Cientista político destaca importância das coligações nas eleições paulistas

31/07/2008 - 15h13

Elaine Patricia Cruz
Repórter da Agência Brasil
São Paulo - Mais tempo nohorário eleitoral gratuito, mais chance de vitória,mais visibilidade ou até aumento no número decandidatos a um cargo, são alguns fatores que podem explicar a escolha de um partido pordeterminada aliança ou coligação política para uma eleição.

Parte darealidade eleitoral brasileira há muito tempo, as coligaçõesdesapareceram do cenário político no regime militar,com a promulgação do Ato Institucional 2,que decretou a extinção dos partidos políticos.

“Com o adventodo bipartidarismo, em 1965, e de proibições expressas, ascoligações desapareceram do cenário eleitoralbrasileiro até as eleições de 1979, voltandoteoricamente e, sob ressalvas, nas eleições de 1982,efetivando-se apenas em 1986”, explica o cientista políticoHumberto Dantas, em sua tese de doutorado sobre as aliançaspolíticas, defendida na Universidade de São Paulo(USP).

Em entrevista àAgência Brasil, Dantas, que também é professor doCentro Universitário São Camilo e conselheiro doMovimento Voto Consciente, afirma que “as alianças sãoindiscutivelmente ferramentas estratégicas utilizadasamplamente por todos os partidos políticos, com ênfasemuito grande nas dez principais legendas brasileiras: PP, DEM, PTB,PR, PMDB, PSDB, PPS, PDT, PSB e PT”.

Segundo ele, ascoligações tendem a um crescimento ainda maior. “Essasdez legendas utilizam de maneira crescente e assustadora as alianças.Elas chegam a se coligar nos municípios em que participam [de eleições] emíndices próximos a 90%”, afirma.

Nessa entrevista, ocientista político fala sobre a importânciadas eleições municipais e destaca as aliançaspolíticas mais visíveis no cenário paulista paraestas eleições. AgênciaBrasil: Qual a importância das eleiçõesmunicipais em São Paulo?Humberto Dantas:Especificamente no caso das eleições em SãoPaulo, a importância tem relação direta com ofato de elas terem um reflexo sobre outras eleições,sejam estaduais, para governador ou deputados, mas também – eaí tem um peso muito grande - nas questões relacionadasàs eleições presidenciais. Temos que levar emconsideração que nas últimas quatro eleiçõespresidenciais, políticos de São Paulo têmprotagonizado ou têm conquistado a imensa maioria dos votos. Estoufalando de Luiz Inácio Lula da Silva, nas quatro eleições,e também de Fernando Henrique Cardoso, José Serra ouGeraldo Alckmin. A eleição de São Paulo tem umaconotação relevante no cenário nacional.ABr: Podemosdizer que ela dá visibilidade para o candidato?Dantas: Ela temvisibilidade e carrega consigo algumas discussões quetranscendem as realidades do município. Acho muito provávelque após o início das campanhas a gente fique apenasconcentrado em falar sobre saúde ou trânsito. Acho quevamos muito além disso. Teremos aí uma discussãode ordem ética também, talvez não tãovisível quanto foi em outras eleições. Teremostambém algumas questões de ordem de comparaçãode gestão, do governo de estado, da Presidência daRepública, e assim sucessivamente.ABr: Seriamestes, então, os assuntos que vão permear as eleições municipais em São Paulo?Dantas: Primeiro,as questões de ordem local, como trânsito e saúde.São duas questões muito importantes. Pode ser que entretambém alguma coisa sobre educação. Estes seriamos três grandes temas: saúde e educação,por questões óbvias, e trânsito, por ser um temaabsolutamente necessário de ser discutido na cidade. Depois,temos algumas questões relacionadas a temas como corrupçãoe escândalos, que vão aparecer, mas talvez não com tantaênfase.  ABr: Falandomais especificamente sobre coligações e aliançaspolíticas, tema de seu estudo, o queleva um partido a optar por uma determinada coligação?Dantas: Asalianças são indiscutivelmente ferramentas estratégicasutilizadas amplamente por todos os partidos políticos, comênfase muito grande nas dez principais legendas brasileiras:PP, DEM, PTB, PR, PMDB, PSDB, PPS, PDT, PSB e PT. Essas dez legendasutilizam de maneira crescente e assustadora as alianças. Elaschegam a se coligar nos municípios em que participam emíndices próximos de 90%. E isso tende a um crescimentohistórico. De 1996 para cá, isso tem crescido. O queleva essas legendas a promover esses tipos de acordos é, semdúvida alguma, o aumento significativo nas chances de vitória,que são calculadas de acordo com variáveis diferentes,que mudam de cidade para cidade. Existem cidades em que tem o horáriopolítico gratuito na televisão: então, quantomais parceiros você tiver, mais aumenta o seu tempo na TV.Existem cidades, por exemplo, em que as alianças aumentam aschances de se ter um número maior de candidatos a vereador.Existem também as alianças calculadas sobre avisibilidade que elas dão ao eleitorado. Enfim, existe umasérie de indicativos e indicadores que mostram a importânciadessa ferramenta como estratégia dos partidos.ABr: Para osenhor, as coligações seriam resultados de cálculos?Dantas:Perfeitamente. A coligação é resultado de umcálculo que o partido faz, muitas vezes em nível local,mas por vezes também em nível estadual ou federal.Temos que pensar na importância das cidades. Por exemplo: BeloHorizonte criou todo esse impasse porque nacionalmente não éinteressante para o PT ter o PSDB como sigla. A Executiva Nacional doPT está entendendo que não vale a pena ter o PSDB comela. Mas, em outras cidades, o PT autoriza isso sem o menorproblema, como já  fez em Nova Iguaçu (RJ), um município com quase 1 milhão de habitantes. ABr: As eleições em São Paulo influenciam nessas coligações?Dantas: Norestante do Brasil, não acredito não. Na verdade, ospartidos se organizam e se aproximam de formas diferentes nosestados. Isso, inclusive, é um aspecto teórico daciência política. Temos que considerar, por exemplo, queem países federalistas, organizados sob o sistema federativo,a tendência do sistema partidário é se tornardescentralizado, ou seja, poderíamos falar seguramente em 27ordens partidárias pelo país, que é o númerode estados se considerarmos o Distrito Federal. Teríamos,então, 27 alinhamentos diferentes. ABr: Mas existeum tipo de aliança que seja mais comum ou até mesmohistórica?Dantas: Existemalianças comuns que não necessariamente, no casoespecífico dos dez principais partidos políticos, serepetem nos 26 estados. Não existe uma aliança que serepita nos 26 estados como algo forte. Claro que existem tendências.O PSDB e o DEM estão juntos num número crescente deestados, de maneira significativa. Outra coisa que precisa serdestacada é que não existe uma aliança que serepita em todos os municípios do Brasil, mesmo porque partidonenhum disputa todas as eleições municipais. Partindodesse pressuposto, as combinações também mudam.ABr: Mas tambémnão é possível afirmar que existam partidosnacionalmente adversários...Dantas: Nessecaso, os adversários podem ser locais, por questões deordem municipal, e isso pode ser desde uma questão ideológica,que é menos provável, até uma questãofamiliar. Mas a gente não pode falar que existam adversáriosnacionais no momento em que pensamos em eleiçõesmunicipais. O PT e o PSDB e mesmo o PT e o DEM são inimigos eternosBrasil afora. Não, isso é mentira. Há cidadesem que eles estão juntos. ABr: Como umpartido concilia alianças diferentes feitas em todo o país,ou por exemplo, serem adversários em determinado estado oumunicípio e parceiros em outros?Dantas: Porvezes, não se concilia. E, nesse caso, o exemplo de BeloHorizonte é emblemático. Você tem liderançaslocais loucas por fazer o acordo e pressões contrárias,estadual ou federal, em conflitos internos. Temos, por exemplo, nosestatutos dos partidos, ferramentas que permitem correligionáriosquestionarem as alianças que foram celebradas pelos partidos,levando para a executiva estadual e quiçá para aexecutiva nacional. Existem processos que correm dentro do própriopartido, e isso às vezes demora e as coisas acabam acontecendoa contragosto de parte significativa dos associados.ABr: Os partidosfazem uma coligação não necessariamente por umaideologia comum. Como um eleitor pode votar numa coligaçãoque não corresponderia ao que ele ideologicamente pensa comoideal?Dantas: Fizminha tese de doutorado justamente para tentar testar o aspectoideologia. Na eleição de 2000, ela até existia umpouco, mas depois a base do governo federal misturou a ideologia. OFernando Henrique Cardoso governava sobre uma base relativamentelógica do ponto-de-vista da ideologia, sendo um governo decentro-direita e a esquerda ficava isolada na oposição.Quando assumiu o governo Lula, ele foi beber na fonte das trêspossíveis posições ideológicas: ele temaliados de esquerda, de centro e de direita. E nos municípiosisso toma vulto de uma confusão. Em minha análise, existe, em primeiro lugar, o fenômeno chamado governismo: onde temgoverno, eu estou dentro porque vale à pena para mim beber na fontedo governo. O PT passou a se tornar uma legenda interessante paraos demais partidos e passou a ser procurado, seja comocabeça-de-chapa, seja para compor a aliança. Alémdisso, o PT aumenta muito a sua presença nos municípiosapós a eleição de Lula. Para o eleitor, podeficar complicado quando ele tem essa consciência ideológica- mas isso é muito pouco provável que aconteça.A quantidade de eleitores que tem ou que traz consigo essaconsciência ideológica é muito pequena. O eleitorno Brasil ainda vota na pessoa, na figura. ABr: Quecoligações são mais visíveis nas eleiçõesmunicipais de São Paulo para este ano?Dantas: Existemalgumas coligações em São Paulo que sãomuito importantes e inclusive podemos até falar em coligaçõestradicionais. A primeira coligação importante aqui em São Paulo é a que foi conquistada pelo atualprefeito Gilberto Kassab. Se fôssemos falar em coligaçõesmais relevantes ou a que sai na frente nessa disputa toda, o prefeitoKassab definitivamente conseguiu angariar para ele os parceiros maisimportantes. Ele é do Democratas, partido que tem um pesoimportante, principalmente no que diz respeito a horárioeleitoral. Isso não ganha eleição, mas éimportante. Ele também trouxe para si o PMDB, que é umabancada muito relevante. Temos aí uma dupla de partidos quenão pode deixar de ser destacada. Além disso, elecarregou também o PR, partido dovice-presidente da República, José Alencar, no primeiromandato. Do ponto de vista de união de partidos, esta talvezseja a coligação mais importante. O acordo costuradopelo Geraldo Alckmin é bastante comum, e é importantedestacar que foi o acordo com o qual ele perdeu as eleiçõesde 2000, quando foi candidato a prefeito de São Paulo e deixoude ir ao segundo turno. Se nãome engano, ele trazia consigo como vice na chapa o deputado estadualCampos Machado, do PTB. Tem a Marta Suplicy, nessa tentativa deconvencer alguns aliados, principalmente do governo federal com ochamado 'bloquinho' - formadopelo PDT, PC do B, PSB e PRB -, de caminhar com ela.Temos o problema do PDT, ligado à figura de Paulo Pereira daSilva. Tem o PCdoB. Temo PSB, umpartido que pode ser um aliado interessante. Correndo por fora, nóstemos o PPS, com a Soninha. E por último, a campanha de Paulo Maluf.