Flávia Villela
Repórter da Agência Brasil
Rio – A sala, num shopping em Guadalupe, zona norte do Rio de Janeiro, é pequena, com lugar para 73 pessoas. Mas, nem por isso simples: há equipamentos de última geração, poltronas ergonômicas e duas fileiras equipadas com assentos especiais para obesos. O preço: R$ 6 a entrada inteira e R$ 3 a meia. Criado há 11 anos, o Ponto Cine, idealizado por Adailton Medeiros, tinha como principal objetivo levar cinema de arte onde não havia, por preço popular, a um dos bairros da cidade com menor índice de desenvolvimento humano, segundo dados do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).
O objetivo foi alcançado, o projeto cresceu, ganhou prêmios Brasil afora e hoje é o maior exibidor de filmes brasileiros. Também foi o primeiro Cinema da América Latina a ter o selo Carbon Free. Adailton explicou que o espaço, que inclui uma biblioteca e também serve de local para discussões e reflexões sobre cinema e arte com atores e diretores, acabou se mostrando um sucesso de público.
“Nosso público é de pessoas que fazem parte desta cidade, que queriam mas que não tinham condições de usufruir dos bens culturais produzidos aqui. E o Ponto Cine acabou sendo um sucesso. Hoje, a bilheteria e a bombonière sustentam o cinema e em cinco anos o cinema se pagou” .
Iniciativas similares surgiram e estão se consolidando em comunidades cariocas carentes de cultura e lazer. Algumas eram antes redutos de criminosos e hoje estão pacificadas. É o caso do Complexo do Alemão, na zona norte, recente palco de uma batalha entre traficantes e policiais mostrada pela televisão, que hoje tem um cinema Multiplex, com ingressos subsidiados pela prefeitura, filmes de grande bilheteria por R$ 8 a inteira e R$ 4 para moradores, estudantes e idosos — menos da metade do que é cobrado nos demais cinemas cariocas.
No subúrbio de Sulacap, o projeto Cine 10 inaugurou cinco salas populares em outubro passado num supermercado, com recursos da Agência Nacional de Cinema (Ancine) e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O empresário Adhemar de Oliveira, responsável pelo projeto Cine 10, acredita que o quadro macroeconômico favoreceu o surgimento de uma nova classe média brasileira e a criação de novos formatos de cinema para despertar o interesse de novos consumidores. No entanto, ele afirmou que os financiamentos públicos são fundamentais para disseminar esse tipo de cinema voltado para a nova classe média.
“O custo dos equipamentos para montar um cinema é o mesmo, seja na periferia ou no shopping mais sofisticado, para fazer uma coisa de qualidade. Ora, mas os preços finais são diferenciados. Com o Programa Cinema Perto de Você, implementado pela Ancine e que o BNDES está colocando em prática, você tem condições de financiamento melhores para regiões que precisam desse fim”, explicou o empresário, que tem planos de criar mais 200 salas com esse perfil nos próximos anos.
Ponto Cine também tem planos de extensão, com o apoio do BNDES, para criação de salas no interior do estado e subúrbios da região metropolitana do Rio. Tão importante quanto inaugurar salas de cinema populares, segundo Adailton, é investir na formação de público nas escolas . “A gente fala muito de formação de plateia, mas é muito difícil esse trabalho e deve-se começar pelas crianças, por meio da educação, para a democratização do acesso ao cinema”.
O Ponto Cine desenvolve o projeto Rede Limpa de Exibição, em parceria com a Secretaria Estadual de Educação, com alunos de escolas do interior do Rio, para exibição de cinema e criação de cineclube nas escolas.
Edição: Graça Adjuto