Governo discute plano para integrar ações de inclusão digital

04/08/2004 - 20h01

Gabriela Guerreiro
Repórter da Agência Brasil

Brasília - O governo brasileiro deve lançar, nos próximos meses, o Programa Brasileiro de Inclusão Digital (PBID), com o objetivo de ampliar a proporção de cidadãos - sobretudo os de baixa renda - com acesso às tecnologias da informação. A idéia é reunir todas as ações já desenvolvidas em vários ministérios e órgãos federais sob a coordenação da Casa Civil da Presidência da República.

Com essa ação, o governo brasileiro pretende combater o que nos últimos anos convencionou-se chamar "exclusão digital". De acordo com o censo 2000 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), apenas 10,6% dos domicílios brasileiros têm computadores. Estimativas mais recentes reunidas pelo Governo Federal afirmam que 13,9 milhões de brasileiros têm hoje acesso à Internet. Desse total, 90% pertencem às classes A e B. Países com populações menores do que a brasileira registram, proporcionalmente, um percentual maior de pessoas com acesso à Internet, como é o caso do Chile, que possui 20,02% de sua população conectada à rede.

"A idéia é que o Programa de Inclusão Digital se torne um programa do governo com a marca do governo Lula", afirmou, em entrevista à Agência Brasil, o secretário-executivo da Casa Civil, Swedenberger Barbosa. Leia os principais trechos da conversa, realizada em seu gabinete, na manhã desta quarta-feira, pouco antes da reunião da Câmara de Políticas de Desenvolvimento Econômico, que debateu o projeto.

ABr - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu, em recente discurso, que a inclusão digital deve ser uma forma de inclusão social. O que isso significa na prática?

Swedenberger Barbosa - A inclusão social pode ser acelerada com o uso de tecnologias de informação. Portanto, quando o presidente fala na questão de inclusão digital como forma de inclusão social, isso é oriundo de uma política global do governo com diferentes ações que façam a inclusão social. Uma população que está inserida digitalmente terá mais condições de ocupar novos postos de trabalho na sociedade, por exemplo. Além disso, as iniciativas de cooperativismo e economia solidária ganham maior espaço com trabalho em rede, teletrabalhos, telecentros etc.

ABr - O Programa Brasileiro de Inclusão Digital terá uma coordenação nacional? Com quem ficará a atribuição de gerenciar o programa?

Barbosa - É um processo que estamos discutindo, porque estamos juntando muitas ações desenvolvidas no governo por diferentes ministérios. Cabe à Casa Civil a coordenação de uma série de ações de governo, entre as quais a estruturação desse processo. A idéia original é que seja coordenado pela Casa Civil e executado, sobretudo, pelo Ministério das Comunicações. Outros ministérios também terão participação muito importante. Mas, esse é o modelo que vamos discutir na Câmara de Políticas de Desenvolvimento Econômico.

ABr - Qual pode ser o significado da inclusão digital para o desenvolvimento econômico do país?

Barbosa - Tem uma importância muito grande. Você encontra formas de otimizar recursos, fazer com que o governo trabalhe de maneira mais organizada e descentralizada. Do ponto de vista do que o país já desenvolve em termos de softwares, é uma coisa importante. A inserção no mercado mundial, as parcerias que o Brasil já consegue fazer e desenvolver em diversos lugares do mundo - inclusive com iniciativas como as que ocorreram recentemente na visita do presidente Lula à África, com a implantação de telecentros. O Brasil já exporta uma posição, uma política e uma tecnologia para atender aos seus parceiros internacionais.

ABr - O Plano Plurianual (PPA) prevê que o governo viabilize seis mil telecentros até o final de 2007. O novo programa vai ajudar o governo a alcançar essa meta?

Barbosa - Quando falamos da construção dos telecentros, não tem sentido fazer um programa para juntar e, ao mesmo tempo, gastar com algo que não precisa. Vamos aproveitar os espaços pré-existentes. Não há a idéia de construção, de começar uma obra. A idéia é aproveitar os locais onde você possa desenvolver, tanto em órgãos do governo federal, como em outros ambientes. Estamos prevendo no ano que vem, em 2005, a implementação de mil telecentros. A meta do PPA é que sejam finalizados até 2007.

Com certeza, nós conseguiremos. Se o resultado de toda essa discussão ensejar um esforço coletivo forte do governo como uma política unitária, não tenho dúvida de que essas questões vão ser fáceis de serem executadas. Há diversos órgãos do governo que têm orçamento, programas já desenvolvidos, previsões dentro do PPA. Com base nisso, e tendo a decisão política, acredito que atingiremos essas metas.

ABr - O programa prevê que cada unidade tenha uma instância administrativa regional. Elas serão montadas com participação da sociedade civil?

Barbosa - Nós temos a idéia de fazer com que, primeiro, o programa não seja entendido como exclusivamente do governo federal. O governo é o organizador desse processo para que o conjunto dos seus órgãos esteja articulado. As estruturas hoje existentes do governo federal, em parcerias com governos estaduais, municipais, organizações não-governamentais, igrejas ou sindicatos, essas áreas físicas não vão apenas sediar, mas também promover a inserção do programa.

Isso vai acontecer nos moldes do que desenvolvemos quando unificamos as políticas na área social. Nós adotamos como política do governo a decisão de organizar, juntar e articular todas as iniciativas e os programas. Ao mesmo tempo, demos a eles uma coordenação única de governo, e fomos buscar parcerias e desdobramentos com os governos estaduais e municipais.

