Bruno Bocchini
Repórter da Agência Brasil
São Paulo - A falta de êxito na Rodada Doha não deve colocar em risco as conquistas comerciais obtidas pelo Brasil nas últimas edições do encontro. De acordo com o ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos e ex-ministro da Fazenda Rubens Ricupero, a vitória do país em relação a suspensão de patentes de medicamentos, por exemplo, conquistada em rodadas anteriores, não deve ser colocada em xeque agora."Mesmo que você consiga em uma etapa uma concessão, aquela concessão é condicionada a que tudo termine bem. Então, teoricamente, mas isso é teórico, isso poderia levar os EUA a dizer: não aceito mais esse princípio sobre os medicamentos. Na prática não tem como, porque a razão que pressiona, que é a da Aids, continua forte como antes", afirma.Apesar de conseguir preservar algumas vitórias das rodadas anteriores, Ricupero classifica o Brasil como um dos grandes perdedores de Doha. "Nós somos grandes perdedores porque essa rodada era a rodada da agricultura, que era a bola da vez. Como nós temos muita competitividade em agricultura, era o momento para o Brasil conseguir realmente um ganho siginificativo. O fato de não ter saído o acordo abre agora uma fase de incerteza, mas não quer dizer que o mundo vai acabar", explica.Ricupero defendeu a postura do país em insistir no acordo multilateral em detrimento dos unilaterais. Para ele, a aposta era justificável dado os ganhos que poderíam ter sido obtidos. "Muita gente diz que o país agora vai fazer acordos unilaterais. Mas esses acordos são tão difíceis quanto os multilaterais. E eles têm a desvantagem de que eles te abrem apenas um ou dois mercados. Nesse [Rodada Doha], eram 153 [mercados]. Em uma só negociação, você ganha muito". Para o ex-embaixador, no entanto, mesmo com a derrota comercial e com o distanciamento de países que nos últimos tempos negociavam alinhados com o Brasil, como Argentina e Índia, o país ganhou respeito internacional por ter cedido em favor do avanço das negociações. "Era inevitável [se distanciar dos países como Índia, Argentina e China]. O Brasil precisava marcar posição. Acho que ao dizer que o acordo era aceitável nós não estávamos traindo ninguém, nós estávamos apenas mostrando qual era a situação brasileira. E penso que isso vai dar ao Brasil um certo crédito".A pior derrota após o fracasso da rodada ficou por conta da Organização Mundial do Comércio (OMC), segundo Ricupero. Para ele, a "máquina ficou muito pesada", citando que hoje as negociações correm com a participação de centenas de países. "A OMC, infelizmente, sai enfraquecida, porque sempre é um desgaste muito grande. E vou dizer com sinceridade: não há alternativa para esse sistema multilateral."O ex-ministro ressaltou que, mais do que os entraves comerciais, as negocições da última Rodada Doha permitiram a contaminação com problemas políticos. "O grande problema é que os dois países que complicaram e fizeram a coisa parar, os EUA e a Índia, vão ter eleições gerais. Na Índia, quem decidiu as últimas eleições foram os camponeses."