Julio Cruz Neto
Enviado especial
Buenos Aires (Argentina) - O cineasta Fernando Solanas surpreendeu na eleição presidencial argentina do último domingo (28). O autor de Memória do Saque e Tango - O Exílio de Gardel entrou na vida política há 15 anos e alcançou, nas últimas eleições presidenciais, um desempenho superior ao que apontavam as pesquisas, terminando em quintolugar entre os 14 candidatos, com 1,6% dos votos. Ele garante, entretanto, que não foi uma surpresa."Sabíamosque havia um vazio porque os candidatos e partidos se converteram para centro-direita e direita", afirmou Solanas em entrevista exclusivaà Agência Brasil. Segundo ele, a segunda colocada na eleição, Elisa Carrió, é um exemplo disso.Candidatopelo Proyecto Sur, Solanas aponta que nenhum dos três políticos maisbem votados (Carrió, Roberto Lavagna e a vencedora Cristina Kirchner)questionou a "essência do modelo neoliberal, o escandaloso regime deprivatização de petróleo, gás e minérios", que segundo ele foiintensificado no governo de Néstor Kirchner."Osinal distintivo da América Latina é recuperar os recursos mineraispara melhorar a situação do povo", declarou. "Somos os únicos quepleiteamos isso. Fizemos uma grande eleição porque, em apenas dois mesesde campanha e sem recursos, colocamos esse tema no debate".Oplano, a partir de agora, é construir um "grande movimento" para"chegar forte em 2011", quando será eleito o substituto de CristinaKirchner, se ela não for reeleita. Na opinião dele, o movimento poderáse beneficiar com a falta de coesão das outras forças políticas. "Há umeleitorado muito móvel, que não está cativo".Solanas não acredita que, em 2011, a família Kirchner esteja tão poderosa a ponto de Cristina se reeleger ou Néstor voltar ao poder. Ele não acredita na consolidação de uma "dinastia" da qual se fala na Argentina."Nãohá espaço para tanto, porque Cristina está arrastando o pior do PartidoJusticialista [Peronista]", avalia, referindo-se aos "caciques deMenem" dos arredores de Buenos Aires, região de baixa renda que rendeua Cristina boa parte de seus votos e onde, segundo diversos candidatosopositores, houve fraude, com roubo de cédulas eleitorais. Solanasconcorda."Afraude que houve foi espetacular. Roubaram cédulas, nos roubaram dedois a três pontos", acusa. Para ele, seu país está "muito mal" emtermos institucionais, "uma vergonha", ele resume.Sobreo Brasil, Solanas diz que está mal informado. Com relação ao Mercosul, ele afirma não estar animado. Acha que "faltam grandes projetos deintegração" e que iniciativas como Banco do Sul, Parlamento do Mercosule integração energética caminham em ritmo lento. Solanasacha que a integração regional não é uma prioridade real de NéstorKirchner, embora faça parte de seu discurso. "Kirchner é da raça dosjusticialistas ultra pícaros, mentirosos".Antesde voltar à carga com o projeto político da próxima eleição, Solanasvai se dedicar à velha profissão e finalizar seu novo filme, sobre ofuncionamento dos serviços públicos. Chama-se Los Hombres que Están Solos y Esperan.