Moradores de Belém dizem que ocupação não acabou

15/07/2003 - 17h31

Londres, 15/7/2003 (Agência Brasil - ABr/BBC Brasil) - Duas semanas depois da retirada das tropas israelenses de Belém, sueus habitantes se queixam de que nada mudou na prática e que a ocupação continua. A cidade é a primeira da Cisjordânia onde o controle militar foi devolvido à Autoridade Palestina, conforme o acordo entre os primeiros-ministros de Israel e da Autoridade Palestina.

Desde o inicio da Intifada, em setembro de 2000, Belém sofreu cinco invasões de tropas israelenses. No mesmo período, 125 moradores foram mortos e mais de 2,5 mil ficaram feridos, vísitmas de muitos bombardeios. A última invasão ocorreu em novembro do ano passado. Desde então, tanques e jipes israelenses circulavam freqüentemente pelas ruas da cidade.

Normalidade parcial

"Depois desta suposta retirada, a única diferença que sentimos é que agora temos policiais palestinos circulando pelas ruas da cidade", disse o diretor-geral da Prefeitura de Belém, Jamal Salman, à BBC Brasil. "Depois da retirada em 2 de julho começamos a reconstruir o nosso sistema de segurança interna e os guardas de trânsito voltaram às ruas", acrescentou Salman.

Durante os longos períodos de invasão, os policiais palestinos desapareceram das ruas de Belém, porque qualquer homem uniformizado e armado corria o risco de levar um tiro das tropas israelenses.

"Estou contente em voltar ao trabalho", disse o policial Ibrahim, de 29 anos, que serve nas forças de segurança palestinas desde 1996. "Fiquei em casa, desempregado, nos últimos dois anos e meio."

Ocupação

Porém, além dos policiais que voltaram a trabalhar, é difícil encontrar algum palestino que esteja contente com a situação na cidade. "Os habitantes de Belém continuam sentindo a ocupação em seu cotidiano. Todas as vias de acesso à cidade estão bloqueadas e as tropas israelenses continuam presentes na parte norte da cidade", afirma Salman.

Para sair de Belém em direção à parte rural do distrito, os moradores da cidade têm que passar por barreiras e postos de checagem.A dona de casa Fatma Obaidala conta que há poucos dias tentou visitar o irmão, que mora na aldeia de Wadi Nis, ao sul da cidade e havia sido operado. No caminho, havia um posto de checagem. Soldados israelenses mandaram que ela voltasse para casa e disseram que a passagem estava proibida.

Muitas estradas foram bloqueadas pelas tropas israelenses com montes de areia, obstruindo a passagem de veículos. Nesses lugares, os moradores são obrigados a ultrapassar o obstáculo a pé e pegar outro carro do outro lado. A saída do vilarejo de Hader, ao sul da cidade, está obstruída por blocos de concreto e montes de areia.

Rola Hanania e sua mãe caminhavam perto da barreira e contaram que demoraram seis horas em um trajeto que levaria apenas 40 minutos, se as estradas tivessem sido abertas.

"Saí de casa em Belém às 6 horas da manhã, tive que pegar quatro táxis e andar um longo pedaço a pé, tudo isso com minha mãe que tem 67 anos, é idosa e tem que enfrentar este calor infernal do meio-dia", desabafou Rola. As duas voltavam de uma viagem de 17 km ao escritório da Administração Civil do Exército Israelense, que fica perto do assentamento de Gush Etzion.

Elas queriam uma permissão para que a mãe entrasse em território israelense para chegar ao aeroporto Ben Gurion, perto de Tel Aviv, e embarcar no mesmo dia para os Estados Unidos, em visita a outro filho.

O oficial que as recebeu informou que a permissão só ficaria pronta em dois dias.
"Perdemos seis horas do nosso tempo, teremos que voltar em dois dias e perder mais seis horas. Perdemos também a passagem da minha mãe que estava marcada para hoje. Que paz é esta? Onde está a paz, se não temos liberdade para nos mexer?", questionava Rola.

Hader

Entre as barreiras e os blocos de concreto em Hader, centenas de palestinos andavam a pé, muitos deles carregando sacolas e pacotes.

O adolescente Samir Ali Sabeh, assim como vários outros no local, trabalha como carregador.
"Aqui o Exército (israelense) não deixa nenhum carro palestino passar. Então, as pessoas são obrigadas a andar a pé", explicou Samir. "Meu tio me comprou este carrinho e eu cobro 5 shekels (cerca de um dólar) para ajudar as pessoas a carregar seus pacotes até a estrada".

Segundo a maior ONG israelense de defesa de direitos humanos, Betzelem, na Cisjordânia existem centenas de barreiras e postos de checagem obstruindo a livre passagem de palestinos.
De acordo com as autoridades israelenses, o objetivo dessas barreiras é impedir atentados contra alvos israelenses, já que desde o início da Intifada dezenas de israelenses foram mortos em estradas da Cisjordânia, por atiradores palestinos.

Jamal Salman acha que as pesadas restrições à liberdade dos palestinos não favorecem a segurança dos israelenses. "Essas restrições provocam uma intensa frustração. E a frustração é a semente da violência", disse.