No caso do Programa Brasileiro de Inclusão Digital, isso deve ser perseguido também. Para isso, você precisa ter as localidades onde vamos desenvolver esse trabalho, com esses parceiros que mencionei e, ao mesmo tempo, ter um comitê gestor com esses diversos parceiros participando.
Estamos em processo de discussão sobre como se insere a representação da população nesse comitê gestor.

ABr - Como ficarão essas várias iniciativas e projetos de inclusão social em curso nos diversos ministérios após o plano?

Barbosa - Primeiro, eu vou dar alguns exemplos de ações que estão em curso. No Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio, existem os telecentros de informações e negócios; no Ministério da Educação, o Programa Nacional de Informática na Educação (Proinfo); os Pontos de Cultura, no Ministério da Cultura; o Governo Eletrônico e os Serviços de Atendimento aos Cidadãos (Gesac), no Ministério das Comunicações; o Projeto Rede Florestas, da Eletronorte, com participação direta do Instituto Nacional de Tecnologia de Informação (ITI) da Casa Civil; os projetos de Telecentros BR, da Petrobrás e do ITI, o CorreiosNet, dos Correios e do Ministério das Comunicações; o Programa de Inclusão Digital de Pescadores, da Secretaria Nacional de Aqüicultura e Pesca, além da doação de máquinas usadas, do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal, só para citar alguns.

Há outras ações menores que não foram citadas. Então, imagine o que é fazer com que tudo isso se reúna, com acessibilidade, fazendo a conexão de tudo isso, tendo um espaço físico comum.

ABr - O programa também prevê a racionalização da infra-estrutura de redes da administração federal, com prioridade para a inclusão digital. Como isso vai funcionar?

Barbosa - Nós queremos usar a rede e a infra-estrutura que o governo federal possui. Com isso, vamos reduzir custos, otimizar o que já está instalado. Vamos usar tudo de modo coordenado: fibra ótica, cabo, rádio e satélite. O telecentro é um espaço multifuncional. A idéia é que ele seja um espaço para a apropriação da população de todas as possibilidades disponibilizadas pelas novas tecnologias de informação e comunicação.

Nesse espaço físico, os cidadãos poderão realizar gratuitamente atividades como acesso ao correio eletrônico, cursos de informática básica, auto-atendimento de serviços públicos, formação e capacitação para aprimoramento profissional, educação à distância, entre outros. O conjunto de informações do governo federal estará disponível também nesses ambientes. É necessário associar a questão da infra-estrutura com o que vai ser realizado obtendo essa infra-estrutura.

ABr - O Programa de Inclusão Digital vai utilizar software livre? Por quê?

Barbosa - O uso do software livre garante que as iniciativas da inclusão digital serão sustentáveis economicamente, na medida em que não serão gastos recursos financeiros na compra de licenças de software básico. Além disso, essa opção tem um viés estratégico, pois está vinculada à autonomia tecnológica nacional. Por fim, deixaremos de enviar milhões de dólares na forma de royalties ao exterior. Essa é uma opção já colocada pelo governo brasileiro, defendida e orientada pelo presidente Lula, cuja política já está em curso como programa do nosso governo.

ABr - O programa também prevê levar computadores para escolas públicas?

Barbosa - Já estamos levando isso através do Proinfo, do Ministério da Educação. A idéia é que, com esse programa unificado, isso seja ainda mais potencializado. O MEC já tem um estudo de reorganização de metas em relação a isso. A ampliação das metas previstas pelo MEC também estará inserida nesse programa único.

ABr - Qual será o custo para o governo do programa de inclusão digital? Serão utilizados recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (FUST)?

Barbosa - O levantamento inicial dá idéia de R$ 120 milhões como adicionais em termos de orçamento. Não são os recursos pré-existentes que estão contemplados nos vários programas de cada ministério. Nós queremos usar o FUST. Mas não podemos esperar que os problemas relacionados ao FUST sejam superados. Estamos fazendo algo que seja para agilizar. Se ficarmos dependendo de uma série de questões que não se relacionam só ao governo federal, de utilização dos recursos do FUST e seus critérios, contenciosos judiciais, aí esse programa de inclusão digital demoraria muito mais.

ABr - O senhor já tem idéia de prazos para a implementação do projeto?

Barbosa - A discussão de hoje na Câmara coroa um processo de discussão feito dentro do governo. Vão ser apresentados inúmeros cenários e propostas de como se pode ter um calendário. Depende de quais condições nós vamos começar, o que se inclui dentro do programa para poder saber qual o calendário e o custo dele. Porque é possível que não se consiga desenvolver em uma primeira etapa todas as ações que estão previstas. Vamos ter que fazer escolhas, inclusive diferenciadas por regiões. Você pode numa região iniciar com a articulação e a junção de três ou quatro dessas iniciativas, em outras podem ser cinco, seis ou oito. Vai depender também do desenho que se discutir a possibilidade dessa diferenciação.

A idéia da reunião com os ministros é bater o martelo em torno da criação desse grupo, ou consolidar esse grupo dentro do governo. A partir daí, teremos a definição final da política pública de inclusão digital como sendo o Programa Brasileiro de Inclusão Digital, que amplie significativamente a proporção dos cidadãos - sobretudo nas classes C, D e E - com acesso a tecnologias de informação. Implementando esse programa, integramos e coordenamos as iniciativas de inclusão digital, induzimos e fomentamos a implementação de espaços públicos de acesso comunitário por governos municipais, estaduais, iniciativa privada e sociedade civil.

A idéia é que o Programa de Inclusão Digital se torne um programa do governo com a marca do governo Lula.