Lula critica a ausência de Bush na Conferência de Governança Progressista

13/07/2003 - 16h49

Londres, 13/7/2003 (Agência Brasil - ABr) - O presidente Luís Inácio Lula da Silva criticou hoje a ausência do presidente George Bush na reunião da Conferência da Governança Progressista, em Londres. "Eu acho que nós precisamos nos habituar a envolver os Estados Unidos nos debates. É verdade que eles são duros na negociação, mas nós também devemos ser. Eles pensam primeiro neles, segundo neles, terceiro neles", afirmou. Lula mencionou a falta de confiança e colaboração entre as nações mundiais como fator que abre possibilidades ações terroristas e para as guerras. "O mundo seria mais fácil se muitos políticos não pensassem só no seu país, na sua eleição, no seu partido e nos seus problemas. Quero contribuir para um novo padrão de política, baseado na relação de confiança. Quando isso acontecer, não precisará mais haver guerras, tráfico e terrorismo", disse o presidente brasileiro.

O presidente da Polônia, Aleksander Kwasnurwski, mostrou-se ofendido com as declarações de Lula e afirmou que, assim como o Brasil defende seus interesses, ele defende os interesses da Polônia, e os Estados Unidos defendem os deles.

"Não é verdade que os Estados Unidos não pensam em outros países, sabemos que o caminho para a liberdade, a democracia e a sociedade civil só aconteceu porque os Estados Unidos trabalharam com nossas forças democráticas contra o comunismo. Eles ajudaram a gente muito mais que outros países que prefiro não mencionar. Nosso papel é trabalhar juntos, manter o diálogo, mas respeitar os Estados Unidos. Não somos egoístas, temos inteligência para compreender nosso papel para trabalhar em conjunto", disse Aleksander.

Em contrapartida, Lula respondeu ter respeito pelos Estados Unidos. "Considero o país um Estado que pensa estrategicamente enquanto nação que defendeu seus interesses quando ajudou a derrubar o comunismo e ao fazer a guerra contra o Iraque", argumentou. Para Lula, o que o preocupa é fazer com que os países desenvolvidos passem a dar atenção aos países mais pobres. "Os Estados Unidos precisam entrar no debate mundial e os países pobres precisam deixar de ser subalternos a eles. Chamo à mesa os americanos para participarem do debate. Se tivessem participado de um debate mundial, a guerra do Iraque não teria acontecido", esclareceu o presidente Lula.

O presidente da África do Sul, Thabo Mbeki, concordou que os países em desenvolvimento são pequenos demais para atuarem sozinhos no atual cenário econômico. "É importante os Estados Unidos cooperarem com o desenvolvimento mundial. O desafio é responder à pergunta sobre como fazer isso", declarou Mbeki.

DEFESA DE BLAIR

O primeiro ministro britânico, Tony Blair, descontraiu a conversa afirmando que a uma das características de um membro da Aliança Progressista é ser atacado pela esquerda e pela direita. "O senhor é um membro nato", disse referindo-se ao presidente Lula. Em seguida, tentou explicar o ataque ao Iraque. "Ninguém tinha a menor dúvida sobre a ameaça colocada por Sadam Hussein. Mas, quando virmos os iraquianos dando os primeiros passos para a construção de um governo, uma coisa teremos certeza: o Iraque será um melhor lugar para se viver com Sadam fora do poder", declarou o primeiro ministro britânico.

Blair ressaltou que a Aliança não deve seguir o antiamericanismo, mas deseja uma parceria genuína entre os países e os Estados Unidos. "Uma agenda progressista é muito melhor que o individualismo dos Estados Unidos, para evitar que se crie um bloco contra eles. Vamos trabalhar em conjunto para resolver questões de ameaça terrorista, ambientais e de paz para o Estado de Israel e a região da Palestina", destacou Blair.

ÁFRICA E AMÉRICA LATINA

O presidente Lula afirmou, durante a reunião da Conferência da Governança Progressista, que o desafio de seu governo é a reconstrução de uma unidade entre os países da América do Sul e a tentativa de construção de uma relação com a África. Na visão de Lula, este é o século em que as grandes nações devem voltar os olhos para os países em desenvolvimento. "Há 42 milhões de pessoas com fome no Brasil, temos que dar aos jovens novo direito de sonhar e de ter perspectiva no futuro. Quem pode ajudar são os países em desenvolvimento", afirmou Lula.

Ele defendeu que a política deve ser fator de aproximação dos presidentes da América do Sul. "Aprendi na vida sindical que, se os trabalhadores não se organizarem, não ganham uma luta contra os empresários. Hoje o discurso de integração é apenas de palavras. O Brasil faz fronteira com nove países da América do Sul, mas não existem pontes, estradas ou ferrovias entre muitos desses países", destacou o presidente brasileiro.

Lula criticou o fato do Brasil e de outros países em desenvolvimento privilegiarem negociações com a Europa e os Estados Unidos, devido à subordinação política das empresas multinacionais. "O Brasil tem compromissos éticos e morais com a África, mas apesar disso, os interesses estão sempre voltados para a Europa. Foi assim que aprendemos, ao longo de anos. Um exemplo: o Brasil não tem vôo direto para a África do Sul. Quando alguém da Angola tem que ir ao Brasil fazer um negócio, precisa passar primeiro por Paris, mas se vai à Paris, não vem ao Brasil", ironizou Lula.

Participaram da reunião da Conferência da Governança Progressista, o presidente Luís Inácio Lula da Silva; o presidente da Polônia, Aleksander Kwasnurwski; o presidente da África do Sul, Thabo Mbeki; o primeiro ministro britânico, Tony Blair; a primeira ministra da Nova Zelândia, Helen Clark; o primeiro ministro da Suécia, Goran Person; o presidente da República Tcheca, Vladimir Spidla; o presidente da Hungria, Peter Medgyessy; o primeiro ministro da Romênia, Adrian Nastase; e Peter Mandelson, diretor-presidente da Policy Network, instituição responsável pela organização do evento.

Nádia Faggiani