Carolina Gonçalves
Repórter da Agência Brasil
Brasília – Localizado a menos de 20 quilômetros de São Paulo, o município de São Bernardo do Campo sustenta há três anos uma política de tratamento antidrogas completamente oposta à adotada na capital paulista.
Apontada como modelo ideal por psicólogos e instituições ligadas aos direitos humanos, a terceira maior cidade da região metropolitana e quarto maior município do estado definiu como diretrizes do tratamento a liberdade, os vínculos comunitários e a individualidade de crianças e adolescentes como prioridades da política assistencial antidrogas.
“A internação é fundamental mas, sempre que possível, deve ocorrer em aberto. O que aprendemos é que não há fórmula única para todo mundo. Nossos técnicos usam a expressão ‘tem muito menino para além da droga’”, explicou Lumena Furtado, secretária adjunta de Saúde de São Bernardo do Campo.
Segundo ela, as terapias adotadas mostraram a necessidade de manutenção dos vínculos para que essas crianças consigam refazer suas vidas. “Tínhamos o cuidado centrado em hospitais psiquiátricos até 2008. Em 2009, remodelamos”.
A estratégia adotada em São Bernardo, que ainda não tem levantamentos oficiais sobre os resultados, ocorre em quatro tipos de estrutura. Entre elas estão os centros de Apoio Psicossocial Álcool e Drogas (Caps), que têm unidades separadas para adultos e para crianças e adolescentes. No caso dos Caps juvenis, 100 funcionários são responsáveis pelo atendimento aos usuários.
“São serviços que funcionam 24 horas, fundamentais para que em qualquer hora de crise esses jovens possam ser atendidos", disse Lumena. “Outro dia, um adolescente me contou que foi para casa e passou por uma confusão no bairro. Ele disse que tinha duas opções: sumir de novo na ‘boca’ ou ir para o Caps”. A secretária contou que o adolescente pediu dinheiro à mãe para pagar o ônibus até o centro, onde ficou por cinco dias e voltou para casa.
São Bernardo do Campo tem 780 mil habitantes. Desse total, 517 pessoas estão em situação de rua. Além dos Caps, o município montou 56 pontos de atendimento, denominados Consultórios de Rua, articulados com a rede de atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS), com profissionais da saúde mental, da saúde básica e pelo menos um assistente social. Nesses espaços são realizadas atividades e intervenções psicossociais e educativas na rua, e a equipe conta com insumos para tratamento de situações clínicas comuns, material para curativos, medicamentos e preservativos.
Lumena ainda destaca que existem as repúblicas terapêuticas, que o Ministério da Saúde define como unidades de acolhimento provisório. “É uma residência provisória para os jovens que moram na rua ou que têm dificuldades com a família. A partir do atendimento no Caps, essa pessoa é convidada a morar de quatro a seis meses na república”, explicou.
Segundo a secretária, crianças e adolescentes, durante o período de residência, são estimuladas a retomar os estudos e a visitar museus e cinemas. “Muitos afirmam que foi a primeira experiência em uma sala de cinema”, disse Lumena, acrescentando que “essas moradias têm ajudado a reocupar a cidade e a reorganizar as famílias. As mães são convidadas a visitar. No inicio resistem, mas depois vão e levam um bolo”.
Pedro Paulo Bicalho, coordenador da Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia (CFP), considera a política de São Bernardo um exemplo. “São políticas que devem ser olhadas, copiadas e servir como modelo para o país”.
Edição: Graça Adjuto