Rapper defende cotas e afirma que moradores da periferia são aliados na reconstrução do país

12/11/2005 - 13h54

Thais Leitão
Repórter da Agência Brasil

Brasília - "As cotas foram a invenção mais genial dos últimos tempos", defende o rapper carioca MV Bill nesta terceira parte da entrevista concedida à Agência Brasil. Ele afirma ainda que os jovens que fazem hip hop no Brasil mandam mensagens de paz na condição de correspondentes de guerra.

Abr - O que você acha que ainda falta em nosso país em termos de políticas públicas que de fato contemplem os jovens das periferias?

MV Bill - Faltam ações concretas, que de fato garantam aos pretos e pobres condições melhores de vida. Não são soluções paliativas ou assistencialistas. Se o Brasil não atentar para essa questão, vai acabar acontecendo aqui o que a França vive hoje, com jovens incendiando as ruas para chamar a atenção. Sei que o nosso país tem dimensões continentais e não dá para oferecer as mesmas condições para todo mundo. Mas o preço disso é alto, e com tantas desigualdades, caminhamos para uma convulsão social.

Abr - As políticas de cotas em universidades, por exemplo representam essas medidas paliativas a que você se refere?

MV Bill - Não, eu acredito que as cotas são uma tentativa de se reverter um contraste histórico, que não se resolve da noite para o dia. Elas não precisam ser eternas. É bom que sejam extintas daqui a um tempo, mas servem para melhorar a educação de uma população que não tem acesso a nada. Eu gostaria que elas não fossem necessárias, mas como eu não tenho outra solução para apresentar, acho que as cotas foram a invenção mais genial dos últimos tempos.

Abr - De que forma o hip hop preenche lacunas que o Estado não ocupa?

MV Bill - Através do nosso discurso e da nossa forma de olhar para as questões da sociedade. Quem faz hip hop são os jovens que vêm de dentro dos problemas e têm que mandar uma mensagem de paz, mas na condição de correspondentes de guerra. Por isso, nossa visão é diferente da dos políticos. Nós conseguimos fazer o que muitos deles não conseguem, que é reunir uma platéia numa comunidade para falar de política social, cultural e racial sem ser chato. Os políticos, em geral, precisam contratar uma banda de pagode e entrar no meio do show para falar com o povo. Muitas vezes, dizendo coisas que ninguém entende. A gente usa a nossa própria linguagem para tratar de todas essas questões e enxergamos o morador das periferias como aliados na reconstrução do nosso país.