No ritmo atual, Brasil ainda levará décadas para erradicar o analfabetismo

12/05/2009 - 9h05

Amanda Cieglinski*
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Se o ritmo de redução da populaçãoanalfabeta permanecer o mesmo dos últimos anos, o Brasil aindalevará algumas décadas para se livrar de um problemaque hoje atinge um em cada dez brasileiros: o analfabetismo.No ano 2000, na Conferência Mundial de Educação,em Dacar (Senegal), o Brasil assinou junto com 128 países umpacto para melhorar a qualidade do ensino. Entre as metasestabelecidas, está reduzir pela metade a taxa deanalfabetismo no país até 2015, chegando ao percentualde 6,7%.APesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad)de 2007 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística(IBGE) revela que 14 milhões de analfabetos vivem hoje nopaís. O contingente representa 10% da populaçãocom mais de 15 anos. Se em 15 anos o percentual de pessoas que nãosabem ler e escrever caiu de 17,2%, em 1992, para 9,9%, em 2007, nosúltimos anos o ritmo de queda está praticamenteestagnado. De 2005 para 2006, a redução foi de 0,7% ede 2006 para 2007, de 0,4%.Paraa Organização das Nações Unidas para aEducação, a Ciência e a Cultura (Unesco),responsável por monitorar o compromisso Educaçãopara Todos, firmado durante a Conferência Mundial de Educação,vai ser muito difícil o Brasil atingir a meta esperada para2015. “Isso exigiria um esforço muito maior do que o queestá sendo feito. A gente espera que o Brasil consiga atingira meta, mas acho que isso ainda vai permanecer no reino dosdesafios”, diz o especialista em educação de jovens eadultos da Unesco, Timothy Ireland.Aprincipal estratégia do Ministério da Educação(MEC) para reduzir o problema é o programa BrasilAlfabetizado, que dá apoio técnico e financeiro paraque municípios e estados criem turmas de jovens e adultos. Ameta é atender 2,2 milhões de pessoas em 2009."Oprograma é muito complexo de implementar, não ésimples. Isso porque você precisa mobilizar o analfabeto, criarcondições de formar o alfabetizador. É umpúblico difícil e as razões para isso estãona história que ele traz. Em geral, o analfabeto tem muitopouca confiança na sua capacidade de aprender”, afirma osecretário de Educação Continuada, Alfabetizaçãoe Diversidade do MEC, André Lázaro.Naopinião de especialistas, o analfabetismo tambémpotencializa e multiplica situações de exclusão,além de submeter as pessoas a constrangimentos e a situaçõesde preconceito.Pornão saber ler, a aposentada Áurea Freitas de Souza, 85anos, conta que precisa de ajuda em tarefas simples do dia a dia,como ler receitas de comidas, de remédios e pagar contas.“Quem não sabe ler nem escrever está na escuridão,fora do mundo. Parece que não existe”, resume a moradora doRio de Janeiro.A aposentada criou suas própriasestratégias para driblar as dificuldades decorrentes doanalfabetismo. Para pegar ônibus, por exemplo, ela aprendeu aidentificar as letras do destino ou os números do veículo.Quando precisa ir ao banco pagar uma conta, sai de casa com odinheiro contado.Alémde alfabetizar aqueles que não tiveram acesso ao ensino, paraencerrar o ciclo do analfabetismo é preciso trabalhar tambémna outra ponta: garantir a qualidade da educação paraque a escola não produza novos analfabetos.Parao pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada(Ipea) Marcelo Medeiros, esse problema é ainda mais grave.“Ainda que essas crianças não sejam analfabetascompletas, mas funcionais, elas saem da escola sem capacidade deletramento, sem capacidade de dominar os textos. Isso épreocupante e é sinal do mau funcionamento do sistema deensino”, alerta.Osespecialistas entrevistados pela Agência Brasilacreditam que os motivos para a persistência do problema estãoligados a campanhas de mobilização ineficazes, àmá qualidade do ensino público como um todo e àfalta de oferta de cursos de educação de jovens eadultos para que os alfabetizados possam continuar os estudos.Alémde políticas ineficazes, falta consciência social sobreo problema, na avaliação da especialista da USP. “Háuma certa invisibilidade desse tema, como se pudéssemos passarà margem de 14 milhões de brasileiros. Não éum problema residual, nem um problema do passado. É umproblema que se repete a cada dia”, alerta Maria Clara.Sériede matérias especiais produzidas pela Agência Brasilmostra quais são os principais gargalos desse problema epossíveis soluções para que o país supereo analfabetismo.