Jurista diz que decisão do STF sobre Raposa Serra do Sol ameaça outras reservas

24/08/2008 - 11h07

Marco Antônio Soalheiro
Repórter da Agência Brasil
Brasília - O Supremo Tribunal Federal (STF) deixará margem jurisprudencial para futuras ações que contestem a demarcação de outras reservas no país se determinar, em julgamento na próximaquarta-feira (27), mudanças na demarcação emárea contínua da Terra Indígena Raposa Serra doSol, em Roraima. A avaliação foi feitapelo professor José Geraldo Souza, diretor da Faculdade deDireito da Universidade de Brasília (UnB).“Tem que verificar as condições, se em certascircunstâncias é impossível reabrir processo. Masa decisão do STF [pela eventual alteração dademarcação] iria redeterminar o paradigma da questãoe abrir ensejo a outras ações. Por isso preocupa”,afirmou Souza, em entrevistaconcedida à Rádio Nacional da Amazônia e àAgência Brasil.O STF vai julgar ações que contestam a demarcação na próxima quarta-feira (27).O objetivo dos requisitantes é garantir a permanência degrandes produtores de arroz e agricultores brancos na reserva. Entretanto, segundo o jurista da UnB, não há na ConstituiçãoFederal base para uma decisão com viés conciliatório,no sentido de permitir a convivência de índios enão-índios na área de 1,7 milhão dehectares homologada pelo governo.“Solução conciliatória a partir daConstituição, eu não enxergo. Há naconcepção do direito um entendimento de que certosvalores são irrenunciáveis, inegociáveis, nalinha de recuar daquilo que é o seu princípio fundante.A questão indígena não pode ser vista dentro dasregras correntes da vida cotidiana dos não-índios, comose fosse um contrato, um negócio, um acordo”, ressaltouSouza.“Não há como negar a visão de que os índiosformam uma outra cultura com o horizonte jurídico das suastradições. Se eles deixam de ter essa dimensão,deixam de ser índios e isso beira um genocídiocultural”, acrescentou.Na opinião do jurista, a demarcação da TerraIndígena Raposa Serra do Sol em área contínua écompatível com os marcos constitucionais internos e as normasinternacionais de direitos humanos. Qualquer decisão emsentido contrário poderia ser contestada.“Não há como imaginar que o direito origináriosobre as terras tradicionais seja afetado. Esgotada a deliberaçãono plano nacional, existem mecanismos para o ingresso na CorteInteramericana de Direitos Humanos, que leva em conta que o princípioda tradição e os direitos imemoriais das comunidadesindígenas sejam respeitados”, argumentou.