Responsável pela inspeção da pista de Congonhas afirma que nunca recebeu treinamento

29/08/2007 - 20h20

Alex Rodrigues
Repórter da Agência Brasil
Brasília - O funcionário da Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (Infraero) Agnaldo Molina Esteves, responsável por inspecionar as condições das pistas do Aeroporto de Congonhas em dias de chuva, jamais recebeu um curso de formação ou de capacitação para exercer a função. Em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Apagão Aéreo da Câmara dos Deputados, hoje (29), o servidor afirmou que os procedimentos necessários à tarefa de verificar quando lâminas ou poças de água possam representar uma ameaça ao tráfego aéreo foram aprendidos na prática, com companheiros de trabalho mais antigos.

“Isso a gente vai pegando ao longo do tempo. Vai passando o tempo e a gente vai aprendendo o serviço. O pessoal mais velho vai ensinando”, revelou Molina.

Foi Molina quem inspecionou a pista principal de Congonhas cerca de uma hora e meia antes do acidente com o Airbus A320 da TAM, no dia 17 de julho. Na ocasião, ele relatou à torre de controle que a pista estava molhada, mas que não havia lâmina d´água superior a três milímetros. Com base nesta informação, os controladores mantiveram a pista aberta para pousos e decolagens. Até que ocorresse a tragédia em que morreram 199 pessoas, 40 aeronaves pousaram no local.

Segundo resolução da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), quando a pista estiver "contaminada" por lâmina d´água superior a três milímetros, deve ser interditada por oferecer risco de aquaplanagem.

No dia do acidente, Molina fiscalizou a pista acompanhado pelo coordenador de Prevenção e Emergência da Infraero, Esdras Barros, que havia pegado uma carona com o técnico momentos antes dele receber o chamado de serviço pelo rádio. Barros também foi ouvido pela CPI hoje e afirmou que não compete à Infraero interditar a pista.

Segundo Molina, os 1.940 metros da pista principal foram percorridos de carro e a inspeção durou cerca de 20 minutos. A verificação se havia ou não lâminas d´água foi feita visualmente, de dentro do veículo. Mesmo sendo a quarta vez que Molina executava esse serviço desde que foi admitido na empresa, há quatro anos, por meio de concurso público, ele disse não ter dificuldades para identificar, ainda que do interior do carro, uma camada de água da espessura de uma moeda. Ele foi chamado para fazer o serviço pelo seu coordenador, pois os funcionários mais antigos estariam de férias.

Barros defendeu que somente constatada a formação de lâminas ou poças d´água o técnico necessita executar a medição, tarefa realizada, segundo ele, com uma régua de metal.

Para a deputada Luciana Genro (PSOL-RS), o procedimento empregado pelas autoridades do setor aéreo é falho e pode ter contribuído para o acidente com o avião da TAM. “O que dá para notar a partir dos depoimentos é que a Infraero trata com desleixo a verificação das condições da pista quando está chovendo. A estatal não exige sequer que os funcionários percorram a pista a pé. É muito difícil que, a olho nu, se possa ter certeza de que não há lâmina d´água ou poças”.

Já o relator da CPI, deputado Marco Maia (PT-RS), minimizou a revelação de que a Infraero não capacitou adequadamente Molina. Para ele, a forma como os funcionários da estatal verificam o estado da pista molhada é feito em conformidade com normas estipuladas pela Organização de Aviação Civil Internacional.

“É um procedimento internacional e uma forma de utilizar os equipamentos hoje disponíveis para averiguar esse tipo de situação”, afirmou.

Maia disse que, apesar da CPI continuar investigando a possível contribuição da pista para o acidente, a hipótese perde força a cada dia. “A cada momento da investigação a pista vai se afastando como sendo um fator determinante para a ocorrência do acidente. Ela apenas continua como sendo um fator contribuinte. Todas as informações que nos chegam dão conta de que não existia lâmina d´água no momento do acidente. Não há nenhuma informação contrária que tenha chegado à CPI”, disse o relator.

Procurada, a Infraero disse que não iria se manifestar sobre o assunto