Marcela Rebelo
Repórter da Agência Brasil
Brasília - “Temos que entender que o racismo existe e que a populaçãonegra sofre diversos casos de exclusão por sua raça. Temos que exercer a nossacidadania e sermos considerados de fato cidadãos.”A declaração é de Sônia Nascimento, diretora da organização não-governamentalGeledés – Instituto da Mulher Negra. Ela defende que o novo governo e oslegisladores eleitos este ano intensifiquem o reconhecimento da prática deracismo contra os negros como um fator, inclusive, impossibilitador doexercício da cidadania.“É no mercado de trabalho, na saúde, na mídia, na educação. É a questão de serbem recebido nos lugares, a questão da auto-estima”, diz.De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2004,48% da população é negra (42,1% de pardos e 5,9% de pretos).A diretora destaca que quase metade da população enfrenta situações dedesigualdade e, por isso, o governo deve elaborar políticas afirmativas e, não,universalistas. “Queremos estar nos meios de poder, nos ver representados noCongresso. Precisamos ter chances iguais, o que nos foi negado até hoje.”Com relação ao mercado de trabalho, Sônia diz que o governo deveria darincentivo a empresas que contratam negros em iguais condições que os brancos.“Elas poderiam ter prioridade no caso de concorrência pública, por exemplo”. Adiretora lembra que a diferença entre salários entre brancos e negros é alta.“No caso da mulher negra para homem branco, a diferença é de cerca de 30%.”Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) comprovam que asmulheres negras são as que encontram maiores dificuldades de inserção nomercado de trabalho. Em 2004, 13,3% das mulheres negras estavam desempregadas,enquanto entre os homens brancos, esse índice era de 6,1%. Além disso, enquanto35% dos brancos estavam em ocupações com carteira assinada, entre os negros opercentual cai para 27%.Na questão da saúde, Sônia afirma que algumas doenças são mais comuns entrepessoas negras e, por isso, o governo deveria desenvolver ações preventivas.“Há estudos que mostram que os negros têm uma grande possibilidade de seremhipertensos. Alguns oftalmologistas sabem que a pessoa negra tem grandepossibilidade de ter glaucoma”, conta.“Sabendo disso, é preciso uma atenção voltada para essa questão dos negros, queisso seja discutido nas universidades e que todos os médicos tomem conhecimentopara fazer a prevenção dessas doenças.”De acordo com o Ipea, 63% dos atendimentos de saúde no Brasil, em 2003, foicoberto pelo Sistema Ùnico de Saúde (SUS). Desse índice, 54% foi atendimentoentre os brancos e de 76% entre os negros. Com relação a planos privados desaúde, eles alcançam 33,2% da população branca e somente 14,7% dos negros.Osdados com relação à saúde mostram ainda que, entre as mulheres negras, 44,5%jamais haviam realizado o exame clínico de mamas contra 27% entre as brancas.A diretora do Geledés defende também as cotas para negros nas universidades.“No passado, tivemos leis que nos proibiram de ter educação. Ora, se a negaçãofoi institucional, temos que institucionalizar agora a educação para os negros,com as cotas.”Sônia diz que as cotas nas universidades são apenas um dositem das ações afirmativas. “Queremos nos meios de comunicação, no mercado detrabalho, nas funções públicas”.Para ela, quem é contrário às cotas quer manter a divisão de poderes. “Vamostomar as vagas que muita gente entende que pertence a uma determinada classe.São racistas que entendem que a turma do andar de baixo não deve ainda teracesso ao andar de cima.”