Ocultar cadáveres de vítimas da ditadura é crime a ser julgado, afirma jurista

29/08/2007 - 20h39

Ana Luiza Zenker
Da Agência Brasil
Brasília - Para o jurista Fábio Konder Comparato, as pessoas que sabem onde estão os corpos de desaparecidos políticos da época do regime militar continuam praticando o que se chama de “crime continuado”, apesar da Lei de Anistia aprovada em 1979. “Pode-se e deve-se, é um dever moral iniciar uma ação penal contra os culpados por essa ocultação de cadáver”, afirmou em entrevista à Agência Brasil.A discussão sobre o crime continuado de ocultação de cadáver surgiu por causa do livro lançado hoje (29) pela Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH) da Presidência da República, “Direito à Memória e à Verdade. No livro, se levanta a possibilidade de que, mesmo que a Lei de Anistia tenha absolvido também os crimes cometidos pelos executores do regime militar, eles continuaram cometendo um crime por não revelar onde estão os corpos das vítimas.“O chamado crime continuado não seria abrangido pela prescrição, porque, enquanto não for revelada a situação do crime, o criminoso permanece como tendo continuado a ação criminosa, e é o caso da ocultação do cadáver”, diz o jurista.Comparato também acredita que a Lei de Anistia não poderia se estender aos crimes cometidos pelos agentes públicos.  “Quando a lei de Anistia empregou a expressão 'crime conexo', ela não podia abranger com essa expressão os crimes cometidos pelos agentes públicos do regime militar, que assassinaram, estupraram, torturaram opositores políticos”, afirma.Dessa forma, o fato de não ter havido nenhuma punição para os culpados de tortura, por exemplo, é resultado de uma omissão do Ministério Público. "Devido a essa omissão, ocorreu a prescrição, ou seja, a impossibilidade de se iniciarem ações penais”, explica Comparato.Outro ponto levantado pelo jurista é a abertura dos arquivos do regime militar. “O governo federal, também numa atitude lamentável, não pesquisou esses documentos públicos e até, segundo parece, esses documentos teriam sido destruídos”, o que, segundo Fábio Comparato, deveria ser objeto de investigação do Ministério Público, pois destruir documentos públicos é crime.Apesar de todas essas ressalvas que o jurista faz à atuação do governo em relação aos crimes cometidos durante o regime militar, Comparato acredita que a iniciativa de lançar esse livro é “um marco histórico”. “É a primeira vez que oficialmente se reconhecem os crimes do regime militar”. “Eu acho que em boa medida ele resgatou esse pecado grave, essa omissão culposa dos sucessivos governos depois de extinto o regime militar”, conclui.