Christiane Peres
Da Agência Brasil
Brasília – O trabalho doméstico infantil envolve mais de de 600 mil crianças e jovens no Brasil e relaciona-se a problemas como a violação de direitos humanos, o abandono dos estudos e o abuso sexual, muitas vezes até mesmo por familiares. Mesmo assim, uma comissão especial criada na Câmara para analisar projetos relativos à questão já foi instalada, mas está sem funcionar desde o fim de 2004, porque alguns partidos não indicaram representantes para ela.
Hoje, 31 projetos de lei sobre o trabalho doméstico tramitam na Câmara. De acordo com a deputada Luci Choinacki, essas propostas deverão ser analisadas pela Comissão Especial do Trabalho Doméstico. Criada em novembro, a comissão ainda aguarda a indicação de representantes de alguns partidos, entre eles PSDB e PFL. "Há má vontade política. Só não entendo o motivo", afirma a parlamentar. Segundo ela, o tema será levado ao presidente da Casa, Severino Cavalcanti (PP-PE), para que se dê agilidade ao estabelecimento da comissão.
A parlamentar fez as declarações em debate promovido hoje pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. O evento teve a presença de especialistas e representantes da sociedade civil.
O coordenador de projetos do Programa Internacional para Eliminação do Trabalho Infantil da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Renato Mendes, chamou a atenção para as estatísticas que mostram a situação no Brasil. Segundo ele, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que mais de 600 mil crianças e jovens estão trabalhando em casas de família, sendo a maior parte nas regiões Norte e Centro-Oeste. "São 15% das crianças dessas regiões no trabalho doméstico. Nos locais onde o desenvolvimento é menor, o direito do trabalhador doméstico também é menos respeitado", afirma o pesquisador.
Cleusa Aparecida da Silva, representante da Articulação Brasileira de Mulheres Negras, lembra que se trata de uma questão "complicada". "Os parentes da ‘vítima’ não têm essa noção de trabalho ou têm uma relação meio familiar. Então, a criança vai ajudar aquela família sem remuneração. Ela lava, passa, arruma casa, mexe com produtos químicos e deixa de ir à escola. Além disso, tem os casos de abuso sexual. Mas o pior é que até hoje, esse tipo de trabalho é negado. Por mais que os números provem que existe", relata.
Segundo Cleusa, é a visibilidade do problema que vai ajudar a solucioná-lo. Já a deputada Luci Choinacki (PT-SC), que participou do debate pela comissão, acredita que é preciso uma mudança na mentalidade da população e a elaboração de políticas públicas para enfrentar o problema. "Essa situação das crianças no trabalho só se resolve com políticas sociais de inclusão. Elas garantem a permanência da criança na escola. Quando tivermos medidas de inclusão, essas crianças não serão obrigadas a trabalhar desde cedo em casas como empregadas domésticas. Se não se garante o direito a uma renda de inclusão social, elas vão buscar uma forma de ganhar dinheiro e ajudar a família", explica a parlamentar.
A violação dos direitos das crianças preocupa a presidente da Federação das Trabalhadoras Domésticas, Creuza de Oliveira. Segundo ela, essas crianças deveriam estar na escola, brincando, vivendo a infância para só trabalhar depois de adulta. "Está faltando política pública, fiscalização, compromisso e mudança de mentalidade."