Juliana Andrade
Repórter da Agência Brasil
Brasília - O trabalho dos auditores da Controladoria-Geral da União (CGU) que fiscalizam a aplicação de recursos públicos federais pelas prefeituras começa antes mesmo da chegada dos fiscais aos municípios escolhidos por sorteio. Após a seleção, eles fazem o levantamento de toda verba federal repassada aos municípios, programa por programa. Com isso, os auditores chegam em cada localidade com as informações necessárias para iniciar a verificação dos gastos do dinheiro público.
"Assim eu sei que características determinada obra teria que ter", explica a analista de Finanças e Controle da CGU Elaine Giacomel, 28 anos. Segundo a auditora, esse procedimento inicial é um meio de constatar o desvio de verbas. "Eu tenho que saber o maior número de detalhes possível, para poder ver se a obra efetivamente foi executada como o previsto, porque uma das formas de desvio pode ser executar a obra com material mais barato ou de qualidade inferior".
De acordo com Elaine, esse é um dos exemplos de irregularidades encontradas pelos auditores que atuam no Programa de Fiscalização a partir de Sorteios Públicos. Implementado em abril de 2003 pelo governo federal, o programa usa o sistema de sorteio das loterias da Caixa Econômica Federal para definir os municípios a serem fiscalizados.
Segundo o secretário Federal de Controle Interno da CGU, Valdir Agapito, o objetivo é inibir a corrupção entre gestores públicos. De acordo com ele, entre os problemas encontrados nos municípios fiscalizados, também estão obras inacabadas ou paralisadas, mesmo depois de pagas, gastos sem licitação, uso de notas fiscais frias e documentos falsos, irregularidades no processo de licitações, superfaturamento de preços e falta de merenda escolar e
de medicamentos.
Cada equipe que visita os municípios para fazer a fiscalização é formada por sete pessoas, em média, e permanece cerca de uma semana em cada localidade. Dependendo da região, esse período pode se estender.
O trabalho dos fiscais não se limita ao exame de documentos e à inspeção das obras e serviços. Segundo Elaine, a ajuda da população também é fundamental, por isso eles costumam recorrer aos conselhos comunitários, a entidades organizadas e aos próprios moradores. Os auditores querem saber, por exemplo, se a merenda escolar está chegando às crianças. "A gente vai até a escola, conversa com a diretora da escola, com os alunos, com a merendeira: ‘você está conseguindo fazer comida para crianças, que tipo de merenda que você está recebendo?’. Porque também existem diferenças. Ele (o gestor municipal) diz que comprou verdura, só que na escola eles dizem ‘não, a gente nunca recebeu verdura’. Isso acontece".
De acordo com o secretário, o trabalho de fiscalização ganhou o reforço da chamada equipe precursora, que é enviada aos municípios logo após o sorteio. "A idéia é descobrir o que pode ser mais observado e fiscalizado, o que não pode de deixar de ser visto pelos fiscais. Os moradores participam, fazem suas denúncias, chega até a vir caravanas de municípios vizinhos para pedir que os fiscais também vão até a cidade em que moram", conta. Para Agapito, essa é uma forma de estimular os cidadãos a participar do controle do uso dos recursos públicos e a cobrar a aplicação correta das verbas.
Até agora, já foram sorteados 801 municípios. Os recursos fiscalizados, do primeiro ao décimo terceiro, totalizam aproximadamente R$ 4 bilhões. Foram realizados 16 sorteios. O resultado do trabalho dos fiscais é reunido num relatório, encaminhado aos ministérios gestores, à Polícia Federal, ao Ministério Público Federal, ao Tribunal de Contas da União, às câmaras municipais, entre outros órgãos encarregados de adotar as providências cabíveis. Segundo o secretário, para comprovar o desvio de recursos públicos, muitas vezes os fiscais usam fotografias e filmagens.
"Nós temos um caso de uma obra em que a empresa que aparecia nos papéis era uma farmácia, e as obras estavam paralisadas há mais de 10 meses. Só que o dono da farmácia disse que não tinha feito obra nenhuma. Então, nós usamos no relatório, a fotografia da farmácia".
Valdir Agapito destaca que muitas fiscalizações revelam esquemas de corrupção e que, nesses casos, é necessária a ajuda da Polícia Federal e do Ministério Público Federal. Ele citou o caso em que uma única empresa era responsável pelo fornecimento de 70% dos produtos a prefeitura de um determinado município. "Ela fornecia desde medicamentos até produtos de construção de obras, desde merendas até prestação de serviços".
Segundo o secretário, o trabalho da CGU nos municípios também consiste em apontar caminhos para corrigir os problemas encontrados. "Não é só apontar irregularidades, mas orientar a correção de rumos. A gente estimula, por exemplo, que as prefeituras usem as compras por meio eletrônico", ressalta.