Brasília, 16/8/2003 (Agência Brasil - ABr) - Considerado um dos principais responsáveis pelo combate ao trabalho escravo no sul do Pará, o Frei Henri Des Roziers, da Comissão Pastoral da Terra, da Igreja Católica, foi homenageado esta semana pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) com a Medalha da Ordem do Mérito Judiciário do Trabalho. A comenda é outorgada uma vez por ano a pessoas que contribuem para a defesa da justiça trabalhista.
Frei Henri Des Roziers está em Xinguara há mais de 20 anos. Lá, desde l995, recebe denúncias de trabalho escravo em fazendas do sul do Pará. Só há poucos anos as denúncias começaram a surtir efeito: a inspeção de fazendas e a prisão de proprietários responsáveis pelo trabalho escravo. Frei Henri revela que o trabalho escravo é realizado por empresas agropecuárias e não apenas por fazendeiros da região. Segundo ele, nos anos 70 e 80, bancos, construtoras e outros setores do empresariado paulista e carioca adquiriam terras no Mato Grosso, Pará, Rondônia e Acre, entre outros, com o objetivo de usufruir de benefícios fiscais oferecidos pelo governo.
Agência Brasil - Qual é a situação do trabalho escravo hoje na região?
Frei Henri - No sul do Pará, na região de Marabá, Xinguara, Rio Maria e até Conceição do Araguaia, é onde existe a maior concentração de denúncias e de fiscalização do trabalho escravo. No ano passado, essas denúncias cresceram muito. Este ano, o grande esforço conjunto envolvendo o Ministério do Trabalho, a Polícia Federal, o Ministério Público do Trabalho e a Justiça Federal conseguiu chegar a essas propriedades e libertar trabalhadores rurais em situação de escravidão.
ABr - Qual o número de pessoas nessas condições de trabalho forçado?
Frei Henri - Só em 2003, foram libertados pelas operações de resgate 1800 trabalhadores rurais, dos quais mais de mil no sul do Pará.. Algumas denúncias chegam à Pastoral da Terra, não só no sul do Pará, mas em todo o Brasil, trazidas por fugitivos.
ABr - Quais os procedimentos adotados com relação às denúncias?
Frei Henri - Assim que as denúncias nos chegam, nós imediatamente lavramos um boletim do que nos é narrado e enviamos para a Secretaria de Inspeção do Trabalho. Quando há uma operação de resgate de pessoas em situação de trabalho escravo, a primeira coisa a fazer é conseguir que o fazendeiro pague as vítimas. Se o responsável não aceita pagar, a Justiça bloqueia os seus bens. Foi o que aconteceu com Augusto Farias, irmão do PC Farias, que se recusou a pagar os trabalhadores em regime de escravidão que estavam na fazenda de uma empresa dele no sul do Pará.
ABr - O trabalho escravo acontece mais em propriedades de fazendeiros da região ou de gente de fora, como no caso de Augusto Farias?
Frei Henri - Tem as duas coisas. Muitos dos casos acontecem em fazendas que são de grandes empresas agropecuárias. Tem algumas fazendas que aparecem com o nome pessoal do proprietário, só que os proprietários de fora são sempre pessoas jurídicas, e os responsáveis se apresentam como membros da diretoria da empresa. Os empresários donos da propriedade é que são responsabilizados pelo pagamento das indenizações no caso de trabalho escravo, não o empreiteiro.
ABr - Com o novo governo a situação mudou?
Frei Henri - Não há dúvida de que este ano a fiscalização melhorou muito, pois as denúncias já se arrastavam desde l995. Este ano sentimos uma vontade política bem definida em combater o trabalho escravo nas fazendas. O governo despachou para a região o Grupo Móvel da Secretaria de Inspeção do Trabalho e, pela primeira vez, foram encaminhados diversos processos criminais, resultando na prisão preventiva de vários proprietários dessas fazendas. Isso dá um impacto muito grande na região, como foi o caso de Augusto Farias e de outros fazendeiro presos preventivamente pela Polícia Federal e levados para Marabá. Foram soltos, mas estão respondendo a processo criminal.