Entenda a crise política e as pressões sociais na Bolívia

07/03/2005 - 22h49

Brasília - "As posições de alguns dos mais importantes protagonistas da política boliviana e de algumas organizações sociais, regionais e sindicais, estão levando a Bolívia a um ponto de confrontação que põe em risco, em meu entender, nosso futuro e nossa viabilidade". Este é um trecho da carta de renúncia que o então presidente Carlos Mesa Gisbert apresentou ao Congresso Nacional Boliviano nesta segunda feira. Mesa se refere aos movimentos sociais que reivindicam mudanças na condução política e econômica do país.

No poder há 17 meses, Carlos Mesa assumiu o governo após outra crise política: a renúncia de Gonzalo Sanches de Lozada em outubro de 2003. Lozada havia sido eleito em 2002 com apenas 1% a mais dos votos válidos que seu opositor - o líder cocaleiro Evo Morales. Na ocasião de sua renúncia, o ex-presidente Lozada enfrentava a mesma oposição dos movimentos sociais em questões como a participação de empresas multinacionais na exploração dos recursos minerais do país.

Ao saber do pedido de renúncia de Carlos Mesa, Evo Morales declarou ao Jornal Los Tiempos que a renúncia é uma "chantagem do presidente ao povo boliviano" e que ela está "longe de satisfazer as demandas dos setores sociais" que exigem que as empresas petrolíferas estrangeiras paguem mais impostos sobre a exploração de petróleo.

Entre as reivindicações, os movimento sociais pedem o pagamento de 50% de impostos sobre seu faturamento e não apenas 18% como o governo pretende incluir na "Lei de Hidrocarburos" (na tradução, Lei de Hidrocarbonetos), que deve ser submetida a referendo popular para, somente depois, regulamentar a matéria.

Em outro trecho da carta de renúncia, Carlos Mesa se refere ao bloqueio de estradas e poços de petróleo promovido pelas organizações de oposição. "Não posso seguir governando assediado por um bloqueio nacional que estrangula o país, ultimatos, greves, ameaças e ações que não fazem outra coisa que destruir nosso aparato produtivo, nossa confiança e nosso futuro".

No entanto, para Evo Morales, a atitude do presidente não fará retroceder a determinação das seis federações nacionais de produtores de folha de coca de bloquear a principal via de comunicação entre o leste e o oeste do país, nem desocuparem os poços de petróleo que mantém sob controle. "As mobilizações vão ser mantidas", declarou à imprensa boliviana.

Na disputa pelos lucros provenientes da exploração dos recursos naturais está o gás natural, principal produto de exportação que garante receitas para a Bolívia. A exploradora de gás Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB) avisou na semana passada que a sua produção está no limite para suprir os compromissos com o Brasil, com a Argentina e com o consumo interno. Segundo a empresa, qualquer incremento na produção depende de investimentos adicionais que só serão possíveis depois da promulgação da "Lei dos Hidrocarburos". A legislação seria, segundo os empresários, um marco regulatório "confiável" para as exploradoras de petróleo e gás.

Para Carlos Ágreda, vice-ministro de Coordenação Governamental da Bolívia (espécie de chefe da Casa Civil), "não existem condições para governar e o presidente não esta disposto a aceitar uma Lei de Hidrocarburos que inviabilize a Bolívia no plano internacional".

Núcleo de Pesquisas da Radiobrás