Erros e qualidade da informação jornalística

06/03/2009 - 9h27

Paulo Machado
Ouvidor Adjunto da EBC
Brasília - “MEC quer acabar com a alfabetização”. Essa foi a informaçãoque o leitor da Agência Brasilrecebeu ao ler a matéria Unesco quer sensibilizar gestores sobre importância do acesso à leiturae à escrita, entre os dias 18 de fevereiro, dataem que foi publicada, até o dia 26 de fevereiro, data em que foi corrigida e apalavra alfabetização foi substituída pela palavra analfabetismo, graças àpercepção do leitor Landro Oviedo.Tal como Landro, 142 leitoresenviaram mensagens para esta Ouvidoria entre julho de 2008 e janeiro de 2009para reclamar  de erros que perceberamnas matérias da ABr e que deramorigem a processos internos. Antes de abrir um processo, a equipe da Ouvidoriaanalisa a pertinência da reclamação do leitor que, se constatada, é encaminhadaà chefia da Agência para osprocedimentos que julgar necessários, dentre eles fazer a devida correção oupronunciar-se a respeito, justificando a manutenção da informação na formaoriginalmente publicada.    Os erros cometidos nas matérias são classificados pelaOuvidoria conforme critérios pré-estabelecidos: erros gramaticais, de digitaçãoou padronização, falta ou erro de apuração, falta de informação ou aindainformação errada. Essa classificação permite tentar identificar as  causas dos erros nas diferentes etapas doprocesso de produção da informação e sugerir medidas para que eles não serepitam. Na verdade, os erros nas matérias têm sido muito maisnumerosos do que os apontados pelos leitores. Em média, 40% das notícias contêmerros, segundo apuração feita por um serviço interno da ABr que visa a detectá-los e corrigi-los antes que sejam percebidospelos leitores. Afinal, o que está em jogo são a qualidade da informaçãojornalística e a conseqüente credibilidade do veículo de comunicação - seumaior patrimônio. Tão importante quanto a quantidade de erros  é o seu tipo, porque muitas vezes elesalteram, deturpam a informação que o jornalista quer transmitir. Se um erromédico pode causar a morte do paciente, quais os danos que um erro deinformação jornalística pode causar ao leitor? Essa é uma pergunta que todojornalista deveria se fazer diariamente, várias vezes ao dia, ao ter que tomarinúmeras decisões no processo de produção da noticia. Além da classificação inicial das demandas dos leitores, aOuvidoria faz uma apuração mais detalhada para descobrir onde e porque os errossão cometidos. Os erros de apuração talvez sejam aqueles que mais danos causamao leitor, pois afirmam algo que é inverídico. Foi sobre um erro desses, cometido na matéria Cooperativa do Haiti usa minifábricabrasileira de processamento de castanha de caju, publicada 23 de dezembrode 2008, que o leitor Rafael Beleboni reclamou à Ouvidoria. Segundo o leitor,diferentemente do que a matéria informava, os recursos que financiam o programasão totalmente brasileiros e não do Programa das Nações Unidas para oDesenvolvimento (Pnud).  Além disso, osprodutores de castanha não fornecem o produto para “grandes industrias” poisnão há grandes industrias no Haiti e, tampouco, o produto é exportado, mas,sim, vendido nas ruas, de maneira rudimentar, com baixo valor agregado. Outro tipo de erro, observado pelos leitores, é aquele emque o jornalismo da ABr cometeimprecisões como, por exemplo, na matéria Primeiraclinica pública de SP para tratar dependentes químicos não aceitará infratores,publicada em 28 de janeiro.  Segundo oleitor Irandi Vieira de Oliveira, ora a notícia fala em infratores cumprindopena, ora fala em pessoas que tiveram passagem pela policia. Ele pergunta:jovens que tiveram passagem pela policia, mas não estão cumprindo pena podem ounão ser atendidos pelo programa do governo de São Paulo? A resposta à dúvida doleitor deveria estar na notícia e poderia ser decisiva para ele saber se umadeterminada pessoa terá ou não  acessoàquele serviço público. Sabe-se lá quantas decisões importantes os cidadãos quetêm filhos, amigos ou parentes necessitando de tratamento  não tomariam em função dessa informação? Ouainda a usariam para discutir a eficiência e a eficácia da política públicaobjeto da notícia? Para combater a imprecisão, uma vez o jornalista JosephPulitzer, estabeleceu três regras básicas que valem ouro para o jornalismo:"Exatidão, exatidão e exatidão”.Muitose tem   falado e pesquisado a respeitoda qualidade da informação jornalística e de seu papel na construção designificados pela sociedade. Pesquisadores de universidades mundo afora têm sededicado a estabelecer indicadores e a desenvolver metodologias que permitamsua aferição. No Chile, a Universidade Católica desenvolveu o Valor AgregadoPeriodístico (VAP, sigla em espanhol), na Argentina, o  Instituto de Comunicação Social daPontifícia Universidade Católica desenvolveu o Percepción de la CalidadPeriodística (PCP, sigla em espanhol).  No Brasil, a Unesco – organismo das Nações Unidas para a educação, aciência e a cultura, mantém um projeto em parceria com a Rede Nacional deObservatórios de Imprensa  (Renoi)chamado  Indicadores de Qualidade daInformação Jornalística, que objetiva propor instrumentos de medição deexcelência e contribuir para o desenvolvimento do setor no país. A parceriaUnesco-Renoi se estenderá até o final de 2009, quando a etapa conceitual doprojeto dos indicadores deve ser concluída.Na sequência, pesquisadores da Renoiagregarão os resultados num sistema informatizado que possa servir deferramenta para a avaliação da qualidade dos meios de comunicaçãobrasileiros. Mas a maior parte das redações desconhece esses métodos ou prefereignorar esse conhecimento, optando por trabalhar sem indicadores de qualidadeda informação que produzem. A EBC, como empresa pública de comunicação, poderia adotar ou mesmo criar algum tipo de sistema de avaliação como maneira de implementar mecanismos para o controle social e democrático da qualidade da informação.Enquanto isso, alguns leitores dedicam um certo tempo àcrítica do jornalismo praticado pela ABr.Esse é o caso, por exemplo, de Rafael Moreira Gomes: “estive lendo algumas notícias no site de vocês e acabei enviando ume-mail contendo um erro de português de uma das matérias que li, porém, ao leroutras matérias encontrei alguns outros erros de português, tais como virgulasdesnecessárias, frases simples separadas por ponto final e que poderiam serunidas numa frase composta. Em alguns outros casos o texto não está bemapresentado, pois no começo diz-se algo, no meio diz-se mais um pouco e nofinal se conclui o que começou a ser exposto no primeiro parágrafo. Esse é ocaso da notícia sobre Cesare Battisti... [ Embaixadorbrasileiro é chamado pela chancelaria italiana a explicar refúgio dado a CesareBatisti, publicada em 14 de janeiro]. ... a mensagem começou a ser expostadesde o primeiro parágrafo [motivos da condenação de Battisti]e acho que seexpusessem todas essas informações de uma só vez o texto seria melhorassimilado, porque não está bem claro por quais motivos ele foi condenado, sódiz que matou, mas não diz o porquê . Fica confuso para quem ainda não tinhanascido na década de 70, como eu,  e nãoconhece o  Grupo BrigadasVermelhas,   entender porque oprimeiro-ministro Aldo Moro foi assassinado.” A Agência Brasilrespondeu ao leitor que: “a técnicajornalística consiste em dar as informações principais  no primeiro parágrafo, que chamamos de  lead. Em seguida, entramos nos detalhes. Nãopodemos dar todas as informações em um parágrafo senão o texto fica cansativo,pesado e deixa de interessar ao leitor. Em uma agência de notícias na internet,os textos devem ser curtos, com exceção de matérias especiais. Quanto àsquestões sobre Aldo Moro e  as BrigadasVermelhas, concordamos que seria interessante dar mais informações. Nem sempreisso é possível pela necessidade de colocar logo o texto no ar, uma vez quetrabalhamos com jornalismo em tempo real.”  Para Carina Andrade Benedeti(*) o jornalismo arvora para sia competência de construir o discurso informativo jornalístico: Éem nome dessa competência de bem informar em condições adversas de tempo quesua credibilidade ( e autoridade) social existe. A ampliação do poder daatividade jornalística na sociedade impõe-lhe exigências de qualidade cada vezmaiores, de forma que as dificuldades peculiares da atividade, e as restriçõescriadas pelos interesses financeiros no jornalismo (pela concorrência) nãoservem de justificativas absolutas para as suas deficiências.”Ainda sobre a qualidade da informação, o jornalista norteamericano Kevin Mckenzie disse que:“Por mais de 20 anos escreviartigos diários em jornais e nunca ninguém perguntou aos meus leitores se meutrabalho era bom. Os prêmios de jornalismo que recebi foram decididos por meuspares e nunca pelo público leitor. Hoje a definição de qualidade passa a serdecisão do leitor em cujas mãos está o destino do jornalismo.”  Até a próxima semana. (*) “A Qualidade daInformação Jornalística: Uma Análise da Cobertura da Grande Imprensa sobre osTransgênicos em 2004  Dissertaçãode mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação daFaculdade de Comunicação da Universidade de Brasília. Brasília, 2006.