia que se estabeleça é exclusão digital”.Na opinião do representante da Associação Brasileira de Provedores de Internet, Antônio Tavares, "o projeto de lei certamente expõe a privacidade e cerceia o direito à informação”.Outro ponto polêmico do projeto de lei é o uso da expressão "Acesso Indevido" à rede de computadores. O texto prevê que acesso indevido é crime, com pena de reclusão de dois a quatro anos e multa. “Quem, das pessoas que acessam a internet, não pode ser enquadradas no acesso indevido? O que é acesso indevido?”, indagou Pedro Antonio Dourado de Resende, professor do Departamento de Ciências de Computação da Universidade de Brasília. “Minhas críticas têm o único propósito de evitar que essa Casa, a pretexto de combater crimes hediondos, cometa exageros”, afirmou.Ela Castillo, procuradora federal dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal, disse estar preocupada com a interpretação que pode ser dada à expressão. “Acesso indevido pode ser uma infinidade de condutas. Não concordamos que haja uma norma penal que transfira para o poder jurisdicional a definição do que é acesso indevido. Isso pode ser utilizado de forma arbitrária, contra os direitos humanos e fundamentais”, argumentou.E Demi Getschko, conselheiro e representante de Notório Saber em Assuntos da Internet do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.Br), alertou para a responsabilidade que o país tem ao formular uma lei sobre crimes cibernéticos. “O Brasil é bastante ouvido lá fora e temos que prestar atenção como se refletem lá fora as decisões internas. Quem entra nesse mundo [internet] sabe que está exposto a riscos. Os usuários têm que ser educados para conviver com isso, não adianta superproteção”. Ao final do encontro, o presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), disse que sugerirá ao Senado que as questões polêmicas sejam retiradas do projeto de lei substitutivo, para aprofundamento dos debates. Dessa forma, a parte consensual do projeto poderia ser votada ainda este ano.