Mumbai - Para uma série de movimentos sociais e ONGs que participam do Fórum Social Mundial 2004, a Organização Mundial do Comércio (OMC) transformou-se na principal instância regulatória da economia do mundo e, por isso, deve ser o alvo das próximas campanhas e manifestações internacionais. Nessa mobilização, os ativistas vêem como potencial aliado o G-20, grupo de países montado com auxílio do Brasil para as negociações internacionais no campo do comércio, durante a última reunião da entidade, em Cancun, no México. Representantes de movimentos presentes ao evento em Mumbai consideram o G-20 um "obstáculo à agenda americana".
A amplitude da pauta negociada na entidade explica a opção. Vale a ironia: na OMC, os países discutem um pouco de tudo, inclusive comércio. "A OMC é a principal organização da globalização neoliberal e temos de estar atentos a isso. Por meio dela, os países ricos estão impondo as regras que regem a economia mundial", afirma o mexicano Hector de la Cueva, da Aliança Hemisférica Social.
Segundo os ativistas, a tendência ganhou força a partir da 5ª Reunião Ministerial da OMC, realizada em Cancun, no México, em setembro de 2003. Foi durante o encontro de Cancun que Brasil, Argentina, China e Índia se uniram a outros países em desenvolvimento para criar o G-20. O grupo não conseguiu concretizar sua pauta, que passava pela redução dos subsídios agrícolas nos Estados Unidos e na União Européia, mas teve forças para recusar a proposta apresentada pelos ricos.
O G-20 é visto como importante parceiro pelas ONGs e movimentos sociais presentes ao Fórum em Mumbai. "Esse grupo representou um obstáculo à agenda americana", diz Cueva. "Os movimentos sociais devem levar em conta essa reorganização das formas internacionais e apoiar os aspectos progressistas do G-20. Mas é importante que movimentos sociais e governos continuem a manter agendas independentes".
A ressalva feita por Cueva refere-se a algumas posições do G-20 que não encontram correspondência ou se chocam com a pauta dos ativistas. "O G-20 tem muitas facetas", aponta o filipino Walden Bello, da organização Our World is not for Sale (nosso mundo não está à venda). "O governo da Índia é neoliberal e a China está aplicando políticas desse tipo. Estão em jogo muitos compromissos com as grandes empresas e temos de tomar cuidado. O G-20 é positivo, mas temos de evoluir".
A diversidade interna do G-20 pode ser percebida na própria dificuldade em se denominar o grupo com base no número de participantes. Em Cancun, dependendo do tema a ser discutido, alguns países pediam para entrar no grupo, e outros, para sair. Desde seu lançamento em setembro de 2003, ele já foi chamado por autoridades de G-20, G-21, G-22, G-X, G-20plus e G-20mais. Pelo menos aqui no FSM de Mumbai o nome foi padronizado: ao falar do grupo, quase todos referem-se ao G-20.
"Temos de aproveitar esse momento de vulnerabilidade da OMC", defende a australiana radicada na Tailândia Nicola Bullard, da Focus on the Global South. Mas, ela pede prudência. "É hora de os movimentos se unirem ainda mais e fazerem campanhas de esclarecimento público", diz ela.
O boliviano Juan Carlos Arrualde, da Fundação Solon, concorda. "Será um erro tentarmos mobilizar a população sem uma campanha que explique como as decisões tomadas na OMC influenciam temas como saúde e educação", afirma Arrualde, lembrando a revolta popular que conseguiu reverter a privatização dos serviços de água em Cochabamba, no final dos anos 90. "A população só foi às ruas porque estava ciente dos problemas trazidos pela privatização (como a disparada dos preços da água)".
Como e quando serão essas campanhas e manifestações é uma discussão que acontecerá depois do FSM 2004. Mas, as ONGs e movimentos sociais já trabalham com algumas datas, pelo menos para as grandes mobilizações de rua. Uma delas é abril de 2005, quando o G-8 deve realizar um encontro na Inglaterra.
* Com informações da Agência Carta Maior, parceira da Agência Brasil na cobertura do Fórum Social Mundial 2004<>/i