Érica Santana
Repórter da Agência Brasil
Brasília – A valorização da moeda brasileira diante do dólar está provocando uma desaceleração das vendas para o exterior; com isso, também cresce menos a atividade do industrial do país, que é muito dependente das exportações. O economista Claudio Dedecca faz essa avaliação com base nos dados de duas pesquisas, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgada hoje (9) e da Confederação Nacional da Indústria (CNI), divulgada ontem (8).
De acordo com dados do boletim Indicadores Industriais da CNI, o mês de setembro registrou a a terceira queda consecutiva nas vendas reais: 0,47% em comparação a agosto. Em relação ao mesmo período do ano passado, a queda foi de 1,07%.
"A única probabilidade da indústria manter o ritmo de crescimento nos próximos meses e para 2006 será através de uma recuperação do mercado interno", avalia Dedecca, professor do Departamento de Economia do Trabalho da Universidade de Campinas (Unicamp).
Para que isso ocorra, Dedecca considera essenciais ações de governo, como a redução significativa da taxa do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic) – usada como referência para os juros cobrados pelos bancos no país. Outra medida defendida pelo economista é a ampliação do crédito e recuperação do nível de renda da população. Sem isso, "dificilmente a indústria terá um crescimento de médio e longo prazo a taxas razoáveis", diz ele.
Agência Brasil: O boletim de Indicadores Industriais da Confederação Nacional das Indústrias (CNI) aponta para a desaceleração da atividade do setor industrial no terceiro trimestre. A que se deve essa queda?
Cláudio Dedecca: O que nós podemos avaliar é que a economia brasileira está fortemente dependente das exportações. O mercado interno vem tendo uma recuperação muito lenta e pouco dinâmica.
De modo que se há uma desaceleração das exportações, o efeito negativo é imediato sobre o índice das atividades internas. Cada vez fica mais visível que é enorme a probabilidade da valorização cambial afetar a atividade industrial interna. Esse é o principal motivo da desaceleração da atividade do setor industrial.
ABr: Os dados da CNI também revelam que pela primeira vez em mais de dois anos, a industria demitiu mais do que empregou. Isso também se deve à desaceleração nas exportações e à valorização cambial?
Dedecca: Sim, a indústria está sendo dinamizada pelo mercado externo. Um mercado externo que cresceu bastante e que tende a ter essa taxa de crescimento desacelerada, com um câmbio que lhe é desfavorável.
A única probabilidade da indústria manter o ritmo de crescimento nos próximos meses e para 2006 será através de uma recuperação do mercado interno. Acontece que não há sinais de que isso venha a ocorrer em um ritmo suficiente que compense o ritmo das exportações.
Os dados da CNI são decorrentes dos limites do processo de expansão da indústria. Uma expansão que depende do mercado externo e que obviamente começa a encontrar restrições crescentes, em especial pela valorização cambial.
ABr: Apesar das condições pouco favoráveis à atividade industrial, a massa real de salários continuou se expandindo em setembro, como já vem acontecendo há sete meses. O recuo da inflação é o responsável por esse resultado?
Dedecca: Duas razões podem ser apontadas. A primeira delas foi a queda dos preços em um período mais recente, que obviamente favoreceu a evolução do salário real. Portanto, há efeitos positivos sobre a massa de salários.
Outro elemento diz respeito às negociações coletivas que, neste ano, tem mostrado resultados razoáveis em termos de recuperação da inflação passada e até de ganhos reais no setor industrial.
ABr: O que pode ser feito para que o país retome o crescimento industrial observado nos dois primeiros trimestres do ano?
Dedecca: É importante ressaltar o fato de que é muito difícil um país como o Brasil ter um bom desempenho industrial em médio e longo prazo sem a recuperação do mercado interno. Isso é, se nós não tivermos uma redução da taxa de juros significativa, uma ampliação do crédito, uma recuperação do nível de renda da população, dificilmente a industria terá um crescimento de médio e longo prazo a taxas razoáveis.
Em um primeiro momento, as exportações podem contribuir porque tiveram um papel importante para a recuperação do setor industrial. Porém, a partir dessa recuperação e atingindo um certo patamar de exportações o país depende da recuperação do mercado interno.
ABr: Há compatibilidade entre o crescimento industrial e taxas de juros tão altas?
Dedecca: Eu diria que a política econômica atual é negligente em relação a isso porque ela não estimula o crédito. Também mantém uma taxa de juros elevadíssima que compromete as decisões de investimento e de produção. E mais do que isso; não tem estimulado uma recuperação da renda da população que pudesse aumentar o consumo e inclusive forçar uma ampliação do nosso mercado interno.