Relevo e forma de ocupação contribuíram para enchentes e deslizamentos no Vale do Paraíba

09/01/2010 - 0h38

Elaine Patricia Cruz
Repórter da Agência Brasil
São Paulo - De um lado, a Serra do Mar.De outro, a Serra da Mantiqueira. E cruzando esse vale, o Rio Paraíbado Sul. É nessa região, a leste do Estado de São Paulo, que estálocalizado o Vale do Paraíba, umas das áreas mais afetadas pelas chuvasdeste ano. Segundo levantamento da Defesa Civil, denominado OperaçãoVerão e com dados de 1º de dezembro doano passado até ontem (8), 17 municípios que compõem a região do Valedo Paraíba foram afetados pelas chuvas e dois deles, Cunha e São Luizdo Paraitinga, estão em estado de calamidade pública. Só no Vale doParaíba, seis pessoas morreram e mais de 4 mil ficaramdesabrigadas e outras 5 mil desalojadas por causa das chuvas. Umapessoa ainda continua desaparecida na cidade de São Luiz do Paraitinga. “OVale do Paraíba, com suas características de terreno e de ser um valealongado, estreito e encaixado entre duas cadeias de montanhas, tem umacerta suscetibilidade, uma vulnerabilidade natural porque tem duascabeceiras, duas regiões montanhosas que influenciam o clima local e aretenção e passagem das nuvens. E quando chove lá, os afluentesdeságuam no Rio Paraíba do Sul”, explicou Paulo César Fernandes daSilva, geólogo, pesquisador e diretor adjunto do Instituto Geológico deSão Paulo, vinculado à Secretaria estadual do Meio Ambiente.Oque ocorre, segundo ele, é que parte da ocupação do Vale avançou até aplanície do rio, onde ocorre o regime natural de inundação. “O serhumano foi ocupando várzeas e se ocupou de um terreno onde naturalmenteo rio enchia. Em algum momento aquela região vai ficar alagada”,afirmou. Em entrevista à Agência Brasil nesta semana, o pesquisadorafirmou que há um estudo em andamento no Instituto Geológico sobre oVale do Paraíba e que já identificou, numa busca por jornais desde 1970até hoje, que a região sofreu com enchentes e inundações pelo menos 1,5mil vezes.Silva compara os eventos que ocorreram por causa daschuvas com os bolinhos de lama que são feitos nas brincadeiras decrianças e que se diluem se for acrescentada muita água a eles. “Quandoo volume de chuva é grande, a história do bolinho de terra vai ocorrer.Chega uma hora em que o solo vai absorvendo a água e ela começa a irpara as camadas mais inferiores, mas há um momento em que se vai ter umacamada de argila ou, como no caso de Angra dos Reis (RJ), de rocha impermeável”, explicou. Quando esbarra com essas camadas maisimpermeáveis, a água começa a saturar o solo e a subir. E então podemocorrer as enchentes ou a movimentação do solo (como os deslizamentosde terra). De acordo com Silva, há três fatores que contribuempara que ocorram problemas como os que foram verificados nas cidades doVale do Paraíba e também em Angra dos Reis: a característica do terrenoe do relevo, o sistema atmosférico e o fator humano, o que envolve aocupação e a falta de planejamento histórica. “No caso, tem até umadimensão histórica, cultural, da nossa colonização, de nosso processocivilizatório de ocupação do solo. A perspectiva é de ir consertando,melhorando, de diminuir o número de erros. Mas a natureza está semanifestando, independente de nós, brasileiros. A natureza está dandomanifestações de uma modificação que está mais rápida do que o usual,ao que tudo indica. E precisamos nos esforçar para encontrar um ritmocerto para nos adaptarmos a essas modificações”, afirmou.E amaneira de se prevenir eventos como esse, defende Silva, é complanejamento, o que envolve bons planos diretores municipais,mapeamentos, ordenamento territorial e zoneamentos ecológicos eeconômicos e que, em sua visão, estão começando a ser feitos, emboraainda não na velocidade desejada.