Natália Calisti
Enviada especial da Agência Telam
Pisco (Peru) - Centenas de famílias da cidade de Pisco dormem sobre os escombros de suas casas para proteger dos saques o que resta de seus bens. Muitas delas mandam crianças, mulheres e idosos aguardarem em acampamentos improvisados em parques e praças a chegada de ajuda humanitária após o terremoto da quarta-feira (15).A tarefa de remover os escombros e resgatar os corpos apenas começou na cidade, onde 90% das construções foram destruídas com o tremor. Os bombeiros trabalham intensamente na Plaza de Armas, onde se concentra as maioria dos hotéis e o centro comercial. Nas residências dos arredores ainda se estima haver corpos soterrados.A distribuição da ajuda humanitária - que chega aos aeroportos de Pisco e Lima - é caótica. Muitos dos habitantes de Pisco optaram por improvisar seus próprios acampamentos em parques, praças e na periferia da cidade, onde se multiplicam os grupos de pessoas que levantam tendas com paus e lençóis e organizam refeições comunitárias com as doações recebidas.No estádio do Clube Atlético de Pisco, permanecem cerca de 300 pessoas que fugiram da costa, onde o mar avançou mais de 200 metros terra adentro. As autoridades chegaram a emitir um alerta de tsunami, depois cancelado. No estádio convivem as primeiras famílias que se instalaram depois da catástrofe, às quais se somaram as que foram chegando nas últimas horas. É uma paisagem em que o desespero pela escassez de água e comida e as dificuldades na distribuição oficial de ajuda geram conflitos.No sábado (18), um grupo de mulheres reclamava na porta do acampamento que os pacotes de alimentos só chegavam a alguns setores e deixavam de fora parte da população, como as famílias que pernoitavam sobre os escombros. "A ajuda chega por setores: aos que estão 'no fundo' dão alimentos todos os dias e a nós, nada. Não é justo", afirmou Evelin Herencia Ramírez, uma das manifestantes.O clima se tornou tenso no estádio. As mulheres se transferiram para "o fundo", onde estão alojadas várias famílias, e exigiram comida. Saúl Ascasiete Reis, superviros do abrigo, explicou que as rações tem que durar 15 dias e são para as famílias que estão ali "desde a primeira hora", com os nomes anotados em uma lista.Os homens do exército peruano e da polícia nacional, distribuídos em toda a cidade, inclusive nos acampamentos, olhavam de longe a cena. A poucos metros, um grupo de militares norte-americanos instalava uma barraca sanitária, e uma mulher perguntava, desesperada, onde poderia passar a noite.A fome começa a desbancar todos os problemas e, nos últimos dias, é a preocupação principal dos que sobreviveram ao tremor.WilliamNeira é pescador, tem três filhos e é um dos que estão "no fundo desde a primeira hora". A casa dele ficou destruída, mas ele pernoita sobre os escombros porque diz que ainda é possível resgatar algumas coisas. Enquanto isso, deixa a mulher e os filhos no alojamento. "Ainda há mortos que não foram resgatados e, como passaram vários dias, o cheiro é muito forte e faz mal para os meninos", explica.Neira vive em uma barraca que ele próprio armou com paus e lençóis. Apesar dos envios internacionais de ajuda humanitária que estão sendo anunciados nos meios de comunicação, são muito poucas as barracas nos alojamentos.Depois das 5 horas da tarde, quando o sol baixa, os trabalhos das equipes de resgate se intensificam. Homens da Defesa Civil, militares, bombeiros e a polícia nacional revisam o que resta das construções e instalações elétricas, antes de autorizar a entrada das máquinas que levantam os escombros mais pesados.Ao mesmo tempo em que trabalham, as pessoas resgatam o que podem: um brinquedo, uma geladeira que já não funciona, o pedaço de um móvel, um colchão são carregados em carros puxados à mão ou enganchados a uma bicicleta. Tudo é levado aonde quer que se vá passar a noite.As cifras oficiais não estão sendo atualizadas. Segundo o último informe das Nações Unidas que circula, ao menos desde sexta-feira (17), as famílias afetadas são cerca de 17 mil.