Rainha da Holanda conversa com o presidente em jantar de gala no Itamaraty

24/03/2003 - 23h14

Brasília, 24.03.2003 (Agência Brasil – ABr) – A primeira visita de um governante holandês ao Brasil desde os anos da colonização foi ofuscada pela eclosão da guerra no Iraque. A avaliação foi feita pela própria rainha da Holanda, Beatrix Armgard, durante o jantar de gala oferecido pelo governo brasileiro no Palácio do Itamaraty. "Minha visita ao Brasil, sobre a qual tinha muita expectativa, coincide com eventos muito sérios que ocorrem em outra parte do mundo. Esses eventos jogam uma sombra escura nesta visita", afirmou. Ainda que o foco de todos os encontros marcados com autoridades brasileiras seja a aproximação comercial entre Brasil e Holanda, Beatrix lembrou que seu pensamento e o de todos os demais estarão sempre voltados aos conflitos na região do Golfo e "à tragédia que atingirá a muitos".

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reforçou a visão da rainha de que todos os líderes mundiais estão preocupados com o futuro da humanidade após a guerra. Lula, no entanto, evitou lamentar o início dos bombardeios e preferiu reforçar a posição brasileira pela restauração da paz - postura que também é defendida pela Holanda. "No momento em que se acirram as tensões no mundo, é importante que países como o Brasil e os Países Baixos continuem, baseados em suas tradicionais posições em favor da paz, a dar o exemplo da moderação e da busca de soluções negociadas para os conflitos", afirmou.

Neste sentido, Lula cobrou a redefinição do papel dos organismos multilaterais, enfraquecidos pela decisão do governo dos Estados Unidos de atacarem o Iraque mesmo sem o aval do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). "É preciso reforçar o multilateralismo, abalado pela guerra no Iraque. O sistema atual, em contínuo aperfeiçoamento, trouxe avanços significativos no que se refere ao diálogo e à concertação no cenário mundial. Não podemos retroceder; a diplomacia permanece como o instrumento mais eficaz para atingir o objetivo maior da paz mundial", disse.

Ainda que a guerra tenha tirado o brilho do jantar de gala, o presidente Lula e a rainha Beatrix insistiram em falar de temas bilaterais. Lula lembrou que Brasil e Holanda formam uma "parceria natural" por serem defensores de valores democráticos, direitos humanos e, sobretudo, de associações regionais como o Mercosul e a União Européia.

O Mercosul mereceu destaque especial do presidente. Lula garantiu que o bloco regional continua sendo prioridade da política externa brasileira, e "importante instrumento de promoção do comércio e de aproximação entre nossos povos e instituições". Mais que isso, Lula disse que o Mercosul é um projeto político, assim como foi a União Européia.

A Holanda é um país de fama internacional pelo seu envolvimento na defesa de projetos sociais. O presidente aproveitou o encontro com a rainha para convidar, indiretamente, os empresários holandeses a aderirem ao projeto de inclusão social proposto pelo seu governo. "Convido, nesse sentido, as inúmeras empresas holandesas que acreditam e investem no Brasil a dar colaboração relevante para a execução das políticas sociais de seu governo", afirmou. No ano passado, a Holanda ultrapassou os Estados Unidos e foi o maior investidor estrangeiro no Brasil, com o total de US$ 3,348 bilhões aplicados no país.

A rainha não pôde garantir o engajamento do setor privado no combate à exclusão social no Brasil. Por outro lado, desejou sorte ao presidente Lula e assegurou que o governo holandês vai continuar acompanhando "os planos do presidente e seus esforços no campo social". Beatrix ainda lembrou que o Brasil hoje é respeitado não só por sua riqueza cultural e potencial esportivo, mas principalmente pela força de sua economia e pela solidez de sua democracia. "As eleições foram acompanhadas em todo o mundo, e também em nosso país, com grande interesse. Elas mostraram o quanto a democracia brasileira está enraizada. Uma democracia bem ancorada pode suportar grandes e fortes mudanças. Os seus compatriotas alimentam, a esse respeito, grandes esperanças", encerrou. Raquel Ribeiro e Gabriela Guerreiro