Monica Yanakiew
Correspondente da Agência Brasil/EBC
Buenos Aires – O próximo presidente do Paraguai, que será eleito domingo (21) e assumirá em agosto, tem um desafio pela frente: administrar os conflitos de terra, que marcaram o governo de Fernando Lugo (2008-2012) e ameaçam os 350 mil brasiguaios – como são chamados os brasileiros e seus descendentes que moram no país. A maioria vive da produção agrícola.
A agropecuária representa 25% do Produto Interno Bruto (PIB) paraguaio, mas é responsável por 40% do crescimento econômico do país, que este ano pode alcançar 13%, segundo as ultimas estimativas do Banco Central do Paraguai. Os brasiguaios são responsáveis pela grande parte da produção agrícola paraguaia – “cerca de 80%”, assegura a advogada Marilene Sguarizi, filha de colonos brasileiros e representante de cooperativas agrícolas.
Durante a campanha eleitoral, representantes dos brasiguaios reuniram-se com os dois presidenciáveis que lideram as pesquisas de opinião: Horácio Cartes, do Partido Colorado, e Efrain Alegre, do Partido Liberal Radical Autêntico. “Existe muita incerteza sobre quem vai ganhar, mas nestas eleições temos uma vantagem: tanto Cartes quanto Alegre têm consciência de que é preciso resolver o problema dos conflitos de terra”, disse Marilene, em entrevista à Agência Brasil . “Pedimos a ambos estabilidade jurídica”, acrescentou.
Em 2012, carperos (como são chamados os sem-terra paraguaios) ocuparam fazendas de Tranquilo Favero – um brasileiro, naturalizado paraguaio, conhecido como “rei da soja”. Alegavam que os títulos de propriedade dos produtores brasileiros são falsos. Favero, assim como muitos outros brasiguaios, adquiriram terras baratas durante a ditadura de Alfredo Stroessner (1954-1989). Segundo movimentos sociais ligados à reforma agrária, terras do estado foram vendidas de forma irregular.
Os brasiguaios dizem que compraram as terras de boa-fé e que investiram tempo, trabalho e dinheiro para torná-las produtivas. Atualmente, o Paraguai é o quarto produtor mundial de soja e está entre os maiores produtores de carne. “Para continuarmos investindo precisamos ter garantias jurídicas, que não existiam no governo de Lugo”, disse a advogada Marilene Sguarizi.
Eleito em 2008 com a promessa de governar para os pobres (que representam 30% da população paraguaia), o ex-bispo Fernando Lugo procurou resolver o conflito de terras sem repressão, deixando a questão nas mãos da Justiça. Mas sem intervenção da polícia, as ordens judiciais para desocupar as terras não eram cumpridas.
Foi um conflito de terra que desencadeou a queda de Lugo, um ano antes de concluir seu mandato. No dia 15 de junho de 2012, um enfrentamento entre policias e sem-terra, no interior do país, resultou na morte de 17 pessoas. O Congresso (de maioria opositora) acusou Lugo de “mau desempenho” e o submeteu a julgamento político. Uma semana depois do massacre, ele foi destituído e substituído pelo vice, Federico Franco – político conservador do Partido Liberal Radical Autêntico.
Mal assumiu, Franco recebeu 12 representantes da colônia brasileira no Paraguai, que manifestaram publicamente seu apoio ao novo governo e pediram à presidenta Dilma Rousseff que fizesse o mesmo. De nada adiantou.
Os governos da região questionaram a legitimidade do impeachment “relâmpago”, que Lugo chamou de “golpe parlamentar”. Brasil, Argentina e Uruguai suspenderam o Paraguai do Mercosul até as eleições presidenciais e incluíram a Venezuela como membro pleno. A adesão venezuelana tinha sido vetada, até então, pelo Congresso paraguaio – o mesmo que destituiu Lugo.
“Nós fomos beneficiados pelo processo de impeachment e nos sentimos traídos pelo governo brasileiro”, disse Marilene Sguarizi. “Na hora em que nossas terras estavam sendo invadidas, ninguém nos apoiou – o Brasil dizia que era um problema interno do Paraguai. Na hora em que os paraguaios destituem Lugo e colocam um presidente que faz valer a lei, o Brasil nos dá as costas”, acrescentou.
Tanto Cartes quanto Alegre têm posição mais favorável aos donos de terras do que Lugo. Cartes é candidato do Partido Colorado, que esteve no poder durante 61 anos, 35 deles na ditadura de Alfredo Stroessner. “Para os colorados, é delicado discutir a venda de terras a brasileiros nos tempos de Stroessner”, disse à Agência Brasil o diretor do Centro de Análise e Difusão da Economia Paraguaia (Cadep), Federico Masi.
Já Alegre pertence ao mesmo partido que Franco, “mas os liberais estão divididos em três facções e nem todas pensam igual”. Alegre pertence a uma ala mais moderada que a do atual presidente e que apresenta um discurso mais social.
Apesar de o Paraguai ter se beneficiado da alta nos preços da soja e ter reduzido os níveis de pobreza de 40% a 30%, o nível de indigência não baixou. “A indigência ainda afeta 19% dos paraguaios, a grande maioria no setor rural”, disse Masi.
Edição: Davi Oliveira
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