Falta de medicamento para combater vírus da aids preocupa ONGs em SP

17/03/2011 - 20h19

Elaine Patricia Cruz
Repórter da Agência Brasil

São Paulo – O medicamento atazanavir, usado por pacientes portadores do vírus HIV, está em falta em diversos pontos do país. O problema foi reconhecido hoje (17) pelo ministro da Saúde Alexandre Padilha e começa a preocupar pacientes com a doença e organizações não governamentais (ONG) voltadas ao trabalho de combate à aids.

“É [um problema] seríssimo. A gente tem que fazer a adesão à medicação. Uma vez que fazemos essa adesão, e fazemos uso da medicação, temos o direito de pedir essa medicação porque é isso que faz me manter vivo, estar em pé, trabalhando e ter uma vida normal”, disse Aguinaldo José Gomes, secretário de um departamento jurídico e soropositivo há 20 anos.

Desde 1996, por garantia da Lei 9.313, o tratamento da aids é assegurado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) a qualquer cidadão com a doença. Segundo o presidente do Fórum de Organizações Não Governamentais de Aids do estado de São Paulo, Rodrigo Pinheiro, existem cerca de 600 mil portadores de HIV em todo o Brasil e, desse total, 200 mil fazem uso de antirretrovirais.

De acordo com o Ministério da Saúde, o atazanavir é um inibidor de protease, enzima importante para a maturação do vírus, e indicado no Brasil como uma das alternativas para estruturar o tratamento antirretroviral, apresentado tanto em cápsulas de 200 miligramas (mg) quanto em cápsulas de 300 mg. O que está em falta é o de 300 mg. O atazanavir é utilizado por 33 mil pacientes.

Segundo o médico infectologista Jean Gorinchteyn, do Hospital Emílio Ribas de São Paulo, não há problemas na substituição do medicamento. “O mais importante é que essa substituição ocorra de uma forma breve, sem que ocorra a interrupção dessa medicação. Tem que acontecer com substituições de medicações da mesma classe”, disse.

De acordo com o médico, normalmente os pacientes toleram bem a substituição da droga, mas há pessoas que têm resistência a determinadas medicações e, para evitar essas situações, todas as farmácias têm estoques mínimos para contemplar atender a esses pacientes.

Aguinaldo José Gomes afirmou ainda que o desabastecimento também pode provocar um problema de ordem psicológica nos pacientes. “Psicologicamente, isso é extremamente ruim porque esse paciente está muito adaptado. Então, quando isso acontece, a sensação que ele tem é de descontinuidade quando, na verdade, isso é uma inverdade, ele vai continuar a medicação”, afirmou o médico.

O problema no abastecimento do atazanavir, de acordo com o presidente do fórum, foi notado no mês passado. Uma nota técnica emitida pelo Ministério da Saúde na última segunda-feira (14) recomenda que o medicamento seja fracionado nos locais onde ele ainda estiver disponível ou substituído temporariamente por outro caso fosse observada sua falta completa. A nota técnica também informa que a previsão é que o fornecimento do atazanavir esteja regularizado até a última semana deste mês.

“A maior preocupação que temos quando falta um antirretroviral é a questão da adesão. Hoje, as pessoas que começam a fazer uso do medicamento precisam tomar esse medicamento de forma contínua, todos os dias. E quando falta esse medicamento ou quando se fraciona, isso prejudica muito a questão da adesão”, disse Pinheiro.

De acordo com ele, os problemas no abastecimento de medicamentos são recorrentes. No mês passado, segundo Pinheiro, houve falta do saquinavir. “Todo ano ocorrem problemas graves de desabastecimento. E falta transparência: não sabemos o verdadeiro motivo dessa falta”, afirmou.

Para Pinheiro, o problema do desabastecimento poderia ser solucionado se houvesse estoques reguladores de, pelo menos, três meses. “Se tivesse um estoque, poderia se suprir essa questão de abastecimento”, disse. Ao participar do Fórum ONGs de Aids em São Paulo, em janeiro deste ano, o ministro da Saúde Alexandre Padilha cogitou essa hipótese de formar um estoque regulador.

Para pacientes com HIV, a recomendação do médico é que eles não fiquem sem medicamento, e que procurem seus médicos ou unidades de saúde num prazo de 15 antes que os remédios acabem. “À medida que o paciente fica sem a medicação, ele vai precisar de um hiato de dois a três dias que, para ele, poderia acarretar prejuízo”, alertou.

A fabricante do medicamento, a Bristol-Myers Squibb, informou, por meio de nota, que está “trabalhando com o Programa Nacional de DST/Aids para garantir que o Reyataz [atazanavir] seja distribuído aos pacientes o mais rápido possível”. Segundo o laboratório, uma nova remessa do remédio deve chegar ainda hoje (17) ao Brasil. “Ressaltamos que não existem problemas na fabricação do produto e que não há intenções em descontinuar o medicamento”, informou.

Já o Ministério da Saúde, também por meio de nota, afirmou que não houve risco ao tratamento de nenhum paciente que utiliza antirretroviral e que se antecipou à dificuldade no abastecimento para recomendar a substituição do medicamento por outro.

O Ministério confirmou que o primeiro lote com 4,5 milhões de comprimidos de atazanavir chega hoje a Brasília e logo será enviado aos estados entre os dias 22 e 25 de março.

Sobre o saquinavir, o ministério informou que não houve desabastecimento, mas um remanejamento local dos estoques, e que a cobertura desse medicamento está garantida até a primeira quinzena de abril. O laboratório produtor do saquinavir deve fazer a entrega antecipada de parte do primeiro lote do medicamento na próxima semana.

 

Edição: Aécio Amado