Renata Giraldi e Lísia Gusmão
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Os alemães orientais começaram a buscar as fronteiras menos rigorosas da Hungria e da Checoslováquia com a Áustria. Os líderes da Alemanha Oriental decidiramm, então, diminuir a burocracia para o trânsito de cidadãos para o Ocidente. A flexibilização das regras para obtenção de passaportes e vistos foi anunciada numa conturbada coletiva de imprensa na noite de 9 de novembro de 1989, já em pleno outono. Informações desencontradas e confusas davam conta de que as mudanças entrariam em vigor de imediato. Em poucos minutos, alemães eufóricos tomaram os principais pontos da fronteira entre Berlim Oriental e Berlim Ocidental. “Não foi uma ação planejada. Na verdade, foi uma grande surpresa. O Muro caiu meio que por acaso”, disse diplomata Holger Klitzing, que trabalha na Embaixada da Alemanha no Brasil.A queda do Muro de Berlim simbolizou o fim do chamado socialismo real no Leste Europeu. “A partir daí, é uma espécie de dominó. Se o país mais desenvolvido do bloco socialista cai, no caso a Alemanha Oriental, os outros vão seguindo”, observa Virgílio Arraes, professor de relações internacionais da Universidade de Brasília (UnB). “Neste sentido, os norte-americanos conseguem ganhar, sem disparar um só tiro, a Guerra Fria. Apresentam ao mundo uma nova forma de ser, a democracia neoliberal.”O Muro de Berlim foi levantado nas primeiras horas de 13 de agosto de 1961, numa secreta operação batizada de “Rosa”. Naquela manhã, os berlinenses acordaram em uma cidade dividida. A República Democrática Alemã havia erguido barricadas com arame farpado que separavam o setor soviético de Berlim dos setores ocidentais. Nos dias seguintes, a estrutura foi reforçada com blocos de concreto, cimento e placas de metal. Torres de observação ocupadas por policiais fortemente armados e cães de guarda cuidavam para que ninguém tentasse atravessá-la. Durante 28 anos, o muro com uma extensão de 155 quilômetros separou uma cidade, sem respeitar laços familiares ou afetivos, como se vê no filme Asas do desejo, de Wim Wenders.Em 1949, no apagar das luzes da 2ª Grande Guerra Mundial, a Alemanha foi retalhada para contemplar as potências vitoriosas: Estados Unidos, União Soviética, Inglaterra e França. As zonas controladas pelos ocidentais reuniram-se sob a República Federal da Alemanha. O lado soviético formou a República Democrática Alemã (RDA). Tal como o resto do país, o mesmo foi feito com a cidade de Berlim, uma “ilha” dentro da RDA, uma espécie de “buraco” na Cortina de Ferro que separava o Ocidente capitalista do Leste socialista. Nos seus primeiros 20 anos, a RDA atingiu um nível de vida superior ao dos outros países da órbita soviética. Os laços econômicos com a Alemanha Ocidental representaram uma enorme vantagem nas trocas comerciais. “Por meio da República Federal, a RDA teve acesso ao mercado comum da Comunidade Europeia, por exemplo. Esses laços econômicos fizeram a diferença”, explica Klitzing,.Mas, a partir dos anos 1970, os choques do petróleo ofereceram um horizonte sombrio. O fornecimento de petróleo subsidiado da União Soviética sofreu drásticas reduções, o que deflagrou graves crises de abastecimento na RDA. Em 1989, o governo alemão oriental já estava completamente falido. Na União Soviética, o líder reformista Mikhail Gorbachev apostava na liberalização do país para modernizá-lo e mantê-lo como grande potência. Frustradas as expectativas, a pressão popular nos países socialistas foi ampliada, e Gorbachev decidiu que nenhuma arma seria disparada para contê-la. Ruiu assim o sistema socialista e, junto com ele, o Muro de Berlim. “Até o final dos anos 1960, Alemanha Oriental, Checoslováquia e Hungria eram países que tinham um nível de vida superior ao da Espanha, de Portugal e da Grécia. Eram países que tinham a aceitação de suas populações. Mas, nos anos 1980, isso desmorona, perde a legitimidade”, diz Arraes, da UnB.