Nielmar de Oliveira
Repórter da Agência Brasil
Rio – Sem um plano de utilização do petróleo, integrado a planos para outras fontes de energia, o país corre o risco de perder os benefícios possíveis da auto-suficiência. A preocupação é Luiz Pinguelli Rosa, ex-presidente da Eletrobras, e que atualmente coordenada o Programa de Planejamento Energético da Coordenação dos Programas de Pós Graduação de Engenharia (Coppe), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Para o físico, o Brasil não deve exportar o seu excedente de petróleo, como já prevê a Petrobras. "Isto significa que em um período aí de 10 a 20 anos nós poderemos não ser mais auto-suficiente na produção de óleo, caso o consumo aumente muito, o que é uma tendência com o desenvolvimento crescente do país", alerta. A seguir, os principais trechos da entrevista:
Agência Brasil: Qual a avaliação que o senhor faz deste anúncio da auto-suficiência na produção de petróleo?
Luiz Pinguelli Rosa: A obtenção da auto-suficiência por parte da Petrobras comprova, sem dúvidas, por um lado, a eficiência da estatal: porque não foi a abertura do mercado feita no governo do Fernando Henrique que levou a isto. Foi de fato a própria Petrobras que aumentou a sua produção substancialmente. E chegou a auto-suficiência por mérito da empresa e também da decisão do atual governo de fortalecimento da companhia.
Agora, eu acho que a auto-suficiência não resolve uma questão essencial para o país: a falta de uma política estratégica para o setor petróleo no Brasil, isto não existe! Não basta a Petrobras. Até porque foi feita a abertura do mercado e as licitações de blocos são abertas a todos os proponentes. Nós temos a preocupação de que o Brasil venha, no futuro, a exportar petróleo, um produto que nós não sabemos em que proporções teremos no futuro.
ABr: O senhor pode explicar melhor esta questão de uma definição de política estratégica para o setor do petróleo. O que falta por parte do governo para definir melhor o setor?
Pinguelli: Eu acho que, com a tendência crescente de aumento de preço do petróleo no mercado internacional, nós tínhamos que definir uma estratégia de política para o setor de petróleo, e também de gás natural – até porque não há como separar um do outro. E isto não é função só da Petrobras: é uma função de governo, também não exclusiva do Ministério de Minas e Energia, envolve também a chamada Empresa de Planejamento Estratégico (EPE), as agências da área de petróleo e eletricidade.
E aí eu incluo, também, a área econômica que tem uma grande influência nas políticas de governo. Porque a grande prioridade do Brasil tem sido a questão monetária.
ABr: Está anunciada a obtenção de superávits no setor com a venda de petróleo e derivados, o que poderá acontecer pela primeira vez na história da Petrobras. O senhor tem se mostrado preocupado com isto.
Pinguelli: Eu acho que est auto-suficiência não pode ser vista como uma forma de se obter mais dólares exportando do que importando petróleo. Não pode ser mais uma fonte de recursos para pagar mais aos bancos e ao sistema financeiro internacional. Ainda mais porque o petróleo que nós eventualmente exportemos hoje a um valor determinado, poderá custar daqui a dez anos muito mais.
O que significa que em um período aí de dez a 20 anos nós poderemos chegar sem esta auto-suficiência. E para que isto ocorra basta que o consumo aumente muito. O que é uma tendência do desenvolvimento do país. Eu apoio à auto-suficiência do país, elogio a Petrobras. Mas não me declaro totalmente satisfeito por causa da ausência de uma política de petróleo. E esta ausência pode estar levando o país a licitar blocos exploratórios de uma forma não planejada.
ABr: Quais seriam, em sua opinião, as linhas básicas desta que o senhor chama de uma política de governo para o setor?
Pinguelli: Entendo como linha básica para esta política de governo para o setor de petróleo a necessidade de se fazer uma projeção continua e permanente do consumo, do crescimento; uma avaliação geopolítica estratégica do quadro mundial do setor: evolução do preço e disponibilidade do produto. Para, com base nisto, definir licitações de blocos que não seriam como vem sendo feita: de uma forma não coordenada com base neste parâmetro. O essencial é que não se pode ter apenas a auto-suficiência sem uma política estratégica para a expansão da produção de petróleo e gás natural e a evolução das reservas brasileiras. Visto que nós já, inclusive, temos problemas com o gás natural.
ABr: O presidente da Agência Nacional de Petróleo (ANP), Haroldo Lima, considera que o fim do monopólio da Petrobras tem boa parte da responsabilidade pela obtenção desta auto-suficiência à flexibilização.
Pinguelli: O que nós temos de concreto é o fato de que foi a Petrobras a empresa que continuou a investir mais no país. Agora, se hoje ela é mais agressiva e competitiva, é em particular no atual governo, onde ela teve mais liberdade de ação, podendo encomendar plataformas de petróleo no Brasil. No governo anterior, a empresa era mais tolhida, sempre sob a ameaça de uma possível privatização.
Mas agente não pode atribuir a melhor performance da Petrobras à abertura do mercado. Então, é por estas e outras que eu acho que a abertura não teve nada a ver com esta auto-suficiência que se está agora obtendo. Tem a ver em parte, é claro, porque ela teve um efeito psicológico sobre o setor. Mas não se pode atribuir a melhor performance da Petrobras a ela.