Seminário debate, na Câmara, o direito de informação dos cidadãos

29/09/2003 - 22h32

Brasília, 29/9/2003 (Agência Brasil - ABr) - Porque o número de processos contra as cinco maiores empresas de comunicações privadas do país – Globo, Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo, Grupo Três e Editora Abril – dobrou nos últimos dois anos? Como a informação e o acesso a ela servirão à democracia e ao interesse público sem ser manipulada ou distorcida? Porque, muitas vezes, o jornalista não consegue dar tratamento adequado as informações? Até que ponto a vida de uma pessoa ou a situação de uma empresa não podem ser comprometidas por causa do descuido do uso da informação por deputados de uma Comissão Parlamentar de Inquérito e por sua transmissão em rede nacional pela TV Câmara?

Todos estes questionamentos, feitos hoje na abertura do Seminário Internacional sobre Direito de Acesso a Informações Públicas, realizado na Câmara dos Deputados, demonstram a necessidade de aprofundamento dos debates e dos mecanismos de garantias do direito à informação. A maior parte destas reflexões foram levantadas pelo presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT- SP), que colocou o dedo numa antiga ferida. A mesma imprensa brasileira, livre, que "combateu a ditadura, também, ajudou a ditadura", afirmou.

No seu discurso para uma platéia formada na maior parte por jornalistas, João Paulo Cunha frisou que os acessos às informações por parte de um cidadão e de um jornalista têm características completamente diferentes. Enquanto a informação passada pelo Estado a um cidadão comum é recebida como verdade "quase absoluta", a mesma informação passada a um jornalista é recebida como matéria-prima "que será vendida de acordo com o seu critério", afirmou o presidente da Câmara.

Em suas reflexões, João Paulo considerou a necessidade de se garantir o acesso dos brasileiros às informações públicas de forma cada vez mais transparente. Lembrou que, na Câmara dos Deputados, todos os contratos firmados estão a disposição na internet. "Até mesmo os gastos com o tratamento da piscina da casa do presidente da Câmara estão na internet", completou. A seu ver, entretanto, a modernização do acesso as informações deve ser tratada com cuidado. João Paulo questionou, por exemplo, o fato da Justiça do Trabalho disponibilizar, via internet, os resultados de causas trabalhistas.

Se por um lado o instrumento facilita a vida do cidadão, por outro, pode comprometer o trabalhador, afirmou. Segundo o parlamentar, alguns empresários se utilizam deste mecanismo de transparência da Justiça do Trabalho para saber se algum trabalhador que bate a porta de sua empresa pedindo emprego já recorreu à Justiça contra ex-patrões. João Paulo ressaltou que, muitas vezes, este é um dado fundamental na eliminação da pessoa no processo de seleção.

Já o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Marco Aurélio Mello, destacou que sem uma imprensa livre não há como se cogitar em democracia. Salientou, no entanto, que só as empresas de comunicação Globo, Estado de São Paulo, Folha de São Paulo, Grupo Três e Grupo Abril, somam 3.342 processos na justiça. Destes, 150 na área penal. Marco Aurélio Melo disse, ainda, que este número era a metade em 2001. Em sua avaliação, os dados revelam um número maior de desvios de condutas por parte dos profissionais de imprensa e, também, a maior consciência do cidadão na busca de seus direitos quando sentem-se lesados.

O ministro do STF defendeu a abertura das discussões para a criação de uma nova lei de imprensa. Para ele, os debates deviam tomar como base um projeto de lei relatado pelo senador Josaphat Marinho, que defendia, entre outras coisas, que não se pode potencializar situações individualizadas. "Todos nós, servidores públicos, devemos prestar contas ao contribuinte", destacou Marco Aurélio Melo.

O seminário, promovido pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) prossegue até amanhã. O presidente da entidade, jornalista Marcelo Beraba, lembrou que a garantia ao acesso a informações públicas é a base para governos mais transparentes e acessíveis. "Todo cidadão deve ter acesso fácil e rápido à informações públicas, não apenas às que dizem diretamente respeito a seus interesses pessoais, mas às que interessam à comunidade", afirmou.

Também participaram da abertura do seminário o ministro do Controle e da Transparência, Waldir Pires; o líder do governo na Câmara, Aldo Rebelo; o procurador geral da República, Cláudio Fonteles; e o Secretário de Imprensa e Divulgação da Presidência da República, Ricardo Kotscho, entre outros.

(Marcos Chagas)