Paulo Machado
Ouvidor da Radiobrás
Brasília - O leitor LuisOtávio escreveu para a Ouvidoria questionando a imparcialidade e a isençãoda cobertura queos veículos da Radiobrás fizeram sobre o plebiscito popularrealizado entre os dias 1 e 7 de setembro por movimentose organizações da sociedadecivil. O motivofoi a revisão da privatização daCompania Vale do Rio Doce (CVRD).A AgênciaBrasil vem cobrindo a campanha “A Vale é Nossa” desde 2006, porocasião do “Gritodos Excluídos”, realizado paralelamente àscomemorações oficiais do 7 de Setembro. Na ocasiãodestacou as manifestações organizadas por entidadesrepresentativas da sociedade civilcomo a CentralÚnica dos Trabalhadores(CUT), o Movimento dos Trabalhadores RuraisSem Terra(MST), o Movimento dos Atingidos por Barragens(MAB) e a Conferência Nacional dos Bisposdo Brasil (CNBB), entre outras.Na coberturadeste ano o pontoalto foi a consulta popularque levou o nomede “Plebiscito da Vale”.Foram publicadas 28 matérias desde 7 de setembrode 2006, quando foi lançada a idéiada campanha, atéo dia 8 de setembro.As matériasnão deixam clara a diferençaentre o plebiscitooficial, previstono Capítulo IV, artigo14, da Constituição Federal,e o realizado por iniciativada sociedade civil.No entanto, o fatode não ser um evento oficial, convocado pelospoderes estabelecidos do Estado brasileiro, não torna a cobertura sobreo assunto menosimportante, uma vezque se tratade um movimentode massa organizado porentidades representativas da sociedade civil. Segundo seus organizadores, o plebiscitotem, entre outras funções,a de conscientizar a populaçãoe pressionar o governo.A Ouvidoria entende quea Agência Brasil ao trazero assunto paradebate em suas páginas eletrônicas está cumprindo comsua missão,que é: “Noticiarfatos, eventose processos ocorridos no espaço público político (governo,Estado e cidadania),com foconos interessesdo cidadão, consolidando-se como um jornal online públicode alta credibilidade”.E com seusobjetivos, entreeles: “Acompanharos processos e os grandesdebates da cidadanianacional, promovendo-os e estimulando-osem nossacobertura”.Leia aqui a íntegrado Plano Editorial da Agência Brasil.Justificada a validade de cobrir o assunto e o porquêda presença dessa pauta,a Ouvidoria analisou a maneira como a Agência fez a cobertura.Na recuperação do processohistórico emque se procedeu a referida estatizaçãoda companhia faltou relembraros fatos e o contextoem quese deu a operação de privatização e que estão sendo questionados judicialmenteem 107 ações,conforme é citado na matéria Dez anos depois, 107 ações judiciais questionamprivatização da Vale do Rio Doce, publicada em 2 de setembro de 2007.A responsabilidade do Estadono episódio é lembrada pelo economista e professor do Departamento de Economiada Universidade de Brasília (UnB) Vander Mendes, ouvido pela reportagem namatéria Economista defende investigação sobre fraudes naprivatização da Vale, sem reestatização, publicada em 18 de agosto.Em resposta à Ouvidoria, oseditores da Agência Brasilinformaram que fizeram várias tentativas para ouvir o ex-presidente FernandoHenrique Cardoso e o então presidente do Banco Nacional de DesenvolvimentoEconômico e Social (BNDES), Luiz Carlos Mendonça de Barros. Ambos não responderamàs tentativas. A Agência errou ao não informar isso nas matérias.Para os leitoresentenderem os objetivos do plebiscito foram ouvidas 31 fontesda sociedade civil,entre elasjuristas, economistase advogados queapontaram aspectos positivose negativos da privatização e seposicionaram a favor oucontra o plebiscitopopular. Comoexemplo dos aspectosnegativos, está o preçoque a CVRD pagapor umde seus principaisinsumos – a energiaelétrica. Na matériaSubsídio indireto em energia garante competitividade daVale, diz campanha, publicadaem 5 de setembro, não fica claro como funciona esse subsídio, apesar de apontarque se trata de um custo de produção privado, pago a menor pela companhia ebancado por toda a sociedade brasileira.Outra questão que aparece em forma de denúncia pelos organizadoresdo plebiscito e quenão foi devidamenteesclarecida na matériaVenda a preço menor que o patrimônio justifica anularprivatização, para advogado, publicada em 2 de setembro, é a exposta peloex-funcionário da CVRD, o advogado Eloá Cruz. Segundo ele, a lei que criou aVale do Rio Doce determina que a companhia distribua 15% dos dividendos aosacionistas e empregue 10% para formar um Fundo de Desenvolvimento Regional nos13 estados em que atua. Para o advogado, a companhia não estaria repassando odinheiro a esse fundo, e o Tribunal de Contas da União (TCU) teria calculadoque a empresa deve a ele R$ 26,7 bilhões. Essa informação merecia uma apuraçãomais aprofundada por parte da Agência.Segundo o leitor, em nome do direito à informação, a Agência Brasil deveriaescrever sobre os prejuízos que a campanha “A Vale é Nossa” pode acarretar aopaís, pois na opinião dele a comunidade internacional vai pensar que o Brasilnão é um país sério e isso vai comprometer os investimentos de estrangeiros.Ao que parece,o leitor nãosabe que os investidoresestrangeiros têm conhecimentodas ações quea CVRD responde na Justiça, pois ela é obrigada divulgar essa informação no relatórioanual queapresenta à Bolsa de Valores de NovaYork, onde suasações sãonegociadas. Ao trazer o assuntoàs suas páginas,a Agência Brasil está dando a oportunidade, talveztardia, de queo público brasileirotambém conheça o assunto.A cobertura daAgência,dá a posição do Partidodos Trabalhadores (PT), apoiando a realização do plebiscito,e do Partido da CausaOperária (PCO), contrárioà consulta, mas nãoinforma qual é a posiçãodos demais partidospolíticos. Será porqueeles nãotêm uma posição sobreo assunto ouporque nãoforam procurados pela reportagem?Quanto à posição do governo, nas matériasda Agênciaela se restringe ao pronunciamentodo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pois os atuais administradoresdo BNDES e do Ministério das Minas e Energianão quiseram se pronunciar.Tampouco a direçãoda CVRD quis falar sobrea privatização embora ela também tenhasido procurada pela reportagem.Assim, apesar do silêncio voluntáriode fontes importantesque poderiam esclareceros fatos parao cidadão, o assuntoganhou espaço de destaquenas páginas da Agência Brasil, quepreservou o direito à informação tratando comseriedade a questão.Contrariando o leitor Luis Otávio, que afirma: “quemdiria, houve um tempoque a Radiobrás era séria”.Até a próxima semana.