Elaine Patricia Cruz
Repórter da Agência Brasil
São Paulo - A investigação do Ministério Público Estadual (MPE) sobre a falsificação de Carteiras Nacionais de Habilitação (CNHs) em Ferraz de Vasconcelos (SP), durante a Operação Carta Branca, indica que policiais civis da delegacia da cidade estariam superfaturando notas fiscais referentes ao abastecimento das viaturas policiais em um posto de combustíveis.De acordo com o relatório do Ministério Público, o delegado de polícia responsável pela Circunscrição Regional de Trânsito (Ciretran) da cidade, Juarez Pereira Campos, teria conhecimento sobre o superfaturamento das notas fiscais, assinando-as e enviando-as à Delegacia Seccional de Mogi das Cruzes para o pagamento. O MPE acredita que o posto, de propriedade de Nasser Abdel Hadi Ibrahim, tenha sido utilizado para fazer a lavagem do dinheiro obtido com a venda das carteiras de habilitação falsificadas.Em uma conversa interceptada, Nasser conversa com Marcos Vinicíus Coelho (Marcão), operador do sistema do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) na Ciretran de Ferraz de Vasconcelos. Marcão é o responsável por lançar as falsas informações dos candidatos a motoristas, enviadas pelas auto-escolas, no sistema. Durante conversa por telefone, os dois falam sobre Aparecido da Silva Santos (Cido), também funcionário da Ciretran e que abasteceria os veículos de sua família no mesmo posto.Marcão: Ele tá aqui, eu abasteci o carro dele, tá?Nasser: Tá, deixa aí pra minha conta isso aí, não deixa cobrar dele não.Marcão: Você vai ligar prá ele depois?Nasser: Ele não quer falar nada pelo telefone, Marcão, o telefone dele é problemático.Segundo o relatório, o esquema começava com um candidato a motorista interessado em comprar uma carteira de habilitação sem precisar passar pelos exames médicos, práticos e teóricos. O candidato a motorista pagava à organização criminosa entre R$ 1,3 mil e R$ 1,5 mil pela carteira falsificada e uma outra pessoa, que se passava por ele, fornecia sua impressão digital para a confecção da carteira. As falsas informações eram inseridas, pelas auto-escolas, no sistema e, depois, eram encaminhadas para o Ciretran local, que lançava os dados no sistema como se fossem verdadeiros.“Essa indiscriminada venda de Carteiras Nacionais de Habilitação para o Brasil inteiro causou muito problema para a quadrilha porque, por exemplo, eles venderam carteira de motorista para um sujeito que tinha o pé torto, que atropelou um motoqueiro. E a partir de um incidente gerado por uma falha dessa, iniciava-se uma mobilização gigantesca para ir ao local, subornar quem estivesse no local para que aquilo não se tornasse um boletim de ocorrência”, explicou ontem (3), em coletiva, o promotor Marcelo Oliveira. Num trecho interceptado pelo Ministério Público, Elaine Gavazzi, proprietária e sócia das auto-escolas Radar e São Judas Tadeu, conversa com Cido sobre esse episódio do atropelamento. A conversa demonstra que a organização criminosa tentou subornar o policial para que o acidente ocorrido na Rodovia Índio Tibiriçá não virasse um boletim de ocorrência. Cido: Ó, faz favor pra mim, urgente, entra em contato lá com a...o...o.. Nino vai entrar em contato comigo para passar o telefone do rodoviário lá... da Índio Tibiriça lá. Teve um acidente grave lá envolvendo um veinho lá e o veinho... a carta é daqui de Ferraz e é da Xangai. Quem trabalha com a Xangai é você, não é?(...)Elaine: Ele tem o pé torto.Cido: Não entendi.Elaine: Ele tem um pé torto.(...)Elaine: Zerou, tá?Cido: Zerou?Elaine: É, 5 mil. Na verdade os caras fizeram uma pressão. Cido: Oi?Elaine: Na verdade os caras fizeram uma pressão, entendeu (...) mas deixa quieto, ele ajudou, tá tudo certo, 5 mil. Eu vou pagar pra ele, tá tudo certo, zerou, tá bom, não vai ter BO (boletim de ocorrência), não vai ter nada.Num outro trecho, ambos falam sobre um problema ocorrido com a carteira de motorista falsificada de Joal da Silva, que foi apreendida por policiais em Franca (SP). Joal da Silva, apesar de ser analfabeto, tinha sua carteira de motorista assinada corretamente, mas com o nome de João da Silva.Elaine: Que que deu a bucha?Cido: Ele é analfabeto, ele mesmo se declarou, praticamente.(...)Elaine: Ele já tinha me avisado disso, só que ele falou assim que só vinha a carta presa, que ele já tinha acertado com o delegado lá em Joaquim.Cido: Nada, foi instaurado inquérito.Elaine: Ah, então ele vai se virar com isso. Ele vai mover o deputado dele lá, vai se virar, senão eu engulo ele.(...)Cido: Viu, além disso sabe o que aconteceu? O nome do cara é Joal e quem assinou...Elaine: Tava errado, né?Cido: E quem assinou a planilha assinou João.Na operação deflagrada ontem, 19 pessoas foram presas, entre elas, o delegado Juarez Campos, Elaine Gavazzi, Marcus Vinicius Coelho e Aparecido da Silva Santos. Os envolvidos poderão responder por corrupção, falsidade ideológica de documento público e formação de quadrilha.