Mylena Fiori
Repórter da Agência Brasil
Brasília – Preocupados com a evolução do acordo entre Mercosul e União Européia, organizações e movimentos sociais de Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai vêm acompanhando o diálogo de perto e trabalham no sentido contrário ao dos diplomatas. "Na nossa opinião, o Mercosul já ofereceu muito mais do que poderia oferecer e cada vez se fragiliza mais enquanto projeto de desenvolvimento regional", avalia Fátima Mello, secretária-executiva da Rede de Integração dos Povos (Rebrip). O Mercosul está passando por um período de muita dificuldade e deveria concentrar energias na elaboração de política de cooperação mais coordenada. Seria contraditório avançar num acordo agressivo como este, com a União Européia", enfatiza.
Fátima diz que as negociações emperraram, no ano passado, porque os europeus queriam "absolutamente tudo", inclusive em áreas que nem sequer estão em pauta na Área de Livre Comércio das Américas (Alca) ou mesmo na Organização Mundial do Comércio, como compras governamentais. Em contrapartida, reduziram suas ofertas em acesso a mercados. "Até mesmo setores que seriam beneficiados com a ampliação das exportações primárias concordaram que os europeus queriam coisas inaceitáveis", afirma.
Exemplo, segundo Fátima, era a exigência de redução de tarifas de importação sobre produtos fundamentais para a agricultura familiar, como cebola, alho, vinhos, pêssegos, entre outros - todos eles produzidos em pequenas propriedades. No caso do leite, o Mercosul aplica tarifa de 27% e os europeus pediam tarifa zero. "Nisso o Itamaraty foi muito permeável às nossas demandas e voltou atrás", comenta.
A inclusão de compras governamentais nas negociações também preocupa particularmente as ONGs. "Consideramos as compras governamentais um instrumento de desenvolvimento" diz. Fátima cita, por exemplo, a compra de alimentos para merenda escolar. "Com isso é possível garantir mercado para a agricultura familiar, regionalizar a merenda... Se o governo abre à concorrência internacionaal, passa a não ter controle sobre o programa".
Na avaliação dos movimentos sociais, as concessões que vierem a ser feitas em um acordo com a União Européia abrem um precedente – ficará difícil não oferecer o mesmo em outras negociações, como a Alca, ou mesmo na Organização Mundial do Comércio (OMC).
A aproximação entre Mercosul e União Européia começou em dezembro de 2005, com a assinatura do Acordo-Quadro lnter-regional de Cooperação, instrumento de transição para uma futura "Associação lnter-regional", que teria como fundamento a implementação de um programa de liberalizarão comercial progressiva e recíproca, abrangendo os setores agrícola, industrial e de serviços. Foi criado o Comitê de Negociações Birregionais (CNB), que teve sua primeira reunião em Buenos Aires em abril de 1999. Os trabalhos prosseguiram em grupos técnicos. Durante todo o ano passado foram trocadas ofertas, com o objetivo de cumprir a data marcada para a finalização do acordo – 31 de outubro de 2004. As ofertas foram consideradas insatisfatórias pelos dois blocos e não houve acordo.