Missão aponta impactos da produção de biocombustível sobre direito à alimentação

10/04/2008 - 18h06

Paula Laboissière
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Avançarnas negociações e trâmites legais para solucionaro problema da superexploração e violaçãodos direitos trabalhistas, além de buscar alternativas para opagamento por produtividade, estabelecido em todo o sistema deprodução canavieiro.

Sãoestas as recomendações apontadas pela missãointernacional que, após visitartrês estados brasileiros, constatou uma série deimpactos provocados pela monoculturavoltada para a produção de biocombustíveis. Desde o dia 3, a Organização Internacional deDireitos Humanos (Fian), em parceria com entidades representativas da Alemanha, da Holanda, da Suíça e do Canadá,visitou os estados de Mato Grosso do Sul, Piauí e SãoPaulo.

O foco estabelecido para a investigação foi odireito humano à alimentação adequada. Em MatoGrosso do Sul, uma equipe visitou a população indígenaGuarani-Kaiowá, que vive no município de Dourados.Segundo Sofia Monsalve, representante da Fian e uma das coordenadorasda missão, foram constatadas “sérias violações”ao direito humano da alimentação devido à "falta de acesso e de controle sobre suas terras ancestrais”.

“Éum problema histórico, não é novo. Mas se agrava pela expansão do cultivo da cana emterras ancestrais indígenas. Os fazendeiros fazem muitapressão para a demarcação de terra e temosdenúncias de intimidação por parte defuncionários públicos encarregados desse processolegal. Os indígenas, por falta de opção, têm quetrabalhar no setor canavieiro”, disse.

Dadoslevantados pela missão revelam que 25 crianças da etniamorreram em 2005 de desnutrição, devido à interrupção na entrega de cestas básicas. As entregas foram retomadas posteriormente, mas segundo a equipe ainda são elevados os índices de desnutriçãosevera e de risco nutricional no local. Nos 3,5 mil hectares da reserva de Dourados vivem 14 mil indígenas.

No Piauí,após visita à Fazenda Santa Clara – no município deCanto do Buriti (330 quilômetros ao sul da capital, Teresina) –, onde a mamona é cultivada para a produção de biodiesel pela empresa Brasil Ecodiesel, Monsalve relatou que os trabalhadores da fazenda são submetidos a um "rígido" sistema de pagamento por produção: a empresa reduz o salário quando não é alcançada a meta de três toneladas anuais, fixada em contrato.

Jáem São Paulo uma terceira equipe constatou que nos municípios de Ribeirão Preto, Guaíbae Araraquara as condições de trabalho no setorcanavieiro implicam violações aos direitostrabalhistas, além do direito à alimentaçãoe à saúde dos trabalhadores. “Éum problema estrutural de superexploração baseado nomodelo de pagamento que leva os homens atrabalharem além de sua capacidade físicae às custas da saúde deles. O trabalhador quer cortarmuita cana para ganhar mais, mas não faz pausa e nãopode se alimentar adequadamente”, disse Monsalve.

De 2004 a2008, no estado, 21 trabalhadores morreram por exaustão e desde a década de 80 a produtividade média de cada cortador de cana passou de 6 para 12toneladas ao dia. Já a remuneração caiu no período, segundo a missão